Swan Song

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A alvorada era um dos momentos em que ela mais amava no dia. A madrugada era-lhe o momento do silêncio e o crepúsculo, o momento de reflexão. Mas nada trazia-lhe o puro sentimento de serenidade que sentia ao ver o nascer do sol.

Sentada no chão ainda gelado de frente para a grande janela do aposento, Aelin sentia o calor penetrando os seus ossos mais que o habitual, mas de uma forma reconfortante. Um ponto de apoio para o que há de vir.

A loira respirou fundo e levantou, sua idade já forçando em suas articulações. Mesmo com todo o treinamento que ainda recebia, seu corpo estava se perdendo aos poucos.

Caminhou até o piano de cauda, o grande instrumento decorador localizado no centro da sala, passando os dedos pela sua lateral até poder sentar na banqueta. Uma pasta com suas partituras estava apoiada em cima das teclas. Ela a pegou e folheou até achar a partitura que queria. "Swan Song", a sua última composição, feita especialmente para esse dia.

Aelin ajeitou o longo e liso vestido creme que usava, localizou os pedais, limpou a garganta e tocou a música que significaria o seu fim.

Notas altas e suaves, com um prolongamento no final. Em sua língua materna, cantou sobre uma pequena garota em seu castelo de fogo, usando de suas notas agudas para reproduzir uma melodia feliz ao contar a história da pequena Coração de Fogo.

Mudando para um ritmo mais agitado, Aelin cantou sobre as paixões e relacionamentos que teve em sua adolescência como assassina. Da sensualidade de Archer Finn aos olhos azuis penetrantes de Dorian Havilliard, a rainha descreveu todos os seus amantes de Forte da Fenda com graciosidade. Passando para notas mais baixas, a loira tocou melodias que lhe lembrava as aventuras de Wendlyn e de todos os outros lugares em que fora mandada, dizendo ao sol que fazia-lhe companhia sobre todos as amizades, aliados e lutas que fizera e presenciara em cada local. Lembrara a Mala sobre todos os treinamentos com Rowan nos templos em Wendlyn, lembrara sobre o confronto que teve com Maeve, e nessa hora o sol queimou mais forte, como em resposta à raiva que cresceu em Aelin.

"Eu sei, ela nunca irá prestar", murmurou para Mala, rindo, enquanto o sol subia cada vez mais no céu.

Após lembrar de todas as coisas boas que vivera, Aelin mudou rapidamente para uma melodia fúnebre. Engolindo em seco, Aelin começou a cantar a última parte da música. Murmurando primeiramente na língua oficial de Adarlan, ela cantou sobre Sam, sobre a sua história junto a ele e sobre o seu amor. Cantou para o sol sobre como não o suportava na sua infância dentro do Forte dos Assassinos, até o dia da missão com ele na baía da Caveira. Contou como libertaram os escravos e da sua punição após isso, contou sobre tudo que lhe aconteceu até que percebera que fora um dia apaixonada por aquele garoto que trouxe para sua vida um sentido, e da morte dele no final.

Tocando as primeiras notas do hino de morte de Eyllwe, trocando para uma melodia ainda mais triste quando começou a cantar. Poucas palavras foram usadas, todas em Eyllwe, apenas para dizer que tudo havia mudado em todos os anos que passara longe dela, que ainda tem pesadelos com a cena da morte, que ainda a ama e que a espera ver do outro lado.

Com consciência de que já estava na hora, Aelin tocou o último conjunto de notas da música, seus pés e a barra do vestido se desfazendo em cinzas. Falando em todas as línguas que conhecia que, finalmente, estava indo encontrar com seus amados, a rainha sentiu seu corpo indo aos poucos, junto com as lágrimas e a promessa de que esperaria por seus companheiros vivos do outro lado.

A medida que terminava a música, o sol brilhava cada vez mais forte, acolhendo Aelin como ela era, como ela foi e como ela será na lembrança dos que sobreviverem para contar sobre ela: uma princesa, uma assassina, uma companheira, uma guerreira e uma rainha.

Sobrando-lhe apenas as mãos e a face, Aelin murmurou o nome da música, antes que seu corpo se tornasse inteiramente cinzas. O brilho do sol acolheu-a quando suas cinzas foram varridas pela janela por um vento morno, brilhando com orgulho até que a rainha se dissipasse completamente.


Todos no reino sentiram a voz de sua rainha durante toda a música até a sua última frase, todos sentiram o abraço quente que Mala os ofereceu, como uma oferta de reconforto. E, mesmo após o sol cair e a lua brilhar forte no céu, as palavras finais ainda ecoavam pelo reino, ainda eram sussurradas pelo vento enquanto nenhum ser vivo ousou falar.

"Com amor, Aelin"


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