Certa noite, em junho de 2007, participei de um jantar em Roma com o padre Antoine
Bodar, um sacerdote holandês que tinha sido recomendado a mim por uma amiga em comum.
Ele me pareceu um homem inspirador, pacífico, intelectual e também bastante cosmopolita. O
restaurante que ele escolheu para nós ficava logo atrás do Vaticano, e enquanto bebericávamos
nosso vinho percebi que eu estava de fato me divertindo naquela noite. A escuridão
aumentava, os edifícios renascentistas foram iluminados e se tornaram quase surreais na sua
majestosa beleza, e então me ocorreu que estávamos sentados num lugar de grande poder: o
Hejaz do cristianismo.
E, ainda assim, como os poderosos decaíram, pensei comigo mesma — mas talvez não
tenham decaído, e sim desvanecido. Enquanto o cristianismo parece estar em declínio nas
terras muçulmanas, o islã ganha espaço em toda a Europa. As igrejas estão se esvaziando,
convertendo-se em apartamentos, escritórios e até casas noturnas, ou então sendo derrubadas,
enquanto as mesquitas parecem brotar do chão. As magníficas catedrais da França estão
desertas; algumas pessoas sugeriram até que pequenas capelas e igrejas abandonadas pelos
fiéis fossem convertidas em mesquitas para dar à cada vez maior comunidade muçulmana
francesa espaço o bastante para orar. Isso seria também uma maneira de distanciar o islã das
garagens e porões, tão difíceis de monitorar, onde os jovens são rapidamente radicalizados.
Enquanto tomávamos café, tentei me imaginar jantando em Meca com um membro do
'ulema, ou com qualquer outro imame, praticamente em qualquer outro lugar do mundo.
Aquilo me pareceu outra demonstração de diferenças fundamentais: islã e cristianismo não
são a mesma coisa.
Expliquei ao padre Bodar o motivo de ter solicitado um encontro com ele. "Não sou cristã e
não estou aqui para lhe pedir que me ajude na conversão", expliquei. "Mas acho que as igrejas
cristãs devem começar a praticar o dawa exatamente como faz o islã. Vocês precisam
concorrer, pois são uma ferramenta poderosa para reverter a islamização. Devem começar
pelas comunidades muçulmanas em Roma. A Europa está avançando feito um sonâmbulo rumo
ao desastre — cultural, político e ideológico —, porque as autoridades da igreja
negligenciaram os guetos de imigrantes.
"As igrejas poderiam entrar nas comunidades islâmicas oferecendo serviços, como fazem
os muçulmanos radicais: construir novas escolas católicas, hospitais e centros comunitários,
tais quais os que desempenharam um papel civilizatório muito importante durante o
colonialismo na África. Não deixem que a questão caia nas mãos apenas dos governos —
assumam um papel ativo. As igrejas contam com os recursos, a autoridade e a motivação para
converter os imigrantes muçulmanos a um estilo de vida mais moderno e crenças mais

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Nômade (Ayaan Hirsi Ali)
De TodoAyaan Hirsi Ali atraiu atenção mundial com o livro de memórias Infiel, que ficou 31 semanas na lista de best-sellers do New York Times e conta sua infância e adolescência na Somália, na Arábia Saudita, na Etiópia e no Quênia sob o rigor do islamismo...