Primeiro Conto

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Acordei com a ressaca moral batendo e umas mnsagem de S. desesperadas quais eu não estava conseguindo entender:
"Eu não sei o que fazer"
"Já era, ela morreu, ela me abandonou."
Eu não sabia o que dizer, o que pensar, como agir e a história estava passando no jornal:

"MENINA MORTA É ENCONTRADA NO BANHEIRO DA ESCOLA"

O que aconteceu eu não sabia dizer por causa da minha mente bagunçada talvez pelo porre e pelas drogas da noite anterior ou talvez porque era muito pra mim, mas meu corpo respondia antes da minha mente, vi minha visão turva por conta das lágrimas que eu não percebi que caiam, estava suando frio e sentindo um vazio enorme, o que era aquilo?
Eu sabia que corria esse risco, eu sabia que poderia acontecer a qualquer momento, ela sempre me disse que estava criando coragem e parece que finalmente a coragem que ela tanto queria veio a tona.
P. estava morta e o pior, morta por suas próprias mãos.

Vamos do começo, sempre a via em festas que ia com meus amigos e éramos da mesma escola, ela do primeiro, eu do terceiro, mas só nos conhecemos mesmo no shopping e já criamos uma amizade, forte demais para evitar, mesmo que eu tentasse, percebi que ela jogava e jogava bem, talvez a única pessoa que soube jogar e eu me peguei viciado naquela menina, naqueles joguinhos, conversávamos todos os dias, passávamos noites acordados para conversar e então teve uma festa, ficamos, foi um tanto curioso, eu a conhecia bem e não poderia me entregar, a afastei por fim, mas ela precisava de mim, eu cuidava dela e eu sentia que conseguia ajudá-la, era de fato uma menina problemática, depressão, anorexia, inclusive seu slogan era "eu não tenho anorexia, eu sou a anorexia", quando ela dizia isso todos riam e só eu sabia o quanto aquilo era verdade e o quanto significava para ela, mesmo que ela fosse gostosa e bem magra, ela se queixava sempre de seu peso, era bobagem mas bom, quase todos os problemas dos quais ela reclamava tanto eram bobos, mas eu não diria isso a ela jamais, eu passei a amá-la e ela me amava também, era uma grande aventura que eu curtia, mas depois de tanto tempo nos afastamos, não dava mais para mim e mesmo que ela precisasse de mim, eu não poderia continuar cuidando dela, e mesmo a afastando, eu ainda me preocupava.
S

oube que ela estava mudando, não sei dizer se pra melhor, mas sei que durante essa mudança ela criou uma coragem da qual eu tinha medo.

Quando me dei conta do que tinha acontecido, procurei S. ela precisava de mim, sua melhor amiga havia se matado e eu teria que lidar com minha dor sozinho, existia alguém precisando de cuidado mais que eu mesmo, então cuidei dela, os primeiros dias foram difíceis, quando todos ainda estavam tentando entender, nosso grupo de amigos estava acabado e todos se culpavam, claro que éramos culpados, ela mandava os seus sinais e ninguém sequer tentava perceber e eu era o maior culpado, mas não demonstraria tristeza, não iria deixar transparecer tudo o que se passava dentro de mim e por algumas vezes durante o primeiro mês, me pegava pensando que aquilo era um jogo dela, que ela apareceria depois de 6 meses e falaria que teve o que quis e eu ansiava que aquilo fosse verdade, não tê-la mais, não vê-la mais era algo bizarro e então se passaram dois meses, a dor não estava mais forte, todos tinham voltado para suas rotinas normais.

