Eu estava parado em frente à porta dela fazia 15 minutos, mas eu sentia como se fossem 15 décadas. Em um ato de coragem que eu não sabia que tinha, pressionei o botão ligeiramente, como se eu fosse levar um choque se ficasse com a mão nele por mais tempo. Ela atendeu a porta rapidamente. Sua boca abriu levemente ao perceber que era eu ali. Depois de se recuperar da surpresa, me encarou.
- O que você está fazendo aqui?
- Não vai me convidar para entrar?
Após revirar os olhos para minha atitude, ela cedeu o espaço necessário para que eu entrasse em sua casa. A sala parecia igual a das minhas lembranças, exceto pelos porta-retratos. Todas as fotos em que eu estava foram substituídas. Ela com um cachorro, que eu desconhecia, com os pais dela e em uma viagem recente. Quando meus olhos começaram a marejar, ela chamou minha atenção. Havíamos alcançado a pequena mesa de quatro lugares, que ainda ficava abaixo da janela.
- Sente-se. Quer alguma coisa para beber?
-Uma água.
Ela me deixou ali e foi em direção à cozinha, voltou com um copo cheio e o depositou em minha frente. Sentou-se na cadeira oposta a minha enquanto me observava.
- Agora já pode me dizer o que veio fazer aqui?
- Eu queria saber de você, como está a sua vida.
- Melhor agora. Com você longe.
Eu pude ver a tristeza passando por seus olhos, no fundo aquilo não era totalmente verdade. Ficamos alguns minutos nos encarando. Ela com os braços cruzados, eu passando o dedo na borda do copo e nossos olhos sem serem desviados. Era um desafio silencioso, para ver até onde aguentaríamos sem falar o que queríamos realmente. Como sempre fora em nosso relacionamento, eu falei primeiro.
- Eu sinto sua falta.
- V-você...
Ela fez uma pausa. Fechou os olhos por alguns segundos e os abriu novamente. Eu pude ver a raiva, a decepção, a mágoa em seus olhos. Os mesmos sentimentos de pouco mais de um ano atrás. Eu não esperava vê-los hoje.
- Não bastou você estragar a minha vida há um ano, você resolveu voltar para tentar fazer a mesma coisa agora? Dessa vez eu não vou deixar. Por favor, vá embora.
- Eu não vim pra isso! Eu vim te pedir desculpas, vim falar com você sobre como eu errei lá atrás. Porém, uma coisa eu admito, vim tentar ter você de volta. Eu não sei o que me levou a tudo aquilo, beber e ser possessivo. Eu acho que eu não acreditava ser suficiente para você, mas ao invés de tentar melhorar eu fui buscar consolo no álcool, e aquilo aumentava ainda mais o meu medo de te perder para qualquer um.
- E você me perdeu de qualquer jeito.
Ela fechou os olhos novamente, inspirou fundo e se levantou, dando passos nervosos pela sala. Quando voltou a falar, a voz estava embargada, as lágrimas prontas para escaparem de seus olhos e rolarem por suas bochechas.
- Eu vou te contar como a minha vida está agora, e você aqui me falando essas coisas representa uma ameaça a tudo isso e eu não sou capaz de aguentar. Começando pela promoção que eu perdi, por sua causa, eu consegui. Depois de quatro meses trabalhando como uma cavala para conquistar a confiança do meu chefe, que eu não tinha mais por causa do seu showzinho. Voltei a falar com minhas amigas, após inúmeros pedidos de desculpa por ter me afastado, por estar cega de amor por você. E, além disso, eu achei um cara que me dá a atenção que eu preciso, que me apoia e que, principalmente, não se acha meu dono. E também tem ele.
A ultima frase ela falou sussurrando, como se não quisesse que eu ouvisse.
-Ele quem?
Ela estava do outro lado da sala observando a rua pela fresta da cortina. Quando notei que ela não iria me responder, me aproximei, passei meus braços pela sua cintura e apoiei meu queixo em seu ombro. Meu coração acelerou pela proximidade e pelo cheiro característico dela.
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I have no place in your reality
Short StoryHá aqueles que dizem que a beleza do ser humano está em sua habilidade de errar. É ela que diferencia um ser comum de um ser divino, juntamente com os defeitos e a tão ordinária mortalidade. Como consequência disso, existe a capacidade do perdão...