Capítulo 4

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Só estou mencionando as conversas com TH aqui, porém, porque me lembro de ter contado a ele que as coisas estavam indo bem. Fazia sol, e eu havia passado a maior parte do dia em Grind City, que, como vocês talvez saibam, é uma pista de skate que fica a uma curta distância de ônibus da minha casa. Quer dizer, provavelmente vocês não sabem que o lugar fica a uma curta distância de ônibus da minha casa, porque não sabem onde eu moro, mas se forem descolados ou conhecerem alguém descolado talvez já tenham ouvido falar dessa pista de skate. Em todo caso, Alicia e eu fomos ao cinema naquela noite. Talvez fosse a terceira ou quarta vez que sabíamos, e eu estava muito a fim dela. Quando cheguei em casa, minha mãe estava vendo um DVD com Paula, uma amiga dela. Mamãe me pareceu feliz, mas talvez isso fosse só imaginação minha. Talvez eu tivesse feliz, porque ela estava vendo um DVD com Paula e não com Steve, o namorado escroto.

- Como foi o filme? - perguntou mamãe.
- É, foi bom.
- Vocês viram alguma parte? - A Paula riu.

     Eu simplesmente fui para o meu quarto, porque não queria esse tipo de conversa com ela. Sentei na cama, olhei para TH, e disse:

- As coisas até que não andam mal.
- A vida é boa - ele concordou. - Nós nos mudamos para uma casa nova e maior numa lagoa, perto da praia. O mais importante é que a casa tinha um portão.

    Como eu disse, nem tudo que TH fala é certeiro, mas não é culpa dele. É que o livro não é suficientemente longo. Eu gostaria que houvesse um milhão de páginas ali, porque a) provavelmente eu ainda não teria terminado de ler, e b) ele teria algo a me dizer sobre tudo.
         Eu falei do meu dia em Grind City e das manobras que vinha treinando. Depois entrei em lances normalmente esqueço nas minhas conversas com TH. Falei um pouco de Alicia. Contei como andava a vida da mamãe, e disse que Paula estava sentada onde Steve costuma ficar. TH não tinha muito a dizer sobre isso, mas por algum motivo achei que ele parecia interessado.
               Isso parece loucura? Provavelmente parece, mas eu não ligo. É sério. Quem não conversa com alguém dentro da cabeça? Quem não conversa com Deus, com um bicho de estimação, com um ente querido que morreu, ou talvez apenas consigo mesmo? TH... ele não era eu. Mas era quem eu queria ser, o que faz dele a melhor versão de mim mesmo. Não pode ser uma coisa ruim ter a melhor versão de você mesmo parada ali na parede do quarto, te olhando. Faz você sentir que não pode falhar consigo mesmo.

Em todo caso, só estou dizendo que houve uma época... Talvez tenha sido um dia, talvez alguns dias, eu já não me lembro...em que tudo parecia estar dando certo. E, obviamente, era hora de ir fazer uma cagada geral.

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