—Então, Olívia, você já pode falar — Disse a minha psiquiatra me olhando de um jeito um (nada) pouco intimidador, porém eu apenas a olhei e voltei a minha interessante tarefa de procurar todos os pontos vermelhos de seu consultório. — Senhorita Mayen? — Ela voltou a me chamar. Era irritante, será que não era óbvio que eu não queria conversar? Acho que minha expressão facial não escondia isso.
— O que exatamente quer que eu fale? — Perguntei fixando meus olhos nela e me endireitando na cadeira — Você e toda a minha família sabem que eu não tenho necessidade de estar aqui, eu não sou louca. Sim, eu sei que a maioria das pessoas loucas não admitem para si mesmos a sua doença, entretanto, tenho a consciência tranquila quanto a minha sanidade mental — Eu falava de forma clara, adorava essa qualidade minha, eu era boa com palavras e como coloca-las de modo que viessem a me favorecer.
— Olívia... — a doutora Basten correspondeu meu olhar — Eu tenho dúvidas do que você é capaz de fazer — ela elevou a mão ao queixo — Você é tão fofa — Ela disse e eu assenti — Fisicamente, claro — ela disse elevando o tom de voz e tirando as mãos do queixo — Consegue "driblar" os melhores psiquiatras com essa sua voz meiga, essas palavras... Como eu posso dizer? — Ela procurou uma palavra que pudesse soar o menos com "manipuladoras", apesar de ser isso o que ela queria falar então eu completei sua frase.
— Manipuladoras? Sim, acredito que essa era a palavra que queria usar, no entanto procurou uma palavra que não soasse tão "pesada", mas é isso, não? — sorri sem mostrar os dentes e passei a mão em meus cabelos.
— Já que você optou por essa palavra que a usemos — ela se levantou de sua cadeira — Manipuladoras... mas comigo essas palavras não funcionam. Sei do que é capaz, Olívia, sei muito bem — Ela andou lentamente pela sala.
— Acredito que não — falei me virando na cadeira ao passo que ela se deslocava pela sala — Ninguém me conhece totalmente, as pessoas conhecem o que eu deixo conhecer, tenha certeza, eu sou muito mais — sorri dessa vez de forma sarcástica — Ou menos do que a senhora e toda a sua equipe imaginam juntos, agora... Será que eu posso voltar ao meu quarto?
— Ela me observou cautelosamente — Nós ainda não terminamos Olívia. Ainda temos muito a tratar.
— a Senhora ainda tem muito a tratar, mas não comigo — falei me levantando da cadeira e caminhando até a porta — tem mais vidas aí fora para que a senhora possa tratar, mas a minha não, ninguém tem o poder de me tratar, eu faço o que eu quero, eu me domino, eu tenho o meu controle — respondi antes de me virar e dar uma piscada de olho para ela.
Não tem absolutamente nada mais idiota do que ser taxada como "a louca" "a psicopata" é algo questionável, bastante questionável. Eu não toquei fogo em casa, não matei meu irmão nem namorados, nunca briguei na escola muito menos desrespeitei algum professor e do nada, seus pais resolvem te por em um hospital psiquiátrico com o seguinte pretexto: "Você possui personalidade forte demais, temos medo do quanto isso pode lhe prejudicar, você irá e voltará logo, logo" Ora bolas, isso é praticamente mandar um trabalhador para a cadeia por ele ser "competente demais e essa competência pode resultar em grandes prejuízos para a fábrica ou empresa onde ele trabalha", não irá ajudar em nada, ou melhor, ele terá convívio com pessoas que realmente prejudicaram essa empresa, e isso será somente um aprendizado para esse empregado, que pode trabalhar em outra empresa e trocar a competência pelo prejudicial. Lógico? Só um pouco, mas nem tudo pode ser regado à lógica, ela às vezes tende a ser insuportável e desnecessária. Como um cristão fiel que acredita na lógica acima de tudo, certo, você crê em uma pessoa na qual não tem nenhuma certeza se existiu, e se existiu pode ter sido só uma pessoa que foi crucificada sumiu e foi considerado um Deus? Tem alguma coisa errada aí, meu querido. E quanto a minha capacidade de mudar de assunto rapidamente, sem avisos? Está ótima, eu costumo chamar de "desfoque" uma hora penso em uma coisa, outra hora penso em outra e coloco essas coisas uma frente as outras atrapalhando toda a coisa. Tenho certeza que se contar desse meu desfoque para a Doutora Basten ela vai chamar de um distúrbio de nome estranho e colocar mais uma doença psicológica sobre mim, o que quer dizer que, quanto menos eu falar mais normal eu posso ser.
— Clarice! — Disse sentando ao seu lado em um banco que ficava localizada em um corredor enorme de piso branco e paredes azuis bem claras — O que está fazendo aqui?
—E...eu vim ver os pássaros, os pássaros, eles não são lindos? — Ela me perguntou apontando para a parede na ilusão de realmente haver pássaros ali.
— Clarice... Não tem pássaro algum, é só a sua visão te traindo mais uma vez, mas olha você ainda vai ver pássaros — eu sorri passando a mão em seus cabelos — quando você morrer, claro. — sorri, mas dessa vez sem mostrar os dentes — Afinal sabemos que as esperanças de sairmos daqui são as mínimas possíveis, e — abaixei os olhos — será que quando sairmos daqui, se sairmos daqui ainda existirá pássaro?
— Olívia — ela colocou a mão em meu colo, mão que eu disfarçadamente tirei. Detestava quando tocavam em mim, independente de quem seja, eu odiava, qualquer toque em mim — Você acha que eles podem morrer? Todos?
— Não tenho certeza, mas creio que sim. — voltei a levantar os olhos — mas não se preocupe, acredito que não estará mais viva para presenciar a morte dos pássaros.
— Tem certeza? — ela perguntou me olhando.
— Claro que tenho, as chances de alguém sair daqui vivo são as mínimas possíveis, sabe o que eu quero fazer? —perguntei baixo e logo me respondi — fugir, eu vou tentar ir amanhã quer vir comigo? .
— Claro, Oli — ela me abraçou e eu tive vontade de parti-la em meio, mas eu precisava dela, ela era muito útil para que e conseguisse sair daquele inferno e voltar a conviver em uma sociedade tão lúcida quanto eu — Que horas?
— seis horas da noite, pela cozinha, que é a hora na qual os funcionários estão todos concentrados enquanto jantam.
— mas eles não jantam na cozinha? — Ela me perguntou enquanto me soltou.
— Não, eles jantam no refeitório, te encontro lá, arrume todas as suas coisas.
— Farei isso agora mesmo — ela me soltou e foi correndo para seu quarto.
— Tchau, Clarice! Até amanhã — acenei enquanto me levantava do banco e voltava a caminhar pelo corredor até meu quarto. Meus passos eram lentos, mas determinados, eu estava disposta a tudo, conseguir o que queria e com certeza conseguiria.
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Insana
Teen FictionNão tem absolutamente nada mais idiota do que ser taxada como "a louca" "a psicopata" é algo questionável, bastante questionável. Eu não toquei fogo em casa, não matei meu irmão nem namorados, nunca briguei na escola muito menos desrespeitei algum p...