Capítulo Único.

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Havia acabado de acordar. Levantei-me, e como de rotina, fiz minha higiene pessoal; lavei o rosto, escovei os dentes, arrumei o cabelo. Aquela coisa de sempre. Ao me olhar no espelho, reparei olheiras nos olhos, com um pequeno borro de lápis de olho, mostrando que passara mais uma noite em claro, em meio às lágrimas. Isto estava sendo freqüente. A dor que ele me causou continua afetando-me, e dilacerando. Não me preocupei em limpar as manchas, pois sabia que estava sozinha. Sozinha na minha casa enorme, que era para ser nossa. Desci as escadas calmamente, e me direcionei á cozinha. Coloquei a água com açúcar pra ferver, e fui comprar pão na padaria da rua seguinte. Voltei, fiz o café, e sentei-me a mesa após pegar o jornal.

Tem sido assim nas últimas semanas. Uma rotina única, e solitária. Os "amigos" que um dia tive, descobri que se foram junto a ele. Não tenho ninguém, sou só eu e Deus. O vazio em meu coração parece que nunca será preenchido. É um buraco sem fundo, sem ninguém. Eu hei de ficar mais fria após o ocorrido. Sorrir é uma coisa que meu corpo não conhece mais, gargalhar então, nem se fala. Somente um falso sorriso aqui, outro ali pra mostrar educação de minha parte ao sair pra fazer as compras do mês. Trabalhava em casa, pelo computador. Enviava os relatórios pelo e-mail, e o meu salário era transferido pro meu cartão.

Os feriados que geralmente são comemorados em família, eu comemoro em casa, chorando enquanto vejo um filme de romance na televisão, no escuro, enquanto penso nele. Semana que vem, seria natal. Aquele dia tão esperado por crianças, pra receber seus presentes; tão esperado pelos pais, para vê-las sorrir ao ver o que ganhara; tão esperado pelos adolescentes pra receber um presente daquele alguém.

Natal era o dia que ele mais gostava no ano. Era quando íamos á praia, ver as estrelas, sem ninguém, só nós. E por conseqüência, era meu dia favorito também.

Mas que hoje, me entristece. Entristece por lembranças que teimam a vir em minha mente, lembranças tão boas, e bobas. Coisas simples que ele fazia pra me ver sorrir, ou pra me beijar. Fazia aquelas coisas chicles, que tanto me lembra o amor. Aquele sorriso, com um toque de malicia que ele dava pra mim quando diziam que combinávamos um com o outro. Como quando me abraçava, e mordia o topo de minha orelha. Ou me subornava com simples abraços.

Sei que devia sorrir, ao lembrar esses momentos que tanto me fizeram bem, mas não consigo. Ele levou todas as minhas forças pra sorrir, levou metade de mim. A metade feliz, e contente.

...

O natal chegou. A neve esta aí, junto com mais lágrimas a vir essa noite. Eram quase sete da noite, quando decidi andar rua á fora, pois não queria mais olhar aquela casa vazia. Agasalhei-me ao máximo, e saí. Vi crianças á brincar pelas varandas de suas casas, casais abraçados na tentativa de expulsar o frio, e trazer o quente. Estremeci ao ver. Vi famílias juntas, dentro de casa, pela janela transparente. A cidade piscava, sem ordem, sem limites, com todas as luzes de natal. Avistei crianças de boca aberta, olhando pra cima, na esperança de cair um único floco de neve na língua.

Falei pra mim mesma... "É natal."

Andei até a praça local. Enfeitada com papai Noel aqui e ali, anjos, e mais luzes pisca-pisca. Veio um velhinho com sua roupa de papai Noel, balançando um sino á mão. Viu-me de longe, se aproximou de mim, e me entregou uma rosa, de plástico, junto com um "Sorria, é natal."

Não tive forças, não consegui sorrir. Só senti as lágrimas pesando meus olhos. Continuei a andar, reparando nos mínimos detalhes de tudo.

Vi uma adolescente ao longe... Usava uma calça, rasgada ao joelho. Calçada de um all star, e um casaco enorme, vermelho. Uma touca listrada, de branco e vermelho á cabeça. Batia o queixo de frio. Veio um garoto, alto, magro, e de cabelo grande e bem bagunçado. A abraçou por trás, e os dois saíram andando.

