Primeira Mulher Num Baile

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Primeira Mulher Num Baile

Ao chegar da escola Tomás almoçava, e mais tarde ia até o quarto onde estudava, situado na parte de trás da casa.  

Para ir até lá Tomás passava pela cozinha, por uma varanda onde ficava o tanque de lavar roupas e depois por uma plataforma com parapeito, e descia uma escada com lances para cima ou para baixo ao longo de um terreno em descida que vinha lá da frente da casa. Separando a parte da frente, que incluía a varanda e o jardim, havia um portão de madeira verde entreliçada. O terreno em declive lateralmente à casa passava pelo portão verde e prosseguia ao longo da sala, do quarto dos pais de Tomás, do banheiro, da cozinha, da escada, chegava a uma varanda à direita que era como se fosse de uma casa na rua, só que era dentro. Adentrando a varanda havia um cômodo que era uma cozinha desativada, com pia e com torneira que funcionava, que era usado como uma pequena sala de estar, e à direita, no fundo, uma porta dava acesso ao quarto onde Tomás estudava. O quarto tinha uma janela voltada para o terreno em descida. Dentro do quarto, ficando-se de costas para a janela, duas estantes cheias de livros ficavam rente à parede da direita. Na parede da esquerda, colada a ela para cá da porta ficava um sofá. Em frente à janela ficava uma escrivaninha que também era beirando o sofá. Ao longo das duas estantes tinha uma cama de solteiro, de maneira que quem se sentasse à escrivaninha tinha a cama às suas costas. 

Da janela avistava-se também, um pouco mais para baixo, uma construção situada em frente à varanda, onde havia uma despensa, ao lado da despensa um tanque de lavar roupas, depois um banheiro. Mais para baixo era o quintal. 

Tomás fazia a lição de casa na escrivaninha à janela. No sofá ele se sentava quando queria ler. Gostava, dentre outros, de ler os livros da coleção Clássicos Jackson, especialmente História de Heródoto, Ciropedia de Xenofonte, Teatro Grego, Teatro Francês, Ensaístas Ingleses, Selecções de Voltaire, que eram trechos selecionados de Voltaire, contendo a passagem sobre o homem da máscara de ferro, e a passagem sobre o general morto em combate em 3 de agosto de 1645, que foi enterrado perto do campo de batalha, tendo sido gravadas em seu túmulo as palavras: Sta viator; heroem calcas, Pára, caminhante; pisas um herói. Tinha lido um livro que o pai havia comprado para ele, de espionagem, A Guerra Foi Ganha na Suíça. Tinha lido também O Capitao Blood e A Volta do Capitao Blood de Rafael Sabatini. Tomás não havia descoberto ainda Machado de Assis, Hemingway, F. Scott Fitzgerald, Tolstoy e muitos outros.  

Gostava de desenhar também. Naquele tempo havia uma série na televisão que mostrava o dia-a-dia de uma tripulação de um borbardeiro B-29 na Segunda Guerra Mundial. Tomás desenhava de memória o avião do lado de fora e do lado de dentro, e a cabine dos pilotos, o painel, as vistas através das janelas, o setor do navegador, as torres de metralhadoras, todos de diversos ângulos e era uma maneira de também estar lá, um pouco, pelo menos como ele sonhava que era. Encheu um caderno de desenho com esses desenhos a lápis. 

Duas tardes por semana Tomás tinha aulas de educação física, que por uma questão de elaboração de horário haviam sido marcadas para as tardes ao invés de em algum horário durante a manhã no período normal de aulas como era de costume. Era bom voltar à escola de tarde e rever os amigos e os colegas e a escola. Naquele ano algumas vezes à tarde Tomás e os amigos iam jogar futebol num campo de várzea que ficava depois do quartel, a cerca de um quilômetro da escola. Além disso, duas tardes por semana Tomás tinha aulas num curso de inglês na Rua Monte Caseros. 

Tomás não saía à noite, exceto quando ia ao cinema aos domingos. Ia de tarde mas quando voltava, já era noite. Naquele ano eram comuns nos cinemas os faroestes italianos, com cowboys com barba por fazer, friamente irreverentes, que vestiam ponchos e atiravam com rapidez incrível sucessivamente, com farta munição, e era como se o mecanismo do gatilho do revólver tivesse sido limado e polido, e algo tivesse sido feito com o cano, e o acionamento e o tiro saíam macios. A trilha sonora era à base de guitarra elétrica, teclados e instrumentos eletrônicos. Naquele ano passou também Bonnie and Clyde, Ao Mestre Com Carinho, e Barbarella

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