Harry Styles nunca saberia dizer como se sentia naquele momento. Ele observava as decorações encaixotadas de seu quarto cor pêssego, o tapete enrolado no canto, sua cama sem lençóis, travesseiros ou fronhas e duas malas próximas à porta. A faculdade sempre foi um grande sonho de sua mãe e, em determinado momento, seu próprio, e isso tinha se aproximado rápido demais.
Era difícil se lembrar da creche, era um ou outro flash de memória que passava por sua mente. A pré-escola era um pouco mais fácil, ele tinha a imagem de Gemma tentando controlar seus cachinhos, Anne gritando para que se apressassem, logo o colocando na cadeirinha do carro e tendo que voltar para pegar a lancheira esquecida. O dia se resumia em pintar, pintar e pintar, assistir Procurando Nemo, brincar com as outras crianças, comer o lanche e voltar para casa contando para Deus e o mundo o quão emocionante foi.
A primeira série foi complicada — claro, ele nunca havia imaginado as 26 letras do alfabeto e nem que 2+2 são 4. Na segunda série, a primeira paquera, as contas de vezes e aprender a escrever o nome era algo inimaginável, dava até para se sentir um adulto. Nos fragmentos da terceira série, querer crescer e ir pro ginásio era o mais sensacional e, no meio disso, Harry conseguiu entender o quão bom era correr na hora do intervalo, dividir o lanche com os amigos, fazer aquecimento na aula de educação física, ouvir a voz doce da srta. Murdock lendo algum conto de fadas, aprender números romanos, os movimentos de rotação da Terra, as classes de palavras, pronomes, grupos de animais, nomes mais conhecidos da história do mundo. Dentro disso, a quinta série havia chegado. Ele parou de brincar de pega-pega, mas ainda era empolgante comprar o material.
Sexta série fora o início das redações com o máximo de linhas sendo 25, personificação, tipos de sujeito e predicado, igual ou diferente (em símbolos), proporções, inequações, equações, U=Q, ângulos, x, y e z, reciclagem, meio ambiente, poluição, vegetações, variações climáticas, desigualdades raciais e sociais, Grécia, escrita linear, Heródoto. Brincadeiras à parte, salada-mista, verdade ou consequência, stop, jogo da velha e forca viraram rituais.
Sétima série: o ápice. Harry continuava tímido, mas era aberto com seus amigos. Descobriu que gostava de seus cachinhos e All Star, começou a ouvir pop e bandas de indie-rock, teve alguns ataques de asma, matou aula para se divertir com amigos, se achava adulto. Na companhia de seus amigos Niall e Liam, ele achava que nada poderia afetar aquela fase, só se esquecendo que o tempo não para. Slogans, logotipos, simetria, valores, áreas, hormônios, circulação, drogas, sistema nervoso central, sistema urinário, faringe, esôfago, varíola, epiglote, pelve renal, ejaculação, aborto — ele era a favor da legalização —, neurônios, metabolismo, recurso mineral, jazida, minério, Corrida Espacial, Guerra Fria, bipolarização mundial, ilhas e continentes, homossexualidade na antiguidade, o poder da igreja. Niall, Liam e Harry eram eternos.
Harry descobriu que gostava de beber coisas quentes e dormia muito, tipo, muito mesmo. Ele criava expectativas sobre shows não iria, jogava Neopets com Niall, tomava muito sorvete com Liam e gostava de beijar Nick. Ele se importava quando o olhavam torto enquanto trocava carinhos com o outro, observava sempre os lados, e não os olhos de Grimshaw quando estavam na rua. A oitava série estava bem ali e uau — logo, ele estaria no ensino médio e depois, na universidade. A sala de sua casa se tornava um santuário aos domingos, ele era um grande fã de The Walking Dead. Havia sido presenteado com uma gatinha malhada e a apelidou de Niet (era um grande fã de Nietzsche). Anne e Gemma comiam fast-food no mínimo duas vezes por semana e isso o deixava muito irritado, pregando o quão prejudicadas elas seriam no futuro. Ele gostou de ler Maus e História se tornou sua matéria favorita. Depois de potências, Bhaskara, Tales de Mileto, Pitágoras, equações do segundo grau, matéria, átomos, repouso, estrelas do mar, reprodução assexuada e sexuada, URSS, Berlim, socialismo, capitalismo, Aliados, judeus, Mussolini, Hitler, New Deal, Paris, dadaísmo e surrealismo, puff! Ele estava no primeiro ano.
