Capítulo 6

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O frio na barriga ainda surgia a cada vez que eu entrava naquela sala frequentada há mais de um ano, embora eu já me sentisse mais à vontade ali. Apesar de ainda ir lá por ser obrigado, consegui superar o meu ódio pelas visitas semanais. As paredes verde-água, o pequeno pinheiro ao lado da janela e a orquídea branca em cima da mesa davam um ar sereno e tranquilo ao local.

Inicialmente o que eu mais odiava naquele lugar era o Mark, pois ele me obrigava a falar coisas que eu não queria ou contava aos meus pais que eu não estava cooperando na terapia, o que me rendia um longo sermão. Não que isso tivesse mudado, mas embora eu não admitisse, passei a gostar dele.

— Oi — cumprimentei sem vontade enquanto sentava no sofá confortável.

— Nem vou perguntar se você está bem... Por que você está cansado?

— As aulas começaram. — A resposta sucinta era explicação suficiente para ele.

— Imagino que o problema do começo das aulas não se resuma ao excesso de atividades escolares.

— Você é um cara esperto, não é à toa que tem um diploma de Oxford — alfinetei, apontando para o diploma pendurado na parede atrás da mesa.

— Está tendo pesadelos? — indagou, ignorando o meu sarcasmo.

— Estou, mas eles estão mais vívidos e dessa vez se recusam a ir embora. — Um suspiro involuntário demonstrou a minha frustração. — Eu não consigo dormir.

— Você tem tomado os remédios que o psiquiatra prescreveu?

— É claro que sim! Você acha que isso acontece porque eu sou descuidado?!

— Não, Augusto, mas eu precisava perguntar. — Sua voz não demonstrava abalo com a minha explosão. Todo aquele autocontrole do Mark às vezes me irritava. — Tem alguma coisa diferente acontecendo na sua vida? Algo que possa estar te deixando mais ansioso do que o normal?

Na minha mente se formou a imagem de olhos verdes gozadores, mas eu não queria falar sobre a ruiva, então dei uma resposta negativa. Mark me olhou como se não acreditasse muito em mim, mas daquela vez não insistiu.

— Você escreveu o que eu pedi?

— Escrevi.

— Posso ver? — Ele arqueou uma sobrancelha ao perceber que eu não mostraria.

Sem opção, retirei o caderno da mochila e entreguei a ele. Depois mantive a cabeça baixa enquanto ele lia o que eu havia escrito sobre os meus sucessos e fracassos ao longo da semana.

O resto da sessão se passou com muitas perguntas por parte dele e muitas respostas evasivas da minha parte.

***

— Você pode estar na minha casa amanhã às duas? — perguntei à Jennifer na sexta.

— Por que na sua casa e não na minha?

— Porque é você quem precisa de aulas, e não eu.

— Uau! Depois dessa, tudo bem, eu vou. — Ela ergueu as mãos em sinal de rendição.

— Não se preocupe, Jenny, o Augusto é inofensivo. Você não precisa ter medo de ir na casa dele — Michael afirmou, exibindo um sorriso debochado, que eu ignorei porque estava muito ocupado me perguntando desde quando ele a chamava de Jenny.

— Eu não tenho medo dele, só do mau humor dele. — Todos riram do comentário.

***

Já estava amanhecendo quando eu consegui dormir. Horas depois, os latidos da Sammy me despertaram de um sono profundo, e eu a vi brincando com os meus pais, que a faziam de boba enquanto tentava pegar a bola. Após um rápido banho, me juntei a eles. Mais tarde, decidimos almoçar no conservatório, cômodo relativamente comum nas casas inglesas. Por ser praticamente todo feito de vidro, ele nos permite aproveitar o sol e admirar o jardim sem passar frio.

Recomeço (Amostra)Onde histórias criam vida. Descubra agora