Era mais um daqueles dias... Podia sentir que algo estranho pairava no ar. Não sabia o que era, apenas tinha a enorme impressão de que coisas ruins estavam por vir. Mal sabia eu, ou melhor, como poderia imaginar, que aquele dia, seria o começo do fim.
[...]
Então... Como deveria começar..? Bom, meu nome é Nicholas e tenho catorze anos. Não sei muito bem o que falar de mim. Minha vida se resume a pouca coisa.
Eu moro nas ruas... Isso, não posso negar. Antigamente, tinha vergonha de assumir... Mas hoje em dia, não há mais como esconder...
Meus pais me abandonaram quando tinha uns cinco anos.
Bom, não sei ao certo se foi um abandono. Afinal, não me lembro muito bem de como ocorreu. Só estou vivo até hoje graças ao meu amigo, Michael. Ele me acolheu no momento em que mais precisava.
A verdade é que seus pais não concordavam com a nossa amizade. Eles tinham um enorme preconceito por mim, mas acabaram me aceitando... E com eles fiquei até os doze anos.
No ano retrasado, eu tive que partir. Deveria aprender a me virar sozinho. Caso o contrário, nunca estaria preparado para o mundo... Enfim, tudo estava ocorrendo bem... Muito bem. Até que o pior aconteceu...
[...]
Três da manhã. A brisa congelante entrava pelas minhas narinas... Mal podia respirar. O frio percorria minha espinha. A neblina esparsa me dava calafrios. Ao menos o suave cheiro do orvalho me fazia sentir bem.
A chuva, aos poucos, ameaçava cair. A estação estava deserta, como de costume. Por mais incrível que pareça, eu não conseguia pregar os olhos.
O telão eletrônico, com sua luz fraca, indicava: o próximo trem só chegaria em quarenta minutos.
Se eu esperava por ele? Não. Para ser sincero, a estação era o local onde eu passava a noite. Ao meu ver, ela é sempre tranquila, calma e aconchegante. Mas hoje ela estava diferente...
[...]
Um homem se aproxima. Um velho, para ser mais exato. Trajava um terno sofisticado, porém simples. Na cabeça, um chapéu escuro. Nas costas, uma mochila cinza com detalhes em azul. Nas mãos, uma bolsa preta de couro.
Ele me cumprimenta com um aceno. Aceno de volta, e retorno a minha tentativa frustrante de dormir.
Minha barriga começa a roncar... A fome me assombrava.
De sua mochila, ele tira um sanduíche de queijo...
Tentei disfarçar... Mas quer saber? Não era possível! A comida estava "sugando" meus olhos...
Ele me olha de relance, e minhas bochechas começam a corar. Ele dá uma risada engraçada e apanha o sanduíche. Começa a caminhar em minha direção.
Com um belo gesto de solidariedade, ele o põe em minhas mãos... "Adeus, etiqueta", foi só o que pensei.
Comi como se fosse um banquete.
Não sabia como agradecer. Um simples "obrigado" não bastava. Mas foi isso o que eu disse...
Trinta minutos para o próximo trem.
Trinta minutos para que o velho partisse.
Trinta minutos para que eu ficasse sozinho novamente...
Era a primeira vez que eu via alguém no local a essa hora. Nunca tive tempo para trocar "ideias noturnas"... Mas eu não podia dizer isso a ele. Não queria parecer um idiota...