"Ô pinga, chega ae"
Da mesa do bar,o grito vai em direção ao homem maltrapilho que dali se aproximava, Precedido pelo seu cheiro forte e sua aparência desagradável, formada por diversas roupas que aparentam não ser lavadas a pelo menos alguns meses. Com um olhar que a principio se assemelhava bastante a um cachorro que havia acabado de leva uma surra e vive desconfiado de todos que se aproximam,ele cuidadosamente se aproxima da mesa, onde quatro rapazes conversam entre si e apontam para ele, rindo logo depois.
Quando finalmente ele chega perto da mesa, o homem que o havia chamado sorri pra ele e pergunta:
"E aí, pinga, o que conta de novo? Achou algo legal na rua?"
Ainda com o olhar desconfiado, ele julga se o que ele perguntou é sério ou apenas mais uma daquelas coisas que os jovens fazem para o incomodar. Os outros rapazes, sem falar nada o esperam responder e como se repetindo a pergunta isso pudesse apressar a resposta, o homem repete:
"E então, pinga? Achou algo legal?"
Como se tivesse todo o tempo do mundo, ele lentamente deixa sua mochila no chão, sem largar as sacolas de um mercadinho local que carregava nas mãos. Apesar de estar calor, ele não suava, mesmo estando coberto com diversas camadas de roupa que, agora mais de perto, dá para ver que possuem um certo asseio, o máximo possivel que ele pode ter com algo assim tão trivial.
"Achei sim. Quer ver?"
"Claro que quero! Você sempre acha coisas legais!"
Ele aponta para os colegas da mesa que já se afastam dela tirando os copos que repousavam ali, onde assim que tudo está limpo, ele coloca a sacola sobre a mesa.
A sacola esta com alguns nós, que poderiam ser facilmente abertos com um rasgo na lateral da sacola, mas isso faria com que ele não pudesse colocar de novo o que ele fosse retirar dali. Então, pacientemente, eles aguardam até que o nó seja desfeito e enfim, o que ela tem dentro possa se finalmente revelado.
A primeira coisa que sai da sacola é uma pequena caixa quadrada com uma tampa no alto, um pacote com diversos talheres presos por um elástico já amarelado que parece que vai arrebentar a qualquer minuto e por fim, uma pequena bolsa dourada, diferente de tudo o que ele já havia tirado de lá, ainda fechada e com um nó que parecia bem forte no topo.
"Isso" Ele diz, pegando o pacote de talheres com cuidado para não romper o elástico "Eu encontrei quando passei na frente daquela casa grande, lá no centro. Tinha um monte de louça quebrada e no meio de tudo, estavam estes talheres. Acho que eu consigo vender eles, estão bem inteiros." Ele passa os talheres para o moço ao lado, que os olha cuidadosamente, passando pro colega ao lado, até que finalmente eles voltam para a mão do mendigo.
Ele os coloca na sacola e então pega a caixa quadrada com a tampa no alto. Observa cuidadosamente o tampo e como se tivesse visto algum tipo de mancha, assopra e rapidamente passa um lenço que rapidamente sai de um de seus bolsos. O que mais impressiona nisso tudo é o fato de que ele está imaculadamente branco, tão limpo que até arde os olhos ao refletir levemente a luz do sol.
"Esta caixa, eu adoro ela. A encontrei quando eu ia atrás de algo para comer. Acabei não encontrando nada, mas a achei." Assim como os talheres, ele passa para o moço ao lado, que a observa e vai passando para os outros, quando ela retorna para a mão dele, ao invés de a guardar, ele fica com ela na mão. "O mais legal dela é que, quando ela abre, a tampa fica no formato de uma estrela. Por isso que gosto tanto dela" Ele puxa a tampa para cima, mostrando o que ele havia acabado de dizer, fazendo a tampa formar uma estrela de cinco pontas, com seu interior dourado enquanto a caixa em cima mantem uma cor esmeralda combinando perfeitamente com a tampa.
