Primeiras Impressões

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— Ouvi falar que o anfitrião é um demônio!

Luah Alcântara olhou para a amiga e sorriu, é claro que Estela estava preocupada com o que iam falar, porém que diferença fazia afinal? Ela só ia se sentar num canto do pequeno palco e tocar seu violoncelo em silêncio para um bando de ricos esnobes como sempre faziam em grandes apresentações. Por volta da meia-noite a festa provavelmente acabaria, elas entrariam na van e iriam embora com o resto da banda ou iriam de metrô caso acabasse mais cedo, raramente alguém prestava atenção no cantor ou instrumentista, todo mundo só estava interessado em ouvir a música.

— Isso faz de nós então os ordenados!

Ela riu bem-humorada, preferia colocar daquela forma, preferia pensar que era paga para fazer algo que amava ao invés de ver seu talento como um fardo incompreendido como a maioria das pessoas da banda viam. Eles faziam parte da pequena Soul's, uma banda de jazz do Brooklyn que embalava vários sucessos de forma irreverente em eventos aos sábados e em dias da semana, e alegre aos domingos na igreja da comunidade, igreja essa que ela frequentava desde que se mudou para Nova York.

Luah morava em Nova York há muito tempo, mantinha residência na cidade há seis anos. Tinha ingressado na Julliard School aos dezessete anos e se formado em música e artes cênicas há um ano, ela tinha deixado tudo no Brasil para ir estudar fora.

Sempre que lembrava do dia em que teve que se mudar para os Estados Unidos ela se recordava de tudo o que deixou para trás, mas também do que trouxe consigo, lembrou-se que pegou única e maior mala e a carta de aceitação, então partiu rumo a América do Norte em busca de melhor oportunidade de vida.

Atualmente ela era uma musicista em início de carreira, não tão conhecida e não muito renomada na cidade, mesmo com a carga de vida e conhecimento sabia que estava muito longe da fama, não era algo que ela desejava também. Já havia tocado em muitos bailes beneficentes, festas de aniversário, casamentos, até mesmo em dois velórios de membros da igreja e todos os anos desde que ingressou na Julliard, no festival anual que acontecia no Central Parque.

— Imagino que esteja feliz, já que você vai tocar duas músicas solos hoje — Estela falou, empolgada. — Adoro ver você tocando.

Luah não acreditava que poderia ser a melhor da banda, ela preferia achar que todos tinham seu lugar e suas funções e que eram fundamentais para que tudo ocorresse muito bem, todos eram iguais lá, liderados pelo maestro e professor e tratados igualmente, eram dez musicistas e três cantores, duas backvocals e um carinha na percussão.

Todos sem exceção se dedicavam inteiramente em entreter o público com o repertório escolhido pelos clientes, o estilo de música da noite seria clássica, jazz e blues, o mais pedido entre pessoas como aquelas.

A empresa ficava no centro de Nova York, num prédio de trinta andares, ela não se ligava muito naquelas coisas porque nunca fora do tipo que lia revistas de negócios, mas ouvira falar que o dono era um multimilionário mão de ferro...

— Dizem que ele é muito arrogante — cochichou Estela.

E arrogante e petulante, que ficou conhecido no meio corporativo como alguém que humilha os outros...

— E frio feito uma Iceberg.

E frio feito um iceberg, enfim, não se importava desde que seu cheque estivesse depositado na conta no dia seguinte, ela precisava pagar os boletos para sobreviver e tinha centenas de compromissos, dois empregos e uma mãe no Brasil que queria receber a ajuda mensal de sempre, todo o dinheiro que viesse era sempre bem-vindo.

À Primeira Vista - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora