OBRAS POÉTICAS ***
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OBRAS POETICAS
DE
NICOLÁO TOLENTINO DE ALMEIDA.
TOM. II.
LISBOA.
NA REGIA OFFICINA TYPOGRAFICA.
ANNO M.DCCCI.
_Com licença da Meza do Desembargo do Paço_.
QUINTILHAS
_Offerecidas ao Illustrissimo, e Excellentissimo Senhor Conde de S. Lourenço_.
Ante vós, Claro Senhor, Que pondes os sãos cuidados De bons estudos no amor, E que d'homens applicados Sois o exemplo, e o protector;
Levanto sem pejo a voz; Que essa alma nunca despreza O pouco que encontra em nós; Não produz a Natureza Muitos homens como vós;
Pois vi outr'ora amparado O discreto, e doce Brito, Triste moço, em flor cortado, Que hia alevantando o esprito, De vossas luzes guiado;
Pois na vida lhe adoçastes De seu fado a má ventura, E não vos envergonhastes, Quando a fria sepultura Com as lagrimas lhe honrastes;
Se os seus Versos sonorozos Inda repetis com mágoa; E pensamentos saudozos Vos trazem aos olhos agua, Que os deixa, Senhor, formozos;
Hoje, outro triste vos faça Nascer iguaes sentimentos; Com os vossos pés se abraça; Não tem os mesmos talentos; Mas tem a mesma desgraça;
Nascido em baixa pobreza, Quiz buscar huma Colu'na, Foi sempre baldada a empreza, Achou ingrata a fortuna, Inda mais, que a natureza.
Em vão paternal ternura Com vivo zêlo me assiste; Foi trabalho sem ventura; Crescia no Filho triste, Com a idade, a desventura;
Das boas Artes no estudo Bom Pai empenhar-me quiz; Traçava o velho sizudo Que fosse hum Filho feliz Dos outros Filhos o escudo;
Forão seus intentos vãos; Zombou desgraça importuna Destes pensamentos sãos; Para vencer a fortuna Não ha lagrimas, nem mãos;
Cortado então de agonias, Só esperei ter ventura, Quando envolto em cinzas frias Escondesse a sepultura Meu nome, e meus tristes dias;
E em quanto o vento forceja, E no mar, que em flor rebenta, Meu fraco lenho veleja, Demando, em tanta tormenta, Por porto a Casa de Angeja;
Surgi em lugar seguro, Onde achei mil acolhidos; Clareou o dia escuro; E meus molhados vestidos Pelas paredes penduro;
De meu fado a força dura Foi hum pouco enfraquecendo; E ainda que em sombra escura, Vem-me ao longe apparecendo O bom rosto da Ventura;
Vossos Sobrinhos me dão (Porque de meus males sabem) Principios de protecção; Mandai-lhe que em mim acabem Esta obra da sua mão.
Mandai, que apressem o passo, Que inda longe a méta vejo, Pois nas supplicas que faço, Não se vence com dezejo, Vence-se á forca de braço;
Mandai, pois tendes direito, Que o turvo mar arrostando, A' corrente ponhão peito; Fallai, Senhor, que em fallando, O vosso mandado he feito.
Não vedes venal incenso Por astuta mão queimado; Fallo, Senhor, como penso; Eu sei quanto he respeitado O Erudîto São Lourenço;
Eu sei bem o alto conceito, E as geraes estimações, Que todos de vós tem feito; Oiço ternas expressões, Filhas de amor, e respeito;