Prólogo ...

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Prólogo

Seis anos atrás 

Vitor

—Alex, eu nunca obriguei você cursar faculdade de direito. Deixei que você corresse atrás de seus sonhos, e escolhesse qual o melhor caminho para se trilhar. Mas o que eu não posso permitir, é que você mesmo, pode seu crescimento profissional, por um namorico de faculdade. – Digo exasperado ao meu irmão.

—Namorico de faculdade? Não Vitor, você definitivamente não sabe o que está dizendo. Ingrid não é apenas um namorico, ou um caso fútil como você costuma chamar. Ela é a mulher que eu escolhi para ser minha. Coisa que você nunca terá meu irmão. Já que escolheu viver só e isolado.

Respiro fundo para controlar minhas emoções. Não posso agir no calor do momento e falar coisas que eu venha me arrepender. Enquanto eu me recupero, ele prossegue alterado com seu discurso.

—Vitor não precisa você dizer. Eu vejo a acusação através de seu olhar. Você anulou a sua vida para cuidar de mim e dos escritórios, e isso fez de você, uma pessoa amargurada e vazia. Agora você quer me obrigar a viver uma vida igual a sua. Acha que eu devo isso a você.

—E que vida você quer viver Alex? Quer tornar-se um fraco e um tolo, ter um fim igual ao nosso pai? Quer deixar que uma qualquer, destrua sua vida? Você tem referências negativas e sabe bem, o que é anular-se por alguém. Então meu caro, não cometa o mesmo erro que seu querido pai.

Eu vejo o ódio estampado através do olhar do meu irmão. Ele é muito novo e acha que sabe tudo da vida. Acha que a vida é a merda de um conto de fadas e que enfim, encontrou a sua princesa.

—Eu não sei por que eu insito conversar com você Vitor. Você acha que a ultima palavra tem que ser sua e não se importa com a opinião, e muito menos com a vida das pessoas que te cercam.

—Está decido Alex e eu não voltarei atrás na minha decisão. Você irá para Harvard e não se fala mais nisso. Seu voo sai amanhã. –Disparo logo de vez para encurtar a discussão.

—E o que Vitor? Quando você pretendida me dizer que estou deixando o Brasil?

—Arquitetura não era seu sonho Alex? Só estou tentando ajudar realiza-lo.

—Você se acha o melhor em tudo não é mesmo Dr. Vitor Hugo Montez? O melhor advogado, o sabe tudo, o dono da verdade. Você é um babaca egocêntrico que pensa somente em você. Eu não te dou o direito de decidir o que é ou não melhor para mim.

—Escuta aqui seu moleque ! Quem você pensa que é para falar assim comigo? Você não sabe o que está dizendo. Você não tem idéia o que é tornar-se o mantenedor da família com apenas dezoito anos. Com a sua idade seu moleque idiota, eu já tinha responsabilidades. Eu não escolhi nada disso para minha vida. Jamais pensei ser pai e mãe ao mesmo tempo. As circunstâncias decidiram que assim seria. Enquanto meus amigos da faculdade curtiam as festas e as garotas, eu ficava aqui, cuidando de você e estudando. Sabe por que meu amado irmão? Por que nosso amado pai nos deixou apenas dívidas. E se eu não tivesse dado duro, anulado a minha merda de vida, hoje você não teria seu lindo carro e seu rico dinheirinho. Então não me venha dar lição de moral.

Alex anda de um lado para o outro como se estivesse sentindo-se como um animal enjaulado. Suas malas descansam do lado da porta, e seu olhar deixa bem claro, ele não voltará atrás em sua decisão. Não terá Harvard. Não haverá uma carreira de sucesso consolidada, já que seu namoro passou a ser sua maior prioridade.

Faço a mim mesmo algumas perguntas, tentando entender suas ações. Não preciso ir muito longe para conseguir as respostas. Eu já tenho a resposta para minha própria pergunta. A culpa foi minha. Dei tudo de mãos beijada a esse moleque, para suprir o amor paterno e materno. Eu não queria que ele passasse pelo o que eu passei. Eu não soube prepara-lo para a vida. Ele definitivamente não conhece o valor da conquista.

