Três

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Quando Mimi chegou a redação, Annete já tinha deixado uma mensagem para Max no correio eletrônico do número que Dona Katia tinha dado a ela. Não era permitido mas Mimi deixou uma caneca de café na mesa dela enquanto levava uma pro chefe. Não sabia nada sobre ele e nem o sobrenome pra poder pesquisar no Google. Bastava esperar a resposta dele. E Annete podia esperar, achava que ele logo logo iria responder. Essa gente ligada aos esportes adora uma  atenção da mídia, pensou ela. Logo ele entraria em contato e agraciaria a vida de Annete topando dar uma entrevista.
Depois da segunda caneca devidamente esvaziada Annete já não aguentava mais e ligou novamente para o número que a faxineira  tinha lhe dado. E o número chamava e nunca atendia. Era uma pena Dona Katia não ter o celular dele.
- tá esperando alguém te Ligar?
Era Mimi e o seu timming perfeito.
-Porque a pergunta? - Annete questionou a amiga enquanto mechia nos papéis sobre a mesa pra disfarçar.
- Você tá olhando o telefone como se ele pudesse sair voando a qualquer momento.
Annete deu de ombros. Tinha ficado assim tão óbvio?
- Na verdade sim, estou.
A amiga levantou as sobrancelhas bem desenhadas e apesar de estar curiosa não perguntou nada.
- Vamos almoçar comigo hoje? Tô faminta por um prato de macarrão com bastante queijo.
Annete olhou pro relógio
Já se passavam alguns minutos do meio dia. Ela levantou e desligou a tela do computador, buscando a bolsa embaixo da mesa as cegas. Não ia ficar esperando um atleta metido a besta. Ia comer macarrão e tomar uma Coca bem gelada. E não ia mais pensar naquela matéria.
Doce engano. Cada palavra que Mimi falava dava um eco e Annete não conseguia se concentrar em dar uma resposta. A amiga tinha que falar duas ou três vezes a mesma coisa pra ela poder compreender. O pensamento só no telefone em cima da mesa. Tocando sem ninguém pra atender. Meia hora de almoço e Annete decidiu voltar pra redação.
- não dá Mimi! Não consigo.
A amiga revirou os olhos, impaciente.
- Que saco Annete! Eu vou ficar aqui e terminar meu almoço.
Annete fez um beicinho e se despediu da amiga. Quem podia culpa-lá afinal, por ser tão ansiosa?
Nem sinal do tal treinador. Nem uma chamada perdida. Esperou mais alguns minutos e ligou novamente. Um, dois, três toques e uma voz feminina atendeu do outro lado da linha.
- alô?
Annete se endireitou na cadeira e respondeu
-Oi! boa tarde, gostaria de falar com Max.
- Quem gostaria?
-Annete, da gazeta dos esportes. Eu deixei ...
A voz feminina que não se identificou a interrompeu
- dois recados em menos de seis horas. É. Eu sei. Vou ver se ele pode te atender.
Annete achou de uma grosseria tamanha. O telefone não era nem dela. Nem era com ela que queria falar. Ao fundo Annete ouviu o diálogo que se sucedia:
"é a mulher da revista" "diz pra ela que eu não estou." "é se ela pedir um horário que você vai estar de volta?" " diz que eu viajei" Annete sempre achou isso engraçado. Como se a pessoa do outro lado da linha não pudesse ouvi-los. Além de ser muito rude. - Olha, ele não tá...
Annete decidiu mostrar que, bom, sabia das coisas.
- Tá viajando né?
A moça deu uma risadinha e confirmou.
- isso mesmo.
Annete suspirou. Esse cara já estava enchendo a paciência dela.
- se você puder fazer a gentileza de avisar seu namorado - deu ênfase na frase a seguir - quando ele voltar, que eu não vou desistir, eu agradeceria. Boa tarde!
Annete bateu o telefone com mais força do que gostaria. Além de não responder aos recados, nem que fosse com uma negativa, ele se recusava a falar com ela. Maldito! Annete não  sabia mais onde encontrar um jogador de hóquei sobre a grama. Então, Annete sintia muito mas o Sr. Max, a atenderia. Tinha que ser ele. Seria ele. Nem que pra isso ela precisasse ir atrás dele
Com um taco.

Sentada na cadeira, Annete estava a espera da Sra Katia. A pobre senhora levou um susto ao ver outra alma viva naquela redação tão cedo.
- Que susto menina!
Annete estava se sentindo muito determinada a conseguir um endereço. E ela não ia deixar a Dona Katia sair dali com a informação.
- Bom dia!
A faxineira sorrindo depositou um balde com produtos de limpeza no chão.
- Chegou cedo hoje, de novo.
- é a matéria.
A senhora assentiu e tirou do balde os produtos para enche-lo com um líquido verde que tinha  cheiro de eucalipto.
- conseguiu falar com o Max?
Annete engoliu em seco e se levantou. Preparando-se para explicar a importância da informação que estava prestes a solicitar. Annete sempre foi declinada a um drama. Tudo pra ela era vida ou morte. Oito ou oitenta.
- Por isso eu vim tão cedo. Precisava falar com a senhora sobre ele.
A senhora parou de fazer o que estava fazendo e fez uma cara de surpresa.
- Ele não quer falar comigo. Já liguei mil vezes e ele ainda teve a cara de pau de mandar a namorada me dizer que estava viajando. - exasperada, falando sem pausas - acredita nisso?
A faxineira varria o espaço enquanto Annete falava.
- Como faço pra ele falar comigo Dona Katia? A senhora tem que me ajudar!
A faxineira olhou pra moça a sua frente. Alta, com os cabelos presos num rabo de cavalo e olhos injetados, desesperados.
- Olha menina, eu nem podia dizer pra você o número dele. Se ele descobre que fui eu, me demite. E eu não vou dizer pra você que ele treina aquele bando de menino no jockey clube. - Katia olhou pra menina a sua frente e viu um pouco de si, sorrindo concluiu - Não posso dizer de jeito nenhum!
Annete sorriu e conteve-se mas, sentiu vontade de rodar a faxineira no ar. Precisava dar a ela um presente.

- Mimi, tô saindo pra pesquisa de campo. Preciso do carro.
Mimi era a secretária do chefe. Ela era quem liberava carros, verbas e tickets pra comer e tudo mais. Todo mundo na redação tinha uma birra com Annete, que conseguia tudo sem burocracia. Por isso ela era incumbida de organizar as festas de fim de ano, almoços e jantares. Pra Annete era tudo liberado!
Mimi, que mastigava um chiclete e exala um cheiro de cereja, abriu a primeira gaveta e vasculhava lá dentro.
- Com ou sem ar?
Annete revirou os olhos diante da pergunta ridícula.
- Com ar, óbvio.
A ruiva sorriu e entregou a chave para a amiga. Annete tomou a chave das mãos dela e antes de sair, mencionou:
- Pizza hoje. Eu pago. Pra compensar o almoço italiano de ontem.
Mandou um beijo e saiu. Com o vento esvoaçando a saia rosa de cetim e batendo os saltos no chão limpo e que tinha cheiro de eucalipto.

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⏰ Última atualização: Apr 03, 2016 ⏰

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