Lucy

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Olá. Pode parecer estranho contar a minha história a você sendo que nunca nos vimos -- tampouco nos veremos tão cedo. Meu nome... É Lucy. Tenho quatorze anos, estou no oitavo ano -- se é que isso significa algo para você --, e sou filha do meio de três irmãs. Quer dizer... Se eu puder me considerar a mais velha. A questão é que tenho uma irmã gêmea -- seu nome é Mary --, e, de certa forma, ela é minha irmã mais nova... Não estou aqui para discutir minha data de nascimento, ou se sou mais velha ou não que minha irmã.

A questão é que tenho sido observada no colégio. Não que eu tenha descoberto quem anda me perseguindo, mas tenho a sensação de que cada passo que dou está sendo observado. Não gosto disso. Por que alguém iria me perseguir? Normalmente, os garotos escolhem minha irmã para isso. Apesar de sermos iguais, ela é bem mais popular que eu. Não estou reclamando; tampouco concordo ou entendo: é assim que as coisas são e não tenho intenção de mudá-las, não agora. Essa sensação... Não me agrada. Mas acho que acabei de dizer isso. Não gosto porque pode ser alguém querendo me tirar da minha família... Ou do que restou dela.

Tudo aconteceu de repente: chegamos em casa e não vimos nossos pais lá dentro, o que era esperado visto que, como adultos responsáveis que eram, estariam trabalhando. O grande problema é que eles nunca mais apareceram. Meus pais simplesmente sumiram.

Nenhum bilhete, nenhum aviso, nenhuma notícia... Nada. Evaporaram sem deixar rastros e sem levar nada. Chamamos a polícia, colocamos avisos de desaparecimento e... Nada aconteceu. Hoje, cerca de três meses depois, a situação ainda segue inconclusa. Odeio pensar no que pode ter acontecido. Talvez tenham morrido. Minhas irmãs não gostam desta opção, mas tenho de ser realista: se estivessem vivos, teriam voltado. E, sinceramente, prefiro que estejam mortos a simplesmente terem nos abandonado sozinhas sem ninguém em quem pudéssemos confiar. Não temos outros familiares além dos meus pais, não aqui em Atlantis...

Soa familiar para você, o nome? Atlantis? Não se engane pensando que é o lendário continente submerso e perdido na História. Sim, é um continente submerso e boa parte da vida -- para quem estou mentindo, tudo! -- é artificial. A chuva, os dias e as noites, as estações, os dias frios, os dias quentes... As flores, os animais... Foi criado com a intenção de acabar com a superpopulação da Superfície, entretanto, acabou se tornando um exílio para cieitístas e tecnocratas depois da Guerra dos Metais. Não me pergunte sobre a guerra, a maior parte das pessoas que vivem aqui não sabe muita coisa dela. De certa forma, somos o único país onde a alta tecnologia ainda existe. Salvo por algumas cidades e províncias em alguns países não muito bem-vistos na Superfície, a alta tecnologia foi banida, trocada por técnicas quase medievais de produção. Mas isso não é problema meu; em Atlantis quase tudo é automático e vivemos bem com isso, obrigada. Abro meus olhos azuis e suspiro.  A sensação de perseguição está mais forte hoje do que em qualquer outro dia em que a tenha sentido. Apresso o passo, entro na escola. A sensação começa a desaparecer, mas eu sei que ao sair do colégio voltarei a encará-la, talvez na mesma intensidade, talvez não. Viajo pelos corredores compridos da escola, desta vez sem muitos incidentes e entro em minha classe.

Tem uma pessoa estranha sentada no meu lugar.

Garoto, não muito alto, cabelos e olhos negros, usando óculos. Olhar cabisbaixo, concentrado enquanto lê um livro. Impecavelmente vestido, cheira à família rica do quadrante Apolo. Aproximo-me.

-- Esse lugar é meu. -- digo, soando irritada. A verdade é que sempre soo irritada. O motivo? Eu sempre estou irritada.

-- Não está escrito o seu nome nele. -- o garoto responde. Acha que pode brincar comigo, o esperto. Não são muitas pessoas que possuem essa habilidade, e esse menino com certeza não é uma delas.

-- Na verdade -- eu digo, fazendo menção para que ele se levantasse. Ele recusa, eu resolvo usar força. Sou bem forte, apenas para constar; luto no time de caratê desde os oito anos de idade. Acaba por levantar, embora não estivesse muito satisfeito com a breve derrota que acabara de sofrer --, está sim. L. M. Stauts. É meu nome escrito no banco.

LucyOnde histórias criam vida. Descubra agora