Eu estava pensando em desistir, até que veio a familiar sensação de um Chamado. Desespero, raiva, nojo de si, dor, o coração batendo cada vez mais forte. Tudo que a vítima estiver sentindo. Faço o necessário. Fecho os olhos, respiro bem fundo e tento adivinhar aonde tenho que ir. Esta parte sempre é a mais difícil, mas desta não foi, está acontecendo por perto. É na casa perto da que eu vivia. Entro sem fazer o menor barulho, mesmo sabendo que não preciso, já que não me vêem enquanto eu não o desejar. Por enquanto, não vejo nada. Resolvo ir procurar nos quartos. Abro a primeira porta que vejo, mas não tem ninguém, então sigo em frente. Abro a segunda porta e vejo o que procurava. O machão resolveu pegar a cunhada quando ela não quis. Me faço presente.
- Hey, quem é você? - Ele pergunta.
- Sou seu pesadelo. Vc, moça, saia dessa casa. Agora.
- Espera aí, ela não vai a lugar algum. É a última vez que pergunto: quem é vc?
- Eu já disse quem sou, omi. E o senhor está certo, aquela foi a última vez que perguntou.
Então, falo telepaticamente com a garota:
"Saia daqui, está tudo bem, agora."
Ela me olha e sorri. Finalmente, sai correndo. Agora a diversão começa.
- Então vc gosta de agarrar garotas à força? Terá o que merece.
- O que vai fazer? Me matar? - Ele diz e começa a gargalhar.
- Meu querido, você vai implorar por isso. Chega de papo.
Bato na sua cabeça forte o suficiente para fazê-lo desmaiar. Neste momento, invado sua mente, e tento descobrir seu maior medo.
Ah, não. Palhaços e bonecas. Cômico. Agora que já sei o maior medo desse pervertido, o amarro na cama e o acordo. Me transformo em algo aterrorizante. Um corpo de boneca de pano, sujo e cheio de rasgados. Rosto de palhaço, uma boca enorme e com dentes pontiagudos.
- Boa noite - Digo em minha forma assustadora.
- Q-quem... O-o que é vc?
Não respondo, simplesmente tiro uma faca da minha cintura e faço um corte em seu braço. Ele começa a gritar loucamente.
- Ah, porque grita tanto? Aposto que você está gostando.
Ele geme. Resolvo acabar com esse bem rápido. Ele será o último. Coloco esta faca em seu estômago. Tiro uma outra adaga e digo:
- Se acredita em Deus, agradeça por isso não demorar. Infelizmente, terá que fazer isso por oração. Vc não o verá pessoalmente, visto que está prestes a queimar nos fogos do inferno.
Dito isso, passo a adaga em sua garganta e observo a vida esvair de seu corpo.
Volto para casa e assim que entro, vou logo dormir. Ou melhor, me deitar. Às vezes, esqueço que não tenho mais vida. Enfim, me jogo na cama e, como sempre, lembro de quando foi a minha vez.
Era uma noite qualquer pra mim. Me vesti adequadamente para a balada. Liguei para uma das minhas amigas e perguntei a que horas poderia sair. Ela disse que eu já deveria ter feito isso. Então, fui à pé, a boate não era tão longe.
Um homem que passava me perguntou se eu estava perdida. Meu coração acelerou na hora. Disse que não, que sabia muito bem para onde estava indo. Ele me disse:
- Querida, está muito enganada, você realmente não sabe pra onde vai.
Ele solta um sorriso, e lá pude ver toda a perversão e maldade que estava prestes a acontecer.
E assim, parte pra cima de mim e me derruba. Assim que caí no chão, desmaiei, o impacto foi muito grande.
Quando acordei, percebi que aquele homem não estava lá. Outros estavam. Minha vista estava embaçada. Tentei me mexer, mas não conseguia. Olhei mais claramente em volta. Merda, eu estava em um lugar escuro e nojento, um fedor pútrido invadia minhas narinas. Até que percebi o que acontecia. Haviam, aproximadamente, 7 homens, alguns com seus membros pra fora, outros se preparando para tirá-los da cueca. Foi ali, naquele local que eu, pela primeira vez na vida, não queria ser eu mesma. Pela primeira vez, senti vontade de morrer. E também pela primeira vez, senti nojo de mim mesma. Lágrimas invadiam meu rosto e então, começo a gritar. Talvez, se eu fizesse isso, eles parariam e perceberiam o grande erro que cometiam, era isto que eu pensava. Na verdade, parece que eles se sentiram ainda mais motivados a continuar aquele show de horrores. Haviam dois dentro de mim. Depois destes, fui invadida mais 4 vezes.
Até que enfim, tudo acabara. Mas nada estava bem. Eu fui bruscamente deixada na beira de um rio que havia perto dali. Decidi, precisava dar um jeito naquilo. Deus não estava lá pra me ajudar. Deus nunca esteve do meu lado. Foi tendo estes pensamentos que decidi simplesmente esperar. Esperar e me encontrar com ele. Tirar satisfações. Uma pena que isto não ocorreu.