—Eu sou grato por tudo o que você fez por mim Vitor. Mas na boa, eu não quero a sua vida. Estou saindo por aquela porta, e espero que você respeite a minha decisão. Ingrid e eu temos nossos sonhos e nossos projetos. Eu não posso deixar que meu amargurado irmão interfia na realização de cada um deles.

Dito isto, ele sai e bate a porta atrás de si, deixando-me completamente sem ação.

Minha vontade é ir atrás daquele moleque insolente e aplicar um corretivo. Porém, conhecendo seu temperamento, sei que eu só iria piorar a situação. Ele aprenderá com seus próprios erros que a vida é muito mais que uma simples atração sexual. E não tem nada que eu diga, ou que eu faça que fará com que ele mude de opinião.

Aos dezoito anos de idade, depois da morte do meu pai e de sua suposta esposa, eu me vi obrigado a cuidar de Alex que na época, tinha doze anos de idade.
Eu estava cheio de sonhos e projetos. Eu queria ser livre. Queria conquistar minha independência para ir para bem longe de tudo e de todos. Eu não tinha um bom relacionamento com meu pai. Depois da morte de minha mãe, ele casou-se novamente com a mãe Alex. E desde que ele nasceu eu não tenho feito outra coisa na vida a não ser cuida-lo e protegê-lo, já que sua mãe não dava a mínima para ele. Seu único foco eram futilidades e seus amantes.

E sem que eu esperasse, o mundo desabou sobre a minha cabeça. Eu me vi obrigado a abandonar a minha vida, os meus sonhos para que nem eu e nem Alex ficássemos na rua.

Durante o dia revezava em cuidar de Alex e trabalhar no escritório de advocacia que era do meu pai e que, por direito ficou para nós. Na verdade não herdamos os escritórios, e sim as dividas que ele nos deixou como herança.

Meu pai era um advogado conceituado. Tinha vários advogados trabalhando para ele. Porém com o passar do tempo, deixou de lado o seu trabalho e foi destruindo-se dia a dia. Perdido na bebida, a jogatina passou a ser um vício, e foi assim que ele foi perdendo status e dinheiro. Ele perdeu seu amor próprio e sua autoestima. De um vencedor passou a ser um derrotado.

Eu precisei acelerar o meu processo de aprendizado para poder salvar o escritório da ruína e quitar as dividas. Sorte minha, é que meu pai tinha grandes homens que trabalhavam para ele, e esses homens me ajudaram bravamente a reconstruir um dos melhores escritórios de advocacia do Brasil.

Amargurado, solitário e vazio? Talvez seja exagero da parte de alguns. Antes de me julgarem, calcem meus sapatos e façam meu percurso. Perder a mãe com cinco anos de idade, e ser criado com babás não são boas lembranças a serem cultivadas. Ver seu pai morto, com um tiro na cabeça após matar a sua mulher e seu amante enquanto transavam, não é algo que alguém consiga superar.

Meu pai arruinou a sua vida e a vida de todos que estavam ao seu redor. Graças a ele eu perdi a minha infância e a minha juventude. E hoje eu faço apenas a única coisa que eu aprendi fazer desde jovem. Sobreviver.

Desde muito cedo eu tive que aprender a conviver com muitas perdas. Restando somente a dor e devastação. Definitivamente, esgotaram minhas cotas de tragédias para toda a minha existência. E ver meu irmão indo pelo mesmo caminho de meu pai, entregando-se a uma fútil ilusão, faz de mim alguém impotente.

Afasto minhas amargas lembranças, trancando meus monstros no armário, já que eles teimam em me perturbar. Sou resgatado do meu martírio, pelo toque do meu celular.

—Alô

—Alô, eu gostaria de falar com o seu Vitor Hugo. –Diz a pessoa do outro lado da linha.

—Sou eu mesmo, em que posso ajuda-lo.

—Senhor, o senhor Alex Sampaio sofreu um acidente. Quando chegamos para fazer o socorro, infelizmente era tarde de mais. Ele não resistiu e chegou sem vida ao hospital.

Eu não consigo registrar as ultimas palavras. Sinto como se tivessem tirado o chão de meus pés. Meu irmão, a minha única família está morto e a culpa é minha. Se não tivéssemos discutido ele ainda estaria aqui.

Deus!O que é que eu fui fazer?

92~


Amargurado Coração COMPLETO - Série Cicatrizes Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora