Encomodo: o Exame, Cento e Cinquenta Miligramas e uma Ambulancia.

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   A ESPERA DO EXAME

   - É folha verde/verde como grama/Grama não pisada/Aonde a joaninha anda/É trevo de quatro folhas/É lírio feliz/Igual teu sorriso/Que eu sempre quis.
   - fofo.
   - Só fofo?
   - Eu acho muito fofo. Vou até beijar você.
   - Beijo e elogio, ótima combinação. Parece cansada.
   - Eu estou cansada. E não tenho conseguido dormir.
   - O médico diagnosticou o motivo?
   - Não. Eu mencionei os dois meses do início das dores e como elas se intensificaram essa semana. E você? notícias sobre o concurso.
   - O organizador disse que estou entre os favoritos . Mas me pediu para manter cabeça no lugar e ler bastante dos grandes poetas mestres.
   - E você está lendo, certo?
   -  Claro. Sempre.
   - Eu tenho o namorado mais inteligente e dedicado. E com um bumbum lindo.
   - Acha mesmo?
   - Sim. Da vontade de morder seu Bumbum.
   - Estou falando de ser dedicado.
   - Eu, sua mãe e seus amigos pensam o mesmo. E é verdade Wesley.
   - Vamos no centro Sophia?
   - Não posso. Ficou feliz em ver você e obrigado por vir e ser paciente. Mas não estou com clima para sair.
   - Sinto falta de você.
   - Eu também.

   Esperar sempre é necessário. Porém, nem sempre agradável. Esperar o resultado de exames médicos não é agradável. Esperar sua namorada melhorar para saírem novamente não é agradável. Esperar compreensão de seu namorado não é agradável. Esperar por  noite uma bem dormida não é agradável.

   CENTO E CINQÜENTA MILIGRAMAS AO DIA

   - É apenas para ver como você reagirá ao medicamento filha.
   - Eu sei. As dores diminuíram. Mas seria bom se sumissem de vez. Eu me sinto horrível mãe. Me sinto inchada.
   - Calma Sophia. Vem aqui. Está tudo bem minha filha. Logo você estará sentindo-se melhor.
   - Eu não agüento mais ficar presa em casa. Eu não saio mais com o Wesley. Não ajudo a senhora no salão. Eu me sinto horrível.
   - Filha, lembra da explicação dada pelo médico?
   - Sim. Quando eu me sentir assim devo lembrar "é um dos sintomas associados a doença."
   - E qual será uma das funções do medicamento?
   - Reduzir a ansiedade.
   - Tudo vai se resolver. E sobre o trabalho no salão, essa semana a Bruna irá me ajudar.Eu não quero uma filha empregada. Eu quero uma filha saudável. Agora vamos nos concentrar nas coisas que você consegue fazer.
   - Tudo bem.
   - Leva o lixo para fora?

   Tomar remédio é como sexo casual. Apreciamos muito o bom efeito. Mas não queremos envolvimento romântico ou relacionamento de longa duração.  No sexo casual quando a relação passa de envolvimento emocional para uma relação duradoura os resultados não são agradáveis. Quando entramos em uma relação  duradoura com medicamentos os resultados desagradáveis também surgem. Aumento de peso é um deles.

   - Namorada, quantas vezes  você toma o medicamento por dia?
   - 150mg ao dia dividido em duas doses.
   - É só para as dores?
   - Principalmente para a minha fibromialgia. E também para controle de ansiedade, o meu cansaço e as alterações do sono.
    - E como estão as coisas?
   - Tirando a dor de cabeça? Está indo.

   Tirando a dor de cabeça. Aumento de peso. Inflamação na garganta. Irritabilidade. Momentos de visão turva e diminuição de interesse por...

   - Não Wesley, eu não estou a fim.
   - São as dores?
   - Não. Apenas não estou com vontade.
   - Tudo bem. Esquece.
   - Não fica bravo não. Lê
Para mim.
   - Está bem.
   - Eu tenho o melhor namorado do mundo. Ei namorado poeta, além do concurso, agora quatro meses próximo, qual o seu sonho de poeta?
   - Bem... Não quero parecer fúnebre... Mas se por um grande acaso eu morre-se...
   - Ai! Que conversa horrível!
   - Deixa pra lá.
    - Me desculpe. Pode continuar.
    - Se por um grande acaso eu morre-se eu gostaria de já ter tido um livro solo.
   - Lindo e sinistro ao mesmo tempo. Agora leitura.
   - Sabor de beijo/Gostinho de queijo/Paixão de brigadeiro/Bolinho de desejo/Cheiro de baunilha/Lindo pé de moça/Seus lábios me dão/Água na boca.

   AMBULÂNCIA

   - Você está bem Sophia querida?
   - Ainda enjoada. Eu deveria vomitar logo. Quem sabe esse mal-estar passasse.. Eu odeio isso! Odeio! Odeio esse zumbido no ouvido.
   - Vou retirar o seu prato querida.
   - Vou deitar.
    - O Wesley vem hoje aqui? Quer que eu fale que você não está bem?
   - Não. Tudo bem. Ele pode ficar um pouco se a senhora permitir.

   Não estou apenas me sentindo horrível fisicamente. Estou sendo uma namorada horrível. Meu tempo tem sido gasto não apenas com noites miseravelmente dormidas. Ou falta de interesse em atividades antes tão essenciais. Pareço ser agora uma voluntária de testes para medicamentos. Já estou no terceiro. Transitando entre os novos efeitos colaterais e os efeitos da interrupção do tratamento anterior.

   - E a dosagem?
   - iniciei esse com 6mg ao dia. Agora aumentou para 30mg.
   - Sua mãe disse que você está bastante aborrecida.
   - Só acho isso um saco.
   - Ela disse algo sobre ser melhor ir para o hospital por estar doente do que por causa de drogas. Eu não entendi muito bem. Mas como eu estava louco para te ver não quis prolongar o assunto.
   - Ontem um ambulância parou em frente a casa ao lado. Levou nossa vizinha Andreza ou Vanessa.
   - E qual o motivo de sua mãe citar drogas? A mulher teve overdose?
   - Não sei. Não falamos com ela. Sentimos um cheiro estranho vinda da casa. Como mato queimando. Minha mãe acha que é maconha.
   -  Então não foi overdose. Não me recordo de nenhum caso de overdose por maconha. Seu cabelo está macio.
   - Meu cabelo está horrível. Mas é bom ficar deitada aqui sentindo você mexer nele. Falta só um mês para o concurso. Eu sei, você vai ganhar. Lê pra mim antes de você ir.
   - Flocos de neve/Brancos de gelo/Pó de diamante/Caídos do céu/Abro minha boca/Tocam minha linda/Desmancham como Ostia/Açúcares de Noel.

   Você já deve ter parado e pensado: "Eu queria que nunca acabasse", ou "Eu poderia gravar e ver quantas vezes eu quisesse." Ali deitada na cama, mesmo não estando bem, Wesley lendo enquanto me fazia um cafuné era um desses momentos.
   Mais tarde naquela noite ouvi um barulho de carro na rua. Ouvi uma porta bater e o barulho de passos pelo corredor da casa ao lado. Pouco depois ouvi um choro baixo. Abrir bem devagar a minha janela. E o cheiro de mato queimado entrou.

Luiggi steffan

A Garota Que Queimava Poemas.Where stories live. Discover now