Horas depois, eu já não aguentava. As dores no meu corpo eram absurdas. Esperar por alguém que supostamente iria me salvar não me dava esperanças. Então, era isso que a minha mãe chamava de plano de Deus? Estar esperando a morte, abusada, torturada e psicologicamente traumatizada? Eu não iria deixar aquilo ficar assim, não pude me permitir. Sabia exatamente o que fazer. Já que o socorro não vinha de forma divina, ele viria de outra maneira.
Resolvi juntar meus cacos e ir pra casa. Tomei um banho, me limpei da melhor maneira que pude. Chorava muito. Eu não conseguia acreditar na quantidade absurda de lágrimas que eu produzia.
Vesti minhas melhores roupas e me perfurmei. Estava atraente. Para o que eu tinha mente se tornar realidade, eu iria precisar de ajuda. Mandei uma mensagem para meu amigo. Ele sabe muito sobre o que eu preciso. Pedi informações, pesquisei. Assim que tive tudo que eu precisava, olhei pela janela. Era o dia perfeito, que sorte a minha. Bem, eu poderia estar na balada, com um vestido lindo e arrasando com minhas amigas, então, de alguma forma, não estava nada bem. Saio de casa e me dirijo ao cemitério em que meu falecido pai jaz. Era uma noite fria, de lua cheia. Não vou mentir, um medo crescente me abatia. Se fosse voltar, seria naquele momento. Mas eu não voltei. Irei até o fim. Eles foram até o fim comigo, certo?!
Organizo tudo o que preciso no chão. Porra, nunca tinha reparado em quanto este lugar fede!
Coloco a última oferenda e começo a recitar:
In the name of the Dragon
I invoke Lúcifer
Lord of the Trident
He who guides the Ascending Soul on the path of the Gods
Phosphorus, the Light Bearer!
Dark God of the Qliphoth!
Open the way to your stellar realm
...
Depois que recitei toda a Invocação de Lúcifer, senti um frio inacreditável. Senti medo, muito medo. As dores no meu corpo só aumentavam.
Vi a silhueta de uma pessoa. De um homem. Desespero era tudo o que eu conseguia sentir. Ele estava se aproximando. A cada passo que ele dava em minha direção, meu medo aumentava ainda mais. Finalmente, chegou. Olhou em meus olhos e falou:
- Fui chamado, diga-me, o que queres
- Vingança
- E o que me oferece em troca? Tudo tem seu preço.
- Posso lhe entregar a minha alma. É tudo o que tenho, adoradissimo Senhor.
- Você sofreu bastante. Sofreu de uma maneira inexplicável. Sua alma está ferida e não irá se curar nunca. Consigo sentir sua dor, seu ódio, seus sentimentos ruins. E é exatamente o que quero. Acho que podemos fechar um acordo, certo?!
- Oh, por favor, Sr.
- Minha filha, conte me o que precisará para concretizar seus planos...Eu realmente não tinha pensado nisso.
- Bem, eu desejo que...
Fiz uma longa lista de exigências e realmente estava com medo de este homem bonito simplesmente me ignorar. Ele responde.
- Okay, por mim, está tudo bem. Tudo ficará bem contigo também. Precisa assinar o contrato. Me dê o braço direito.
- Como é??
- Pacto de sangue. É aquele papo de burocracia e tudo mais. Preciso do seu sangue, e precisa ser do braço direito. Vamos lá.
Estendí meu braço, senti uma dor profunda e assim, consigo fazer o que fiz hoje.
Quando uma garota, uma senhora ou a mulher que seja, é abusada, assediada ou se sente desconfortável com um homem, eu recebo um Chamado. Sinto no fundo da alma tudo o que as vítimas sentem. Não dá pra me acostumar.
Mas, como todo acordo, tem um preço. E o preço está sendo pago. Solidão. Eternidade na Terra. Somente sentimentos negativos entram no meu coração. A única maneira que tenho de desistir é me submetendo àquilo de novo. Para poder sair da Terra e ter meu descanso final, precisaria ser estuprada.
No começo, pensei que matar aqueles homens me traria alívio ou satisfação. A verdade é que não senti nada. Nunca senti nada ao matar todos os outros. Às vezes, dezenas no mesmo dia. Mas não me arrependo. Nenhum deles se arrependeu, por que eu deveria? Sinceramente, penso que todas as garotas que foram invadidas deveriam ter um pouco do que tenho. Matar seus agressores não traz alívio, mas pelo menos, eles não irão causar mais problemas.
O mundo está repleto de maldade. O meu show, com certeza, é maldade. Quem foi que disse que não se combate maldade com maldade? Cada um faz o que quer, cada um arca com as próprias consequências. Menos eu.
Meu nome é Eliza, fui atacada, mas sobrevivi. Estou sofrendo pelos pecados de outras 7 monstros. Nada está bem. A cada minuto, uma mulher arca com as consequências de um monstro, que às vezes pode ser aquele que considerava seu protetor, seu príncipe, seu bebezinho. Nada está bem, e enquanto tudo isso continuar, não estará.
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A vida em trevas
Historia CortaContos envolvendo comum e sobrenatural, rotineiro e fantástico Enjoy it!