PARTE II.

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E ela realmente tentou.

Por uns cinco dias ou mais — o que ela considerou uma espécie de recorde, levando em consideração que, em quatro desse total, ela passou o tempo todo isolada em seu quarto.

O problema não foi sua força de vontade, porque, com sua teimosia inerente, ela ainda ignorava a existência do garoto.

O negócio era que era realmente difícil ignorar alguém quando essa pessoa não queria ser ignorada.

E Mason Cooper definitivamente não tolerava o comportamento frio e distante da garota.

Marshall não sabia se isso se devia a alguma demonstração de orgulho ferido ou se tudo não passava de implicância pura, mas, para o seu óbvio desagrado, aonde quer que ela fosse, ele estava sempre lá, como uma proliferação de fungos indecorosa, uma presença imutável e fantasmagórica que atormentava seus últimos dias de aula.

Certa vez, enquanto ela fazia uma manobra evasiva durante o mar de estudantes, Marshall tentava furtivamente escapar do seu alcance e do seu sorriso carregado de sabedoria, quando o garoto cutucou seu ombro logo à sua esquerda. Marshall saltou para longe do seu toque como se aquilo queimasse, demonstrando todo seu assombro numa reação tardia e exagerada.

— Você não está, por acaso, tentando me ignorar, está? – foi tudo o que ele disse, antes de soltar mais um daqueles sorrisos rasgados.

— Parece que não está funcionando, não é? – ela empinou o queixo, segurando os livros com força, o que apenas fez o sorriso dele se alargar mais.

— Não, não está.

Depois disso, ele virou as costas e foi embora, deixando-a extremamente aturdida pelos dias seguintes. Marshall passou a ser uma pessoa extremamente desconfiada, olhando sempre por trás do próprio ombro, escaneando todos os lugares com seus olhos ágeis e famintos em busca de alguma centelha de reconhecimento, um sorriso exagerado, um esfregar nervoso de nariz, qualquer coisa. Virando, sem nem perceber, uma pessoa assombrada pela imagem do seu tormento. Vez ou outra, enquanto ela estava respondendo algum questionamento de um professor, medindo as palavras com cautela, Marshall umedecia a ponta dos lábios com a língua, tossia baixinho e desviava o olhar perifericamente para a carteira de Mason, quem a encarava sorrindo com malícia sobre o uso das palavras que ela escolhia.

E isso a arruinava diariamente.

Mas foi só numa manhã de domingo que Marshall finalmente despejou a última gota de paciência no seu copo de tolerância.

Quando acordou naquele dia, ela realmente tinha jogado todas as suas perspectivas sobre ignorá-lo no ralo do banheiro... Estava cansada dos esbarrões propositais, das indiretas sutis e das investidas amargas, drenada pelos sorrisos descarados e as piadas irreverentes. Na última semana, havia acumulado sua frustração por tempo suficiente para transbordar e derramá-la nele. Então, naquela manhã, Marshall acordou com a resolução de que colocaria, talvez tarde demais, um ponto final em toda aquela história mal resolvida.

E ela seguiu com esse pensamento até entrar, literalmente, no próprio banheiro.

Assim que girou a maçaneta destrancada da porta, Marshall pôde ouvir um uivo abafado do outro lado, mas sua lentidão habitual matutina não foi capaz de refrear seus instintos motores ao escancarar a porta. O resmungo baixo logo se transformou num grito completo, que rasgou dos lábios da ruiva num protesto para a cena ridícula que se desenrolava a sua frente. Ela até tentou tapar os olhos, cobrindo o rosto para se poupar de tudo aquilo, mas já havia registrado o suficiente. Charlotte, com o cabelo meio enganchado no box do banheiro, soltou uma exclamação aguda, gritando para Marshall sair dali. Mas a garota estava ocupada demais observando a figura masculina estática no chuveiro do banheiro. Mason derrapou no piso úmido, tomando tempo o bastante apenas para equilibrar-se no tronco de Charlie ao tentar cobrir suas partes íntimas, arregalando os olhos ao enxergar Marshall do outro lado do cômodo. Marshall os observou com certa histeria, sentindo uma risada revoltante borbulhar no fundo da garganta, até que, com os cachos desgrenhados pela dormida, ergueu uma sobrancelha e os encarou com ceticismo, avaliando as manchas avermelhadas no tórax e no pescoço de Mason, além dos resquícios de batom vermelho.

Ela engoliu em seco, observou o cabide do banheiro e puxou um tecido qualquer entre suas roupas sujas, lançando-o na direção do garoto.

— Acho que você precisará disso na saída. – comentou com ironia. — Deus me livre de alguém achar que você está com sarna!

Mason apenas esticou o cachecol azul e espremeu os olhos na direção dela, evitando gargalhar. E foi nesse momento que ele decidiu que seria um ótimo passatempo tirá-la do sério.

Mas, antes que ele pudesse cogitar traçar um plano de ação para irritá-la ou constrangê-la, Marshall saiu batendo a porta do dormitório com força, vestida apenas com seu pijama.

YOU GOT ME [conto]Onde histórias criam vida. Descubra agora