Os anos seguintes passaram depressa. Lágrimas escaparam sem pudor na despedida de Niall para a Irlanda e de Liam para Nova York. Harry ficaria em Londres, mas ainda era distante de sua casa. Ele teria que arrumar um emprego e logo decidiu que faria História — se trabalhar em um museu não desse certo, ele tentaria em alguma biblioteca ou algo que se encaixasse.
Seu elemento é ar, mas ele quase pode jurar que não.
Agora, perdido em seu passado e na silhueta de Gemma puxando suas malas, ele sentiu uma dor enorme. Deixaria sua casa, Niet, Gemma, sua mãe, seus vizinhos chatos, Nick — que já se foi há tempos, mas tinham sobrado as lembraças —, seu quarto e os deliciosos sonhos da padaria da esquina. O sonho de sua mãe tinha se tornado seu e já era esperado que ele não moraria com ela pra sempre.
Sua mãe iria mandar uma certa quantia, até ele se estabelecer e arrumar um emprego, a bolsa na universidade e o quarto que ficaria por lá lhe foi uma das melhores oportunidades da vida. Era isso.
Logo, ele teria que partir no ônibus das 14h45, então decidiu que era hora de dizer tchau a tudo e seguir a vida.
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Em outro lugar de Londres, Louis Tomlinson se encontrava extasiado. Ele corria para tentar encontrar suas cuecas espalhadas pela casa; suas irmãs o ajudavam na medida do possível e Jay estava na parte de baixo fazendo algum aperitivo. Lottie e Fizzy fingiam não se importar, mas a verdade era que os corações estavam apertados em saber que o irmão mais velho estava indo embora de casa por algum tempo, já Daisy e Phoebe, essas corriam com suas Barbies, perguntando ao vento sobre como era a universidade.
Louis sempre quis essa emoção. Sair de casa, encontrar um curso, trabalhar, sair das asas da mamãe. Ele trabalhou em uma loja de brinquedos e agora tinha uma vaga em uma loja de xícaras. Ele conseguiu um desconto de 50% em seu curso de Literatura, teria um quarto e um colega de quarto e estava feliz com isso.
Por mais engraçado que fosse, mesmo depois de tantas reclamações sobre o barulho que suas 4 irmãs + Jay faziam, ele sabia que sentiria falta. Mas ele não estava mal por isso, tendo sempre em mente que a vida é feita de momentos e que temos que aproveitar ao máximo tudo que nos é proposto. Ele não seguia nenhuma religião, mas tinha no bolso um terço que foi presente de sua avó aos 14 anos e o acariciava com vontade.
Depois de ouvir o grito estridente de sua mãe, decidiu que compraria cuecas quando chegasse no seu destino, descendo a escada com uma mala de rodinhas e uma mochila da Adidas.
Jay tinha preparado cookies e serviu leite em 6 copos. Era o último café com a família completa até que Louis retornasse.
Um olhar silencioso foi trocado por Lottie e Jay, fazendo a mais nova ir em direção ao corredor e voltar um uma caixa média de veludo. Era de uma cor vinho maravilhosa.
Ao abrir, Louis se sentiu maravilhado com os quase 60 sachês de chá (já que alguns estavam faltando) e as 5 cartas das mulheres de sua vida. Seus olhos se encheram de lágrimas e ele agradeceu a quem quer que fosse por ter pessoas tão maravilhosas em sua vida.
Depois do abraço em família e dos votos para que tudo desse certo, Jay insistiu para uma carona até a rodoviária. Louis iria no ônibus das 14h45.

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cups • lwt+hes
FanficToda a jornada apaixonada (e cheia de altos e baixos) de Harry Edward Styles e Louis William Tomlinson, que consolidam laços eternos e inquebráveis quando passam a dividir um quarto na universidade. Harry é um dorminhoco nato e Louis gosta de chás n...