Ficamos por alguns segundos a olhar o vento mudar a direções de algumas nuvens, que não estavam carregadas. As nuvens que não estavam, eram levadas com facilidade, arrastando consigo a sua forma e toda sua grandeza, enquanto as outras ameaçavam a qualquer momento despejar toda sua força sobre nós.
O garoto estava com o olhar cravado para um lugar mais longe, onde grandes nuvens despejavam grandes cargas d' águas e outras apenas deixavam cair alguns chuviscos.
Antes que eu pudesse pensar o que ele poderia estar imaginando, virou-se para mim com um olhar sério e misterioso.
Colocou o seu dedo indicador sobre a boca, como um gesto singelo de pensamento. Levantou levemente uma de suas sobrancelhas e perguntou-me.
- Mas então tio, porque que depois que as nuvens despejam todo o seu potencial sobre nós, depois que secam toda a sua água e tornando-se como as outras, vem o vento e as levam como se fossem iguais as que não possuem tal potencial?
Confesso que fiquei surpreso com o pensamento que ele me revelará.
Fiquei olhando para o garoto por alguns segundos, o qual me encarava calmamente esperando por uma resposta para aquela pergunta que não fazia sentido para ele mesmo.
Clamei ao meu inconsciente para que me ajudasse a lhe responder. Logo, veio a resposta.
- Pois bem, assim como as nuvens, o seu corpo sofre influência do nosso mundo. Todos os dias, o mundo está interagindo com o seu corpo. Há dias em que a sua potência é diminuída e outros aumentada. Espinosa explica isso muito bem. É comum que nesses dias de diminuição de potência, que o mundo te arraste com facilidade para algum tipo de tristeza ou solidão, até que alguma ação o faça voltar ao estado de potência. Acontece que, as vezes o mundo pode te arrastar como um tsunami batendo em uma casa de madeira, deixando apenas os pedaços. Mas vem o homem e recolhe cada um e reconstrói aquilo que foi despedaçado.
É da natureza levar aquilo que já não é mais necessário.– Tio e as nuvens que não conseguem carregar nada?
Olhei para o garoto com tamanha admiração pois ele conseguia entender o que eu dizia a ele. Tamanha foi minha felicidade que, o meu inconsciente despertou todas as respostas do mundo naquele momento. Com muita calma, o respondi.
– As nuvens que não conseguem carregar nada, são levadas e deixam o lugar para as outras. Mesmo que você não queira fazer nada nesse mundo, mesmo que você ache que a sua vida seja apenas existir, isso será o seu pensamento sobre a vida, pois a vida não nos determinou como viver. A regra de como viver vem do pensamento do homem. Isso significa que o significado de suas ações enquanto viver, é você quem determina. Um homem que teve o pensamento assombroso de ir a lua, não é diferente daquele que apenas andou pelo mundo sem direções por escolha do próprio. Claro que não é da natureza poder escolher se vai carregar águas ou não, mas o homem sim. O poder de escolha não faz diferença para o mundo, pois se não escolher o que quer fazer ou escolher, você será levado no final. A diferença é que para o mundo você não fará diferença mas para as pessoas que nele estão, sim.
Sem demora ele me respondeu.
–A nossa diferença então para qualquer coisa que existe é que temos a opção de escolher o que será feito? Qual a diferença de um cachorro para o homem? A diferença é que sua sublimação não existe, pois age pelos instintos e não por razão.
Tamanha foi a minha admiração com aquele garoto que ao terminar de falar, um sorriso no canto de minha boca se formou.
Refletir sobre a vida sempre foi a minha admiração. Encontrara naquele momento alguém que me deu uma resposta por qual eu sempre procurei.
Percebi que a nossa conversa apenas começará. Havia ali, dois homens carregados. Dessa vez, eu balancei a cabeça como afirmação sobre suas palavras.
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Palavras.
Non-FictionA história se passa em uma pequena cidade do interior. Reflexões e interpretações sobre a vida. Um livro de autoria de Hugo S.S. Revisão ortográfica por: Maria Clara Oliveira.