Um fim de semana todos foram para uma festa, ficamos loucos e enquanto eu dançava vi uma menina de vestido vermelho, cabelos vermelhos e um lindo sorriso, era ela? Não, é impossível que seja, todos a vimos no caixão, a saudade já estava ficando fraca, deveria ser alguma brincadeira do meu cérebro por causa do álcool para reativar aquele turbilhão de sentimentos, continuei dançando, chamaram a polícia, todos correram e então vi a menina novamente, mas na frente da minha casa.
-Olá, espero que tenha sentido saudades, pois eu sinto, ainda não é seguro eu voltar para seu mundo, meu bem, um dia te explicarei tudo, mas por essa noite posso dormir aqui com você?
Ela dizia sorrindo, como se tivesse o controle de tudo, ela passava segurança mesmo me dizendo que não era nada seguro e eu concordava, ela podia passar a noite comigo, ela poderia fazer o que quisesse de mim desde que não me deixasse novamente e então toda noite ela dormia em meus braços e sussurrava sete letras, três palavras sempre um pouco antes que eu pegasse no sono e eu acordava feliz e aquela felicidade durava um segundo, ela não estava mais lá, mas uma taça de vinho e um leve cheiro de cigarro ficava em meu quarto, duvidei de mim mesmo, de que eu fosse sonâmbulo ou coisa assim, meus pais fizeram perguntas por causa do cheiro até que se acostumaram, mas eu não conseguia me acostumar, sempre que ela dormia comigo eu acordava querendo que ela estivesse mesmo lá.
Ela chegava em meu quarto, noite apos noite, vestindo vestidos deslumbrantes, lindos, todos vermelhos e saltos, às vezes preto, outras vezes branco ou vermelho sangue, com algum perfume doce novo que combinava bastante com ela e vários colares, mas sempre com o mesmo anel, o anel que sua mãe havia lhe dado.

Depois de algumas semanas, passei a esperá-la, arrumava tudo para tê-la lá comigo, cheguei até a deixar uma taça de vinho, para que ela não precisasse buscar até que um dia ela não apareceu, depois de 10 meses de visitas, ela faltou um dia e aquele dia foi tão vazio, ficava me perguntando se minha mente finalmente tinha deixado aquilo pra lá e aquele fantasma não existisse mais, mas não deixei de esperá-la todas as noites durante seis semanas até que uma noite ela apareceu e como se nada tivesse acontecido disse seu monólogo de sempre, eu nunca respondia ou perguntava algo, aquele sorriso tinha controle sobre mim, mesmo que ela fosse um fantasma ou fruto da minha imaginação, ela tinha um puta controle sobre mim que me deixava sem dúvidas e só fazia com que eu quisesse ela em meus braços nas noites frias, mas naquela noite eu perguntei, perguntei porque ela não tinha me visitado e a resposta dela foi um beijo.
-Agora é seguro, meu bem maior e eu lhe devo uma explicação.
Ela dessa vez não dormiu comigo, quando se foi eu caí no sono assim que ouvi o barulho do salto dela começando a descer a escada, como se por mágica ela pudesse controlar todos os meus sentidos, até quando eu devia dormir, sempre soube que ela era mimada e que conseguia o que quisesse, mas era diferente comigo, eu não a deixava ter tudo, mesmo que a manipulação fosse boa, eu sabia as regras daquele jogo, eu ensinei a ela aquele jogo.

Acordei e fiz minha rotina diária, de noite peguei o vinho tinto e a carteira de Malboro Vermelho e deixei para a disposição dela, mas o que recebi foi meu irmão me chamando:
-Uma menina deixou isso aqui, ela se parecia muito com aquela amiga sua que faleceu, deve ser uma irmã ou algo assim, bom, parece ser importante.
Ele me entregou um envelope, fiquei com medo ao início para abri-lo, mas abri.
"Olá, sei que deve estar se perguntando se estou viva ou não, aqui está sua resposta, estou sim, carne e osso e todas as minhas visitas foram reais, devo-lhe uma explicação, mas ainda não é a hora certa para tal coisa, só espero que você entenda, fiz o que fiz para proteger todos vocês, eu no mundo de vocês ameaço a existência de todos, então precisei fugir até que tudo estivesse seguro e agora finalmente posso voltar. -P."

Era ela?Onde histórias criam vida. Descubra agora