Missão Calu

Depois da Missão

Missão completada com sucesso, era o que estava escrito na tela da televisão, em letras garrafais. Eu sabia que poderia vencer o Caíque, apesar de quase ter duvidado disso anteriormente, quando estava tendo dificuldades para encontrar a localização do esconderijo secreto. Mas agora não existia mais espaço para esse sentimento de incerteza, tudo do que tinha consciência agora era a vitória. Minha vitória.

- Parece que o jogo virou, não é mesmo? – Não consigo evitar. Largo o controle, que ainda estava segurando por puro reflexo, na mesinha de centro e me viro para o Caíque, com as palmas das mãos para cima, como se eu dissesse "fazer o quê?", ou falhar fosse algo impossível para mim. Provavelmente era.

Ver a cara de incredulidade dele apenas aumentou o meu sorriso. Eu não disse? Ele está indiscutivelmente estupefato, e lança olhares alternados entre mim e a TV, não conseguindo acreditar que eu o tinha realmente vencido.

- Mas, mas... o quê, como? – Ele balbucia. Ah, estou realmente muito contente por ter ganho essa partida.

- Faça me o favor, Caíque! É tão difícil acreditar que eu posso ganhar de você em algum jogo? – Pergunto, ainda sorrindo de contentamento. Não estou chateada de verdade, não após essa conquista, apenas gostaria que ele me desse um pouco mais de crédito por completar a missão.

- Não, não é isso. É só que eu não sabia que nerds de escola, como você, também poderiam ser boas no videogame. - Ele diz para mim, parecendo sincero. - Sabe, além de todo aquele estudo, leituras e séries. – Bem, isso foi algo inesperado. Seria um elogio? Era difícil ter certeza, porém eu gostaria que fosse.

- Pois saiba você que "nerds de escola como eu" – faço o gesto de aspas com as mãos – podem ser boas em tudo aquilo que quiserem. – Além do mais, o Caíque estava falando como se não fosse um dos maiores fãs de Star Trek do mundo.

- Que bom que você não decidiu treinar arco e flecha ou tiro ao alvo, então. – Ele ri, e logo o acompanho.

Não sei o que desencadeou isso, se foi a piada do Caíque, o fato de eu ainda estar um pouco exultante com a minha vitória, ou simplesmente por passarmos algum tempo juntos, como era antes de o Fabrício e a Nora entrarem para a nossa turma, no 6° ano, mas logo estamos tendo um ataque de risos. Eu gargalho tanto que acabo engasgando, e emito um barulho parecido com o de algum animal selvagem, o que faz o Caíque atirar a cabeça para trás, rindo tanto que não emite mais som. Parece que ele está sofrendo de um ataque epilético, porém continua incrivelmente lindo mesmo assim.

De repente, as coisas não são mais tão engraçadas quanto há poucos segundos atrás. Enquanto o Caíque recuperava o fôlego, soltando risadinhas esparsas de vez em quando, eu já estava respirando normalmente, totalmente absorta nas feições, no jeito dele. Como as sardas logo acima das suas maçãs do rosto pareciam pequenas estrelas, o cabelo castanho-claro, um pouco comprido, cobria as orelhas, e o modo que seus olhos enrugavam quando ele sorria. Estava o encarando novamente, e não me importaria em passar o resto do dia fazendo apenas isso.

Não sei quanto tempo fiquei ali, olhando para ele, admirando-o, sem notar nada do que acontecia ao meu redor, porém, quando prestei atenção nos meus outros sentidos novamente, a sala de estar estava em silêncio. A música do jogo, que repetia sem parar, havia sido interrompida pelo desligamento automático da televisão. O vento, que soprava constantemente pelas cortinas desde que chegamos, havia cessado. E o Caíque não estava mais rindo. Ele estava... me encarando também.

Não sei se o Caíque achou estranho o fato de eu olhar para ele por tanto tempo ou apenas resolveu me imitar, mas, independente disso, aquela troca de olhares estava ficando diferente. Mais intensa. Talvez fosse a minha mente me pregando peças, porém eu seria capaz de jurar que ele me olhava com fascínio, curiosidade, como se eu fosse a última garota na Terra e tivesse resolvido ficar justamente ao lado dele.