5 meses antes (Zaire)

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"Há mais mistérios entre o céu e a terra

do que a vã filosofia dos homens possa imaginar."

( William Shakespeare)


Airum, outubro de 2014.


Entre esses mistérios, um que os terráqueos nem imaginam é que todo planeta tem um espelho na mesma galáxia, conhecido como Gêmeo. Airum, do Sistema Oliptium, é o Gêmeo da Terra, do Sistema Solar.

Nossas condições de vida são semelhantes às dos humanos, a única diferença consiste na forma de usar nosso poder cerebral, o que, no fim, acaba por nos destacar. Somos uma espécie sobre-humana e treinados a desenvolver esse poder desde criança, por isso temos algumas habilidades realmente fantásticas, entre elas a telepatia e a telecinese.

Alguns airumanos, ainda contam com um bônus e são abençoados com um dom, que geralmente aparece por volta dos seus vinte e cinco anos de vida. Estes passam a ter a honra de incorporar a Guarda Real, que serve e protege a Família Real e seus interesses.

Acreditamos que a Família Real é definida pelo Criador, ao favorecer um airumano com o dom da cura física, pois aos nossos olhos, é o dom mais puro e altruísta. E é o mais raro de aparecer também; atualmente, só a Soberana Anciã o possui.

O segundo dom mais respeitado em nossa civilização, é o da sensibilidade. As pessoas que tiverem esse dom ocupam os mais altos cargos na Guarda Real, por terem alta capacidade de utilizar-se do conhecimento que seus sentidos captam do mundo exterior, o que, aliado à empatia que já é tão bem desenvolvida em toda a Guarda, pode detectar sentimentos alheios e suas motivações, tendo um enorme poder em situações de conflito. Eu, no auge dos meus vinte e nove anos, sou um dos guardas mais velhos possuidor desse dom, fazendo-me ter o peso de uma grande responsabilidade nas costas. Não que esteja reclamando, há muitos anos treino pesado para ser um guarda real e ansiava por um dom. Mas eu tinha outra coisa em mente... Queria mais trabalho de campo. Lutar com os Glockis, que é a parte podre da nossa raça sobre-humana; ou atuar na Terra, instigando ideias inovadoras nos gênios humanos, para que eles possam avançar sem desconfiar da nossa dependência; até mesmo impedindo-os de se autodestruírem. Porém, fico um pouco preservado demais, por ordem da Anciã.

Quando falo em dependência, refiro-me ao fato de que a destruição da Terra alteraria o equilíbrio da galáxia. E também impediria nosso meio de uma vida mais longínqua, pois podemos chegar a viver por até duzentos anos.

E essa é outra informação que os humanos não sabem: os Espelhos se completam com recursos naturais, dando-nos meios para alcançar essa longevidade. Apesar de mais resistentes, não somos imortais; morremos quase que da mesma forma que eles, mas não por enfermidades. Quando nossa morte acontece naturalmente, na velhice, é pela perda total de nossa energia interior. O mais próximo de uma enfermidade que temos é a tristeza, pois nossas emoções são muito aguçadas, assim, tanto o amor quanto o desalento acontecem de forma muito potente.

Pode parecer injusto não compartilhar com os terráqueos essas informações de que, se eles soubessem de nós e dos nossos recursos, teriam meios para viver mais tempo. Mas não é. Eles não estão preparados para isso, não saberiam viver pacificamente e retirar somente o essencial do nosso planeta. Talvez até apelassem para uma guerra, basta ver a destruição que estão causando ao próprio planeta, tudo por ganância e egoísmo. Eles nem ao menos pensam no que estarão deixando à geração futura.

Eu, particularmente, nunca fui à Terra, mas temos equipes que se revezam constantemente por lá e relatam que não é somente da destruição dos seus bens naturais que os terráqueos sofrem, o pior é assistir alguns humanos perdendo sua humanidade; que é horrível ver as pessoas corrompendo-se e perdendo sua essência, principalmente as que são detentoras de poder. Implantamos a ideia para algumas curas importantes na raça deles, mas, pra não perderem os lucros que conseguem através dessas enfermidades, recusam-se a utilizar. Pessoas que deveriam estar curando pessoas, através de seus conhecimentos, estão usando-as como uma espécie de ratos de laboratório, distorcendo os papéis.

