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Quatro dias se passaram desde que Gerry viu o velho na varanda pela última vez. Desde então, ele não conseguiu dormir direito, levantando-se seis ou sete vezes à noite para olhar a velha casa do outro lado da rua. Ele não viu nada, nenhuma vez. Estava começando a achar que tudo não passava de um pesadelo, ou pior, que algum velho vagabundo tinha usado o lugar como abrigo temporário.
Gerry olhou para o relógio na parede da sala de aula: três e quarenta e cinco da tarde. Falta 15 minutos para ir embora. Treino de futebol a noite. Ótimo. Tinha sido selecionado de novo principal.
Por fim, o sinal tocou, e a correria louca e caótica começou.
-Não corram. Devagar!- a professora Martin gritava em vão.
Gerry começou a correr e viu sua irmã, Susie.
Ao passar por ela, ele conseguiu puxar seu cabelo, derrubar a mochila do ombro dela e fazê-la tropeçar, tudo no mesmo movimento habilidoso, uma manobra muito bem treinada.
-Avise a mamãe que vou chegar tarde em casa depois do futebol.-Gerry gritou. Então, ele desapareceu correndo.

(...)

Gerry marcou dois Gols.

-Mais o goleiro se mexeu-Gerry reclamou para o técnico.
- o que você queria que ele fizesse? Que ficasse parado, deixando você marcar no canto, filho?- retrucou o professor, sorrindo para ele.-concentre-se na bola.
(...)

Gerry e Stevie subiram a rua em direçao as suas casas, relembrando as boas jogadas, às faltas e os gols da noite. Olhou para a velha casa abandonada. Nada. Ele sorriu.
-Até amanhã, Gerry. Lembre-se: cabeça fria...-Stevie cutucou.
-Até mais, Stevie. Não esquenta, tomar sete gols não é tão ruim. -Gerry brincou.

Abriu o portão da frente e entrou. Olhou para casa. Estranhamente, tudo estava na mais completa escuridão. Ele olhou para o relogio: seis e meia da tarde. Todos deveriam estar lá. O pai normalmente chegava as seis. Então, todos deveriam estar em casa.
-Olá... Tem alguém ai?- ele gritou, em vão. Ninguem respondeu. A casa estava vazia.
-Aaah...Mas que droga!-Gerry murmurou.
Os pais não tinham lhe dado uma cópia da chave. Ele iria ficar sentado nos degraus até alguém chegar em casa.

-"Mas aonde ele foram?"- ele pensou.
Estava faminto. Sua mãe sabia que ele sempre chegava com fome depois do treino.
-Que droga!-ele gritou, sentando-se no degrau mais alto e pegando um livro na mochila.

Gerry não teve que esperar muito. Cerca de cinco minutos depois, ele ouviu o ruído família do carro do pai subindo a rua. Levantou-se, determinado a demonstrar o pior humor possível.
Exibiu sua melhor cara de irritação.
Porém, assim que ele viu sua mãe sair do carro, a expressão em seu rosto mudou.
A mãe carregava Susie no colo, enrolada num cobertor. Com certeza, as duas tinham chorado. O senhor Tooms, Pai de Gerry, parecia sério. Ele abriu o portão e todos entraram.
O paí notou o filho em pé nos degraus e percebeu seu olhar de preocupação.

-Está tudo bem filho. Ela vai ficar bem. Só passou por um choque desagradável. Todos nós passamos...-declarou, em tom solene.
-Mas oque aconteceu?-Gerry indagou, enquanto eles caminhavam até a porta.
-Claro, você não soube. Foi terrível. O ônibus escolar bateu num caminhão, quando sua irmã tava voltando para casa. Susie está bem, mas 5 colegas ficaram feridos... outros não tiveram muita sorte. -Explicou abrindo a porta.

As palavras atingiram Gerry imediatamente.
Ele virou-se e olhou para a varanda. Lá estava o velho, balançando para a frente e para trás, sorrindo. Gerry ficou com a garganta seca.
-Pai, pai...-ele começou. Mas o senhor Tooms tinha seguido com a mulher e a filha para dentro. Num instante, o velho tinha desaparecido, e a varanda estava vazia.
As palavras estavam nítidas na cabeça de Gerry: "Acidente com ônibus escolar. Cinco feridos.". A imagem da manchete do jornal ardia em sua cabeça.

-"Será que foi coincidência"-Gerry pensou, tentando encontrar algum sentido para a situação. A mãe e o pai estavam muito preocupados com Susie para ficar ouvindo histórias esquisitas dele.
Seu estomago ainda pedia por comida e, naquele momento, falava mais alto que as preoucupaçoes de sua mente.

(...)

Gerry ficou na janela de seu quarto e olhou para o outro lado da rua. Era a terceira vez que ele acordava. Não conseguia tirar a manchete do jornal da cabeça. Olhou de novo. Lá estava o homem, finalmente. A cadeira lentamente balançava para frente e para trás. O velho olhou para cima e sorriu. Então, recostou-se e levantou o jornal de novo. Como antes, as palavras na primeira página pareciam penetrar na escuridão e eram tão claras, como se fossem luzes neon.

-"Vitória da escola local na Copa:5 a 4 na cobrança de pênaltis" - Gerry leu.

Embaixo da manchete, havia uma foto que Gerry conseguia enxerga. Era de um time de futebol. Conseguia distinguir as familiares camisas listradas em preto e branco. Era o time dele...
A imagem do velho a sumir. Antes de desaparecer, ele deu um último sorriso para Gerry.

- Isso é loucura!-falou em voz alta. Mas seus pensamentos imediatamente se voltaram para o sábado, dia da grande partida da Copa. Sua escola não tinha vencido ainda. A partida era sempre arrasadora.

-Não...isso é impossível.-ele cochichou, enquanto voltava para a cama.-impossível...

(...)

O sábado demorou para chegar. a escola inteira estava animada.
Por fim, a grande partida chegou. Gerry parou no meio do campo. Parecia que toda escola estava lá. O barulho era tremendo. Gerry olhou para Stevie no gol.
-Três já são p suficiente, Gerry. Você consegue! -gritou Stevie.
O jogo pareceu passar num piscar de olhos. Mas o segundo tempo acabou e ninguém marcou. Começou a prorrogação. Todos foram ficando cada vez mais nervosos e não demorou para o juiz apitar o final do jogo. Pênaltis.
Um a um, os pênaltis foram cobrados, até o placar ficou 4 a4. Ninguém tinha errado.
O centroavante do time se posicionou. Stevie agachou, balançando o corpo de um lado para o outro.
Tudo parecia estar em câmera lenta. O garoto chutou. Stevie esticou o corpo e as mãos para a direita. Parecia ser um gol certeiro, até Stevie bloquear.
A torcida foi a loucura... Aplausos, gritaria e depois silêncio.
Ainda tinha mais um pênalti.
O professor Andrews caminhou até Gerry e disse:
-Sua vez filho, você consegue.
-Mas, mas...-Gerry balbuciou.
-Der o melhor de si.- o professor deu tapinhas em seu ombro, e depois o empurrou para frente.
Suas pernas pareciam gelatinas. E a chegada ao centro parecia uma eternidade.
Posicionou a bola, deu passos para trás e chutou. Fechando os olhos em seguida.
O barulho ensurdecedor. Quando abriu os olhos, a bola estava na trave, e o goleiro jogado no chão. Eles tinham conseguido!
Enquanto Gerry era carregado pelo time, ele não parava de pensar no velho. Aquilo era muito estranho.... muito estranho...

Sussuros Da Meia-Noite.Onde histórias criam vida. Descubra agora