Uma lágrima escorreu pela minha face.

Continuei a olhar em volta. De longe, vi um garotinho, vestido de vermelho. Aparentava ter quatro simples anos. Veio até mim sorridente, me entregou uma rosa, e disse "Solia, é natal."

Peguei a rosa, e o mesmo saiu correndo. Mais uma lágrima teimosa, escorreu pela minha face.

Mais á frente, um casal andava de mãos dadas. Os dois de cabelos grisalhos, brancos com poucos fios negros. Ela sorria cada uma das vezes que o via mexer a boca pra falar algo.

E lá se vai mais uma lágrima, mas desta vez, acompanhada de milhares de outras lágrimas.

O velhinho e sua provável esposa vieram até mim, me entregaram uma rosa, e disseram, em coro "Sorria, é natal."

Chorei mais e mais.

Sentei-me em um dos bancos da praça. Limpei as lágrimas, e respirei fundo.

O casal de adolescentes que eu havia reparado estava á minha frente quando abri os olhos.

O garoto tirou uma rosa da orelha da menina, e me entregou. Ele disse, "Sorria." E a menina que o acompanhava, completou a frase com um "É natal." Os dois sorriram pra mim, e saíram andando de mãos dadas.

Comecei a estranhar todas essas pessoas me entregando flores, e me falando pra sorrir, pois é natal. Levantei-me com todas aquelas rosas á mão, e fui ao meio fio da praça. Fiquei andando em volta da praça, até que uma carruagem puxada por um único cavalo parou á minha frente. O homem que comandava, esticou o braço, e me entregou uma rosa, dizendo "Sorria, é natal."

Peguei a rosa, e fiquei com a testa franzida, pensando no por que disso tudo.

Comecei a me direcionar ao caminho de casa, quando um jovem me parou.

"Espere!" ele disse. Parei, e lhe perguntei o que havia ocorrido. Ele respondeu com uma pergunta 'Acreditas no amor? Acreditas no perdão?"Fiquei boquiaberta e assenti com a cabeça. "Pois bem." Falou. "Tome esta rosa pra si, siga o caminho que lhe foi entregado, e descubra as entrelinhas." Ele me entregou um buquê de rosas, e saiu correndo. No buquê, havia um papel. Abri, e estava escrito "Tu há de ir onde avistou seu verdadeiro amor, pela última vez." Fiquei confusa, mas de primeira lembrei-me da praia. Pedi para o homem da carruagem levar-me até lá. O mesmo assentiu, e disse que não iria cobrar.

Desci da carruagem, e fui andando pela areia. Sentei-me no píer, com os pés descalços na água. Lá estava apagado, sem enfeites, sem luzes feitas pelo homem. Somente o brilho da lua. A leve brisa puxava meu cabelo pra trás do ombro. Senti um alivio. Uma sensação boa. Fechei os olhos, e me senti bem, pela primeira vez ao ano.

Quando abri os olhos novamente, um homem se sentou ao meu lado. Não consegui ver quem era, estava escuro, e eu ainda por cima tenho problema de visão. Mas, o mesmo disse "Por que choras menina?" Não consegui responder. Só senti as lágrimas escorrendo. Ele me entregou uma rosa, e disse como todas as outras pessoas, "Sorria, é natal." Mas me impressionou, quando completou a frase, com um "E lhe peço desculpas. Magoar-te jamais foi o meu querer. Amo te de verdade, e quero-lhe pra sempre." Era a letra da música que ele cantava pra mim. Olhei o homem ao meu lado, mas não consegui identificar. Ele deve ter reparado isto, pois pegou um eletrônico do bolso, e iluminou a face. Era ele. Aquele que havia me deixado pra ser militar. Estava de cabelo raspado, com uma blusa do exército. Eu sorri. Ele sorriu. Nós nos beijamos.

Foi somente aí, que me toquei que a frase, "Sorria, é natal." Veio da música que ele tanto cantara pra mim.

Sorri, pois é natal.

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Tô sumida, eu sei! Tá difícil conciliar vida com postar hauhauha desculpa galera! Continuo por aqui, mas somente acompanhando outras histórias, desculpa mesmo! Sempre que der eu venho compartilhar algo com vocês, prometo <3 (caso alguém ainda leia aqui)

MiniFic: Sorria, é natal.Onde histórias criam vida. Descubra agora