I. Wither underneath.

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"If I could face them
If I could make amends with all my shadows
I'd bow my head and welcome them
But I feel it burning
Like when the winter wind
Stops my breathing"

"Se eu conseguisse encará-las
Se eu conseguisse me reconciliar com minhas sombras
Eu inclinaria minha cabeça e as daria boas-vindas
Mas, eu as sinto queimando
Como quando o vento do inverno
Pára minha respiração"



                                 ♦️

A parte boa de estar anestesiado é que você não sente nada na hora. A parte ruim é exatamente a mesma. Você não sente nada, e não interpreta os limites do seu corpo. Toda a dor que parece ter evaporado, aparecerá – com juros – tão logo que o efeito acabe. Mais ou menos como se você tivesse sido atropelado por uma bicicleta e desmaiado, mas assim que você acordar terá que lidar com a sensação de que na verdade tinha sido um caminhão.

Louis abriu os olhos, sentindo todo o seu corpo doer. A cabeça latejava, a garganta queimava como o inferno, seus olhos pareciam carregar quilos de areia sob as pálpebras, cada articulação de seu corpo parecia ter sido cimentada numa mesma posição, sua bunda ardia pra caralho e sua pele estava arrepiada por baixo de uma irritante e grossa camada de suor.

E a pior parte é que ele estava acostumado a tudo isso.

Levantar da cama, todos os dias, consistia basicamente na mesma coisa. Era quase um tipo doentio de ritual. Ele rolava até estar com a barriga para cima, e então começava a abrir os olhos lentamente, piscando incontáveis vezes até que se adaptassem à luz incomoda. Depois começava a movimentar os dedos das mãos, sentindo-os raspar na espuma do colchão, e então o pulso, e por fim esticava os pés, rotacionando-os enquanto ouvia os ossos estalarem, e nessa hora ele sempre gemia um pouco de dor. Quando achasse que estava forte o suficiente para encarar a realidade, ele vagava os olhos pelo ambiente, tentando se localizar e rezando para que estivesse em algum lugar conhecido.

Manchas de mofo no teto, mesinha de cabeceira feita de madeira escura e velha, com várias lascas faltando. Mochila com algumas roupas no chão, nenhuma janela, sendo a única luz do quarto proveniente da lâmpada que ainda estava acesa. O quadro com uma foto de pessoas que ele não conhece – provavelmente uma família – ridiculamente falhando na tentativa de decorar a parede com tinta quase totalmente descascada. Um espelho pequeno, abandonado e trincado, colocado num ponto estratégico do cômodo para que Louis só precisasse encara-lo nos escassos dias em que resolvia se barbear. Uma única cadeira. A porta rachada de um banheiro tão pequeno que o chuveiro ficava quase em cima da privada. E da pia.

E era isso. O lugar conhecido que ele havia rezado para estar. Isso era onde Louis morava. Ele nunca seria sarcástico o suficiente para chamar o lugar de "casa", mas pelo menos chamar de "quarto" já era algo que o fazia se sentir menos pior a respeito. Era seu único lugar no mundo, afinal de contas, e ainda assim nem era dele. A verdade é que o "quarto" era só um cubículo no fundo de um bar decadente, e que servia pra guardar o estoque das bebidas no passado. Quando Lass – o dono do bar – achou que o cômodo estava ruim demais pra seus próprios produtos, ele aceitou que Louis se instalasse lá em troca de alguns "favores".

Apesar disso, ele nunca havia pedido sexo. Ele apenas pedia que Louis deixasse seus "amigos" (clientes) o foderem e ficava com a maior parte do dinheiro, e é óbvio que Louis nunca havia recusado. Esse quartinho abafado, tomado por mofo, e que com certeza seria gelado demais no inverno para que ele pudesse continuar morando, ainda era melhor que a rua que havia passado as últimas semanas antes de conhecer Lass e se mudar pra lá, levando apenas uma mochila.

Libertines | L.S. (HIATUS)Onde histórias criam vida. Descubra agora