Precisamos falar sobre o verão - III

2.4K 420 171
                                    

Ao chegar em casa, esqueço toda a decepção e a vergonha ao me deparar com Beca tentando acender uma fogueira no gramado, e corro até ela.

— Miga, sua louca — paro ao lado dela, colocando as mãos na cintura — Que isso, quer colocar fogo na casa?

— Na verdade, eu só queria assar umas batatas mesmo — Beca dá de ombros, os cabelos azuis escorregando pelos ombros.

— Batatas?

— Versão brasileira dos marshmellows, bobão.

— Nossa, isso explica taanta coisa — arregalo os olhos, pegando a travessa rapidamente; e corro até a porta de casa, deixando Beca para fora.

— Andréé — grita ela, esmurrando a porta com força.

— Aprenda com o chef — replico, e só abro a porta após assar uma batata na chama do fogão, espetando-a com um garfo e levando até minha irmã — Prova.

— Passa esse garfo pra cá, as batatas vão ser só minhas. Estão boas demais para você — diz Beca, rindo no ar fresco da noite.

***

Lista da madrugada: o por quê de Amora não querer me beijar
~ Ela mal me conhece
~ Não conseguiu me enxergar no escuro e ficou com medo de que eu fosse feio
~ Achou minha risada esquisita
~ Se valoriza demais e nem dá a mínima para alguém como eu

Penso melhor, arrancando a folha do caderno e metendo-na no bolso do pijama. Preparo a caneta.

Lista da madrugada: porque seria bom se Amora tivesse aceito o beijo
~ Não seria bom, seria... Inexplicável. Eu acho.
~ Mal me conhece (um ponto positivo para ela, se eu for uma vergonha tão grande).

Paro de escrever novamente, arrancando a outra folha. Seria bom se tivesse acontecido, mas não aconteceu, certo? Eu não devo procurá-la, certo?

***

Errado. Quer dizer, eu não a procurei, mas foi inevitável. Quem diria que, se eu tivesse desviado meu caminho habitual pela cidade em menos de um quarteirão, teria encontrado Amora todos os dias.
Tão linda.
Ela trabalha na loja dos pais, que aparentemente é ao lado do chalé onde Pâmela mora.

— Tudo bem? — Beca estala os dedos em frente ao meu rosto, fazendo com que desvie meu olhar para ela — Não sabia que você tem interesse em vestes indianas e incensos cancerígenos, maninho.

— Não seja ridícula, não é nada disso — replico, tentando disfarçar o fato de que coro até diante da minha própria irmã.

— Claro, claro — ela dá um sorriso compassivo antes de abrir a porta e entrar na casa de Pâmela.

E me sinto a pessoa mais boba do mundo observando Amora através da vitrine, usando um vestido rodado estampado com pequenas flores vermelhas. Ela está tomando conta da loja sozinha, lendo um livro.

— Só uma pergunta — digo, ao fazer soar o sino de vento sobre a porta.

— Oi, André — Amora coloca o livro de forma apressada sob o balcão, se levantando — Que foi?

— O que influenciou aquele momento tão rápido ontem — falo, fazendo esforço para não me atrapalhar com as palavras — foi a escolha de Love Is A Verb?

— É. Quero dizer, — ela se interrompe, abrindo uma porta lateral — Espera — pede, sinalizando para mim — Paulo, toma conta da loja por um minutinho? Por favor?

— Tá bem — o cara-do-rabo-de-cavalo dá uma olhada na loja vazia e veste uma bata indiana verde escura por cima da cabeça, enquanto saímos.

— Então — digo, me sentando no muro de pedra que separa a calçada da praia.

— André — Amora aperta os lábios, os olhos castanhos muito abertos — Sabe aquele padrão para julgar uma sorveteria, pedindo o sorvete de pistache para saber se ela é realmente boa?

— Sei — replico, desviando o olhar para a areia.

— Você gosta de John Mayer, André — ela segura meu pulso.

— Amora — pisco, tentando processar suas palavras — Você não quis me beijar por causa de uma música? Sem saber se eu gosto da letra ou apenas da melodia? Equiparando um beijo a um padrão para testar sorveterias?

— Quando você fala parece bem pior — diz ela, deixando os ombros caírem.

— É, Amora — dou um meio sorriso a ela, enfiando as mãos nos bolsos e me levantando. Sinto algo entre meus dedos, e tiro as duas listas que fiz ontem à noite; devo ter colocado no bolso da bermuda inconscientemente — Aqui, fica com isso — estendo as folhas de caderno para ela, me afastando.

***

Amora surge no quiosque de tio Ab três dias depois, sentando-se de frente para mim na mesa em que ocupo, esperando Vitor; não diz nada, apenas rabisca algo num guardanapo e desliza-o pela mesa.

Amor é verbo, amor é inconstante. Concordo com qualquer coisa, seja intenso, caleidoscópico ou bobagem.
Are you really gonna love me when I'm gone?

— Pergunta tão boba pra quem tem amor no nome e na alma, Amora — é o que respondo a ela, antes de sorrir contra seus lábios; nós sobre o mesmo rochedo, o sol se pondo mais bonito nesse 31 de janeiro do que nunca antes.

***
Antes que você vá embora, obrigada! Foram quase 3.800 palavras escritas à base de várias músicas no repeat, desespero de não terminar a tempo (apoiado pela MariaaaPN – sério, ela me entende tanto. Quero ir até Minas sequestrar essa linda) e inspiração da Beca (rebecaxvr) : considere um presente de aniversário pelo dia 1º de Março, haha ❤️ Vamos falar pra ela ter esse cabelo azul maravilhoso na vida real
De novo: torçam por mim, estou cruzando até os dedos dos pés já, hahaha

Precisamos Falar Sobre O VerãoOnde histórias criam vida. Descubra agora