LUA VERMELHA

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Deixe-me recuperar o fôlego... Afinal, são tantas gerações que essas histórias se passaram, existem tantas versões dela... Eu preciso recordar exatamente o que se passou, para que você não saia prejudicado na narrativa.

Perdoe-me por sair do contexto que eu quero lhe contar, mas olhe para esta lua no céu. Ela não é bela? Quando você a olha, o que vê? Uma lua avermelhada?

Bem, eu lhe digo o que vejo... Vejo uma lua vermelha, sangrenta, chamada assim, pois é nesse tipo de noite, são nas noites que esse tipo de lua está aí, que as guardiãs... Ou as ex-guardiãs são escolhidas... E às vezes mortas. Simples assim.

Assim também aconteceu com a rainha Roxana, filha do ferreiro. Dois anos haviam se passado, desde que ela pegara a gema azul, colocando-a no cabo da espada. Seu filho acompanhava a mãe, com certo temor, pois ele não reconhecia a jovem, que antes tinha o brilho tão infantil quanto o seu no olhar. Depois que o casal de comerciantes havia partido, era como se tivessem levado junto, o lado jovem da rainha.

Ela ainda continuava a brincar com o filho, ainda o repreendia por correr pelos corredores – embora também o fizesse – cavalgava com o marido, disputando corridas, dançava enquanto ria com o esposo... Mas algo faltava na doce alma da rainha. Ela amadurecera, a um ponto que não era tão ela, quanto antes.

E apenas ele, seu filho, percebia. Apenas ele.

Xanos começou a ter um cuidado todo especial com a mãe, desde a partida dos comerciantes. Ele participava de boa parte da vida da rainha, que, parecia estar desapegando-se das coisas que conhecia e gostava.

Certa manhã, a rainha estava sentada, enquanto abraçava e beijava seu filho. Os longos cabelos negros estavam presos em uma trança que terminava pouco depois do quadril. Como nos dias que ficava em sua pequena forja, ela usava vestes masculinas, porém, naquele momento, as roupas eram mais elegantes: calças marrons, uma camisa azul escura e um colete de veludo verde, sem o costumeiro avental.

O menino, agora com oito anos, já começava a dar os sinais de abandonar a infância. Vergonha pela demonstração do afeto materno, os modos ligeiramente retraídos, de quem estava vigilante, já sobressaíam sobre a frivolidade juvenil.

Do nada, Roxana ergueu a cabeça, parecendo muito alerta. Por vários minutos ficou daquele jeito, então apertou seu filho com mais força, colocou seu rosto na curva do ombro do filho... Quando ergueu a face, lágrimas escorriam por ela. Beijou seu filho e mais uma vez, o menino teve o mesmo sobressalto, da passagem dos comerciantes.

As brincadeiras com a mãe cessaram, quando um dos incontáveis tutores, veio busca-lo para mais uma aula. Nesta ocasião, o menino até tentou permanecer ao lado dela, não conseguindo.

Após o término da lição, correu até a mãe, que estava na ferraria, enquanto buscava freneticamente algo que não quis revelar ao pequeno. Ao deitar-se na cama, aquela noite, a rainha teve por companhia o filho, já que seu marido estava fora, em uma pequena expedição diplomática.

Fosse rainha ou ferreira, seu modo simples de agir e pensar sempre se mesclavam às atitudes da pessoa Roxana. Com frequência, ela estava na cozinha, provando algum cozido, sabendo o nome de todos que ali trabalhavam. Ela pegou suprimentos para uma viagem de alguns dias e saiu sem informar a quem quer que fosse, seu destino.

Xanos acordara pouco depois da mãe, seguindo-a, a pouca distância. Se ela fosse uma guerreira, o menino teria sido descoberto imediatamente. Se estivesse atenta ao que acontecia a seu redor, a mesma coisa. Porém, a rainha estava tão preocupada, que não percebeu estar sendo seguida.

O menino usou naquela perseguição, tudo o que aprendera até então... Roxana apenas desmontou do cavalo, no pôr do sol. A rainha habituada a sair em longas cavalgadas com seu esposo, não hesitou em fazer o caminho que, embora estivesse trilhando pela primeira vez lhe era conhecido. Entrou em uma mata espessa, seguida pelo filho.

Xanos quis várias vezes, engolir o orgulho e chamar pela mãe, que ao entrar na mata, havia desembainhado a espada, segurando-a firme. Na outra, ela tinha as rédeas do cavalo, que a havia levado até ali. A curiosidade, de ver aonde a mãe ia, com aquele ar tão preocupado, porém, era maior. A claridade do dia, já era quase finda, quando Roxana parou de caminhar, chegando a uma pequena clareira... Não sendo a única.

Três pessoas a quem ela nunca havia visto, chegaram junto com ela, no mesmo instante, vindas de direções totalmente distintas. E quando as quatro mulheres ali reunidas se encararam, uma forte névoa começou a espalhar-se mata afora. A lua vermelha brilhou com intensidade... E do nada, uma grande fogueira acendeu-se no meio daquela clareira...

Assim... Estalo meus velhos dedos, para demonstrar a você, meu amigo, como foi que a fogueira num instante não estava lá. E no estalar de dedos tão velhos como os meus... Ela estava lá, grande o suficiente para dar certeza a essas mulheres que estavam no lugar certo...

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⏰ Última atualização: Sep 08, 2016 ⏰

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