Capítulo 6

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Vejo cada detalhe de sua morte. Abro os olhos assustada, João está em minha frente , não consigo me controlar ao impulso de sair correndo, pego minha bicicleta e vou o mais rápido que posso para a sorveteria. Preciso impedir a sequência de acontecimentos que vi. O pote caindo, Víctor abaixando para pegá lo, a tábua a cima solta, ele conferindo a máquina de sorvetes e prendendo sua mão, o fim de uma vida. Passo os semáforos fechados e finalmente chego.

- Víctor, Víctor - grito entrando na loja e indo direto pra cozinha. Ele está em uma escada pegando um pote de açúcar, o tal esta equilibrando a tábua e infelizmente ele não sabe, assim que desce ele caminha em direção da maquina de triturar frutas, na visão seu braço era moído e tábua extremamente pesada acertava lhe bem na cabeça.

- Víctor!! Por Kaoan sai daí - corro até ele e o puxo pro canto o pote vai ao chão derrubando todo o conteúdo, em questão de segundos a tábua cai. Ele me olha sem expressão, apenas fica ali me olhando, um silêncio desconfortável, devemos estar sozinhos, entrei tão desesperada que não notei.

- É... Oi.. - me afasto, mas Víctor me envolve em seus braços. Chega a doer a força com que ele me abraça. -Víctor já pode me soltar.

- Desculpa Lovara, como você sabia? - diz ele indo em direção a máquina - Ei, tem alguma coisa em baixo dessa tábua.

- Eu tive uma visão - acompanho ele e quando ergue a pesada tábua um gato preto sai e mia, levo um susto.

- Gato de rua - ele se vira pra mim novamente - Você está bem?

- Quem quase morreu foi você, eu estou ótima.

- Que bom, então já pode ir embora, ou está esperando algum pagamento? Ou melhor, está esperando o circo vir te buscar? Porque essa roupa né. - ele diz sem humor.

- Vem aqui, meu pagamento pode ser compensado com uma coisa - me aproximo lentamente dele, olhando intensamente para seus olhos tentando ficar sem expressão, assim que estamos perto o suficiente dou lhe um tapa na cara - prontinho.

...

"A vida tende a ser prazerosa, mas dolorosa em algumas situações. Quando levo uma alma, seja ela boa ou ruim, me fortaleço. A carne humana é rica em vários componentes, mas pra mim eles são desnecessários, então deixo os corpos em seus caixões, aqueles que as famílias gastam seu dinheiro para comprar, fica em baixo da terra e ninguém , acho um absurdo. a alma de alguém é meu alimento, me sustenta de imediato, mas se alguém demora para vir... É como se fosse um alimento raro e desejado, e cada vez que eu tento pegar e não consigo se torna mais cobiçado, vai ficando mais saboroso e almejado. E a luta para lo se torna necessária."

...

- Lovara! Onde você estava? Tem noção do quanto me deixou preocupado? - dispara João assim que entro em casa. Corro até ele e o abraço.

- Eu não posso te contar, não sei o que esta acontecendo comigo, mas estou tão confusa e arrependida de onde fui.

- Poxa vida, não fica assim. - ele segura meu rosto e acaricia minha bochecha com o dedão. Coloco a mão por cima da sua e me permito chorar.

- Lovara. A mamãe e o papai ligaram o dia todo querendo notícias suas. Ei está chorando? - entra Beto.

- Não, não. Estou regando minhas espinhas invisíveis - digo sem paciência.

- Não estou brincando, estava preocupado também. Mas enfim, já esta em casa então tudo bem, na mesa tem um resto de pizza, amanhã nós vamos no mercado e nossos pais vão demorar em torno de uns 15 dias. - diz Beto subindo para o quarto. Bufo e volto para João.

- Está tudo bem, pode ir pra casa, amanhã conversamos, não se preocupe! - abraço ele.

- Lovara eu ainda não falei com você, é sério o que eu tenho pra dizer, olha pra mim. - ele segura meu rosto, seus olhos estão brilhando e sua mão um pouco trêmula, consigo sentir.

- Diga o que é tão importante João. Descobriu que ganhou na loteria?

- É algo sobre mim, que eu preciso contar a você, não aguento mais. Tenho que resolver esse problema - diz ele seriamente.

- O que? Vai me contar que é um vampiro? Ou um lobisomem? Ah já sei, você é um feiticeiro! Ou pode ser um zumbi também.. Só não me diga que é um bru.. - João me interrompe com um beijo. Ele me beija e não sei por que, estou retribuindo os movimentos mas, que sensação... Estranha? João é meu amigo e ele esta me beijando? Ele abaixou as mãos para minha cintura, e me beija ferozmente, meu estômago embrulha. Coloco as mãos em seu peito para afastá lo, e no ato ele rapidamente para, me encara por míseros segundos com a cara assustada e sai correndo, batendo a porta da sala.

- João... - sussurro.

Subo para o quarto, eu estava com fome, mas agora não sinto nada. Exatamente, nada. Minha cabeça está rodando, porque ele me beijou? E porque saiu correndo daquele jeito? Eu já beijei outros garotos, mas não foi a mesma coisa. Será que eu o beijei tão mal assim? Mas não, somos amigos. Ele nunca deu indícios de sentir algo diferente por mim, eu acho.

Tomo um demorado banho, fazendo um filme sobre a minha vida até agora. Sinto falta da minha avó, ela me daria conselhos tão bons, saberia lidar com a situação... Nem pude ir no seu enterro, nem pude me despedir. Respiro fundo e termino, coloco um leve pijama e me deito com Lily na cama, passo a mão em seu pelo macio, e com um caderninho do lado, anoto tudo sobre as visões. Eu tenho que descobrir, isso é um problema que está me afetando internamente, não sou a mesma de duas semanas atrás. João poderia me ajudar a pesquisar sobre isso, mas será que ele ainda quer me ver? Me sinto sozinha, mais sozinha que o normal. Um vazio imenso, não sabia que ele era tão importante assim pra mim.

O Mistério De LovaraWhere stories live. Discover now