Sem saber o que dizer, eles apenas olham a caixa sobre a mesa, refletindo a luz do sol em todas seus cantos.
depois de algum tempo, ele a pega e então, refazendo o padrão intrincado da tampa, ele a fecha novamente, colocando novamente na sacola.
"E ela estava vazia, pinga? Quando você a achou?" O rapaz pergunta depois de um tempo
"Sempre esteve vazia, não consigo achar nada legal para colocar nela, mas um dia acho"
Ele pega a bolsa dourada e a encara por algum tempo, antes de começar a história daquele objeto.
"Essa é estranha. Eu estava andando na rua, já era noite, quando a distância vi este pequeno pacotinho na rua. Ele estava caído na calçada, bem ali na esquina daquele prédio grande verde lá para os lados de cima da cidade. Ele tem esse nó grande e forte em cima, mas é fácil de abrir. Querem tentar?"
Ele passa o pacote para o moço ao lado, que observa o pacote, tenta desatar o nó, mas acaba não conseguindo. Ele passa o pacote ao lado e um a um, eles tentam e acabam por não conseguir. O mendigo observava eles em suas tentativas, com um sorriso nos lábios, se divertindo com cada tentativa deles de tentar abrir o pacote. Quando ele retorna à sua mão, ele ainda sorri, observando os olhares frustrados de cada um deles, encarando o pacote.
"A parte legal desse nó" Ele diz, segurando o pacote pela pequena cordinha que o fecha. "É que ele não é um nó!"
Segurando o nó com uma das mãos, com a outra ele o gira. Um pequeno clique faz com que ele pareça ter se quebrado ao meio, mostrando um fecho elaborado com um botão no meio que libera a corda, abrindo o pacote.
"O mais engraçado disso é que ele só tem essas bolinhas aqui, brancas. Eu achei que era marfim, mas elas são metálicas. Não é nada valioso, nunca ninguém quis comprar nos lugares onde ofereci. É uma tristeza..."
Ele vira o pacote, deixando na palma da mão sete pequenas esferas, perfeitas e tão imaculadas quanto o lenço do mendigo. Elas não eram grandes, cabiam perfeitamente na mão dele sem parecer que iriam cair a qualquer momento. diferente dos outros objetos, estes ele não passa para cada um, colocando após alguns minutos todas elas de volta no pacote e refazendo o nó.
A mesa fica em silêncio e todos mal haviam percebido que os objetos já estavam guardados na sacola, que já repousava no braço dele.
" E foi isso o que achei ultimamente. tem mais coisas, mas nada muito legal quanto isso que mostrei." Ele pega a mochila que havia pousado no chão e a coloca nas costas sem dificuldade. "Agora, vou continuar a andar. Algum de vocês tem um trocado pra me dar?"
O moço ao lado mexe no bolso e retira algumas notas dele, colocando na mão do mendigo.
"Ei pinga, aparece mais vezes, foi legal ouvir sobre o que achou!"
"Vou tentar, não sei onde posso estar no dia seguinte. Mas... pode me fazer um favor?"
"Que tipo de favor?"
Ele olha para a esquina, já escolhendo o caminho que fará logo a seguir.
"Só não me chama de pinga, tá? Eu nem bebo. Pode me chamar de Thomas. É o meu nome."
"Posso fazer isso, Thomas. eu sou o Edison"
"Até uma próxima, Edison. Que seus caminhos sejam sempre os melhores!"
Ele sai e então, todos estão na mesa novamente. As cervejas continuam a chegar, os copos continuam a encher e esvaziar e enquanto tudo isso acontece, Thomas caminha pelas ruas na sua busca incessante pela própria sobrevivência.

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O Mendigo (Amostra)
RomanceQuando tudo o que se precisa é uma boa conversa, a amizade que se tem com uma pessoa vai além da classe social ou cor da pele. Thomas Martins é um morador de rua, mais conhecido como mendigo por todos aqueles que por acaso o enxergam quando tiram os...