ANGEL
Passei dois dias inteiros sem falar com Dorian por motivos óbvios. Ele também não fez qualquer esforço para falar comigo. Pelo contrário, me evitou na loja e saía de noite. Eu vi pela janela do quarto os caras deixando-o na porta de casa ao amanhecer.
Na sexta-feira não foi diferente. Eu me concentrei nas minhas tarefas e Dorian seguiu as dele, usando o pobre do Leo como mensageiro quando tinha que me dizer alguma coisa. A Toca Disco só perdeu a seriedade quando um cliente irlandês adentrou o ambiente afirmando ter matado John Lennon. Não foi Mark Chapman, gritava o homem bêbado. Dorian e Leo tentaram contê-lo e a figura nada lúcida foi levada aos gritos, jurando um dramático "fui eu"!
Aquele fora o único momento em que rimos um para o outro, mas não durou muito. O orgulho nos fazia optar pelo silêncio superestimado. O resultado era sempre o mesmo; eu ia para casa e ele saía com seus amigos.
Essa era uma das noites em que eu tentava dormir sem pensar nele. Rolava de um lado para o outro na cama, apertando as pálpebras na esperança tola de cair no sono profundo e só acordar quando a sensação patética de rejeição abandonasse minhas estranhas.
Maldita culpa. Fiquei tão cega de ciúmes que não percebi a complexidade de toda história. Não sabia ao certo o que aconteceu entre Dorian e Alex no passado, mas sabia que fora terrível o suficiente para quebrar um laço familiar. Foi muito insensível da minha parte reduzir a rixa unicamente em "Michelle".
O meu celular tremeu embaixo do travesseiro, onde meu rosto repousava. Recuperei o aparelhinho tecnológico para saciar a curiosidade e me espantei ao identificar a chamada.
— Acordada?
Tudo o que eu queria dizer era que sentia saudade, mas o que escapou foi um simples:
— O que você quer?
— Você está bem?
— Você teve dois dias para me perguntar isso, Leduc.
— Você sabe sobre a minha capacidade de ser um idiota. Levante da cama e abre a porta. Preciso te ver.
Ele estava no corredor...
— Eu estou indisposta agora.
— Não seja má. Eu estou me sentindo um pouco mal e preciso de você.
— Talvez você devesse procurar pela Michelle então.
Mordi o lábio, me repreendendo por tal impulso. Desejei que as palavras nunca tivessem saído pela minha boca quando fiquei sem resposta por alguns segundos.
— A minha cabeça dói, Angel. Eu não devia ter bebido tanto, mas já entendi o seu recado. Vou deixá-la em paz. Só quero que saiba que se me encontrar morto no chão do banheiro, jogue as minhas cinzas no rio Mersey.
Existia alguém no mundo que fosse mais dramático do que Leduc?
— Você ouviu? Por causa dos Beatles e tudo mais...
— Eu ouvi! — Eu me livrei do cobertor.
Abri a porta e encontrei o engraçadinho parado no corredor, as mãos enfiadas nos bolsos da calça jeans e o torso nu. A camisa estava pendurada no ombro direito e os cachos de seu cabelo estavam um caos enigmático que combinava bem com os olhos extremamente vermelhos.
— Hum... oi.
Dorian inclinou seu antebraço contra o batente para manter-se de pé e descansou a testa contra o braço. Não parecia bêbado, só um pouco cansado. Segurei seu queixo e cheirei seu hálito, constatando sua mentira deslavada.
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MEU MENINO - Série 1994 LIVRO 1 (Privilegiados)
Romance☆ Livro 1 da série Privilegiados: Memórias Ocultas Enviada para passar as férias de verão na casa do pai, Angel Levi não está disposta a conviver com a nova família do homem que desapareceu quando ela tinha nove anos. A garota impetu...