Um sarau é o bocado mais delicioso que temos, de telhados abaixo. Em um sarau
todo o mundo tem que fazer. O diplomata ajusta, com um copo de champanha na mão, os
mais intrincados negócios; todos murmuram e não há quem deixe de ser murmurado. O
velho lembra-se dos minuetes e das cantigas do seu tempo, e o moço goza todos os regalos
da sua época; as moças são no sarau como as estrelas no céu; estão no seu elemento: aqui
uma, cantando suave cavatina, eleva-se vaidosa nas asas dos aplausos, por entre os quais
surde, às vezes, um bravíssimo inopinado, que solta de lá da sala do jogo o parceiro que
acaba de ganhar sua partida no écarté, mesmo na ocasião em que a moça se espicha
completamente, desafinando um sustenido; daí a pouco vão outras, pelos braços de seus
pares, se deslizando pela sala e marchando em seu passeio, mais a compasso que qualquer
de nossos batalhões da Guarda Nacional, ao mesmo tempo que conversam sempre sobre
objetos inocentes que movem olhaduras e risadinhas apreciáveis. Outras criticam de uma
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gorducha vovó, que ensaca nos bolsos meia bandeja de doces que veio para o chá, e que ela
leva aos pequenos que, diz, lhe ficaram em casa. Ali vê-se um ataviado dandy que dirige
mil finezas a uma senhora idosa, tendo os olhos pregados na sinhá, que senta-se ao lado.
Finalmente, no sarau não é essencial ter cabeça nem boca, porque, para alguns é regra,
durante ele, pensar pelos pés e falar pelos olhos.
E o mais é que nós estamos num sarau. Inúmeros batéis conduziram da Corte para a
ilha de... senhoras e senhores, recomendáveis por caráter e qualidades; alegre, numerosa e
escolhida sociedade enche a grande casa, que brilha e mostra em toda a parte borbulhar o
prazer e o bom gosto.
Entre todas essas elegantes e agradáveis moças, que com aturado empenho se
esforçam por ver qual delas vence em graça, encantos e donaires, certo que sobrepuja a
travessa Moreninha, princesa daquela festa.
Hábil menina é ela! nunca seu amor-próprio produziu com tanto estudo seu
toucador e, contudo, dir-se-ia que o gênio da simplicidade a penteara e vestira. Enquanto as
outras moças haviam esgotado a paciência de seus cabeleireiros, posto em tributo toda a
habilidade das modistas da Rua do Ouvidor e coberto seus colos com as mais ricas e
preciosas jóias, D. Carolina dividiu seus cabelos em duas tranças, que deixou cair pelas
costas: não quis adornar o pescoço com seu adereço de brilhantes, nem com seu lindo colar
de esmeraldas; vestiu um finíssimo, mas simples vestido de garça, que até pecava contra a
moda reinante, por não ser sobejamente comprido. E vindo assim aparecer na sala,
arrebatou todas as vistas e atenções.
Porém, se um atento observador a estudasse, descobriria que ela adrede se mostrava
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A moreninha
Literatura KobiecaO romance A Moreninha conta a história de amor entre Augusto e D. Carolina. Tudo começa quando Augusto, Leopoldo e Fabrício são convidados por Filipe para passar o feriado de Sant'Ana na casa de sua avó. Os quatro amigos estudantes de medicina vão p...