É por tudo isso que eles ainda não podem conviver conosco. E também não podemos interferir muito na vida deles, para não corrermos o risco da exposição; agimos somente quando muito necessário, controlando o perigo de uma destruição total ou danos muito graves.

É claro que alguns terráqueos já visualizaram as naves extraterrestres. Os alienígenas que, por vezes, eles veem sobrevoando o céu, não somos nós. Planetas espelhos possuem um portal entre si e não precisam de naves para se visitarem. Somente seres de planetas não conectados utilizam suas naves espaciais para atravessarem portais nos buracos negros e adentrarem as atmosferas de outros planetas, até mesmo em outras galáxias, buscando informações.

E, assim, os terráqueos ainda vivem no que denominam "Paradoxo de Fermi".

Ainda bem que todos airumanos que possuem um dom, e consequentemente fazem parte da Guarda, contam com uma qualidade quase mágica; a mais elevada forma de inteligência: uma excepcional intuição. Temos uma grande capacidade de usá-la e isso facilita o nosso trabalho na Terra.

"Zaire! Zaire!" Escuto meu irmão, Caire, chamando-me telepaticamente. Está entusiasmado e, pela força do pensamento, deve estar aqui.

"Entra!" , emito, da mesma forma.

— Você não vai acreditar! Um dos seus maiores desejos se concretizará e quis vir pessoalmente para ver sua expressão. — Diz ao aparecer na porta da minha cozinha.

— Não me lembro de ter falado sobre meus desejos com você! — brinco.

— Nem precisa, conheço-lhe o suficiente! E ele se realizará muito em breve. — fala convencidamente.

Caire também é da Guarda, mas participa ativamente do Conselho Real por ter o dom do discernimento, que o permite visualizar, com clareza, qual o caminho mais vantajoso diante de uma encruzilhada.

— Revele de uma vez! — falo sorrindo por seu suspense idiota e faço com que uma panela vazia, que está em cima do meu balcão de granito negro, voe em sua direção.

Ele, que percebeu a minha intenção, desvia com facilidade, achando graça.

— A Anciã e o Conselho estão lhe aguardando, você finalmente vai poder participar de uma missão na Terra! Pode acreditar? — diz, animado.

Não, eu não posso acreditar! Por isso, vou o mais rápido possível ao encontro deles...

***

— É por isto que, infelizmente, precisamos do seu dom e experiência na Terra. Você sabe que, se não fosse estritamente urgente e altamente confidencial, eu lhe pouparia. — Graças ao Criador por isso! Estou tão ansioso que nem consigo justificar o porquê.

— Entendo, Soberana. Mas fico feliz em poder usar minha experiência para colaborar com essa investigação tão delicada, além de conhecer pessoalmente o Gêmeo. Temos muito conhecimento da cultura deles aqui, mas é diferente poder ver como tudo é na prática.

— Você vai com Jetti, que já conhece o planeta e lhe ajudará a rastrear esse Glocki, uma vez que vocês não poderão usar todas as suas capacidades, porque precisarão agir com discrição diante dos humanos. — ela diz seriamente. — Não sei como ele conseguiu passar pelo portal, pois isso nunca aconteceu, mas quero que descubram e puniremos os responsáveis. Não preciso dizer que não podemos deixar que desconfiem desta investigação.

— Nós o localizaremos e faremos com que fale. — falo com convicção.

— Localizando-o ou não, você volta na data acordada. A Guarda precisa de você para o nosso objetivo aqui e não podemos aumentar esse prazo, ainda mais agora que os Glockis estão investindo pesado para tomarem o poder. Se for necessário, Jetti continua por lá. — ela determina.

Concordo e já estou de saída, quando recebo telepaticamente:

"Ah, Zaire! Só mais uma coisa, acredito que não preciso relembrar nossas leis para você, mas, para que fique bem claro: é terminantemente proibido expor nossa existência ou criar vínculos com os humanos, independente de quão agradável eles possam ser." A Anciã delimita, como se eu tivesse alguma chance de esquecer! Escutamos essas regras pelo menos uma vez por semana, desde que fomos introduzidos à Guarda.

Airum (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora