Quando ela devolveu a garrafa à mesa e, muito alegre, começou a dançar em minha direção com os braços abertos, compreendi que já estava na hora das preliminares. Nós nos abraçamos e nos envolvemos num cálido beijo com sabor de chiclete de menta – este culpa minha –, saliva e álcool. Confesso que aquela forma indireta de provar a bebida provocou-me o mesmo nojo que, provavelmente, sentiria caso tivesse tomado direto da garrafa. Mas suportei o enjoo e o asco daquele sabor doentio, pois queria muito beijar uma mulher, e não desperdiçaria aquela oportunidade. Sinceramente, não é nada fácil para ratos de livro como eu conseguirem uma relação desse tipo, completamente carnal, com uma mulher de verdade. Acho que porque elas procuram homens mais físicos e menos mentais.
O abraço foi quente e pude apalpá-la onde bem entendi. Ela não ofereceu nenhuma objeção à curiosidade das minhas mãos e, logo, era como se conhecesse todo o seu corpo; mesmo sem tê-lo visto ainda.
Ela também me tocou em lugares importantes, devo dizer, e, logo, senti que poderíamos dividir, sozinhos naquela pequena suíte de luxo, algo mais do que uma simples brincadeira de carnes e fluidos.
Quando, ainda de pé, terminamos o longo e gostoso beijo, e nos entretínhamos, brincando de dar beijos curtos e barulhentos na boca e em várias partes do rosto e do pescoço, senti que vivíamos um momento de especial comunhão, em que, com sorte, um poderia se abrir para o outro e, quem sabe, aquela relação puramente carnal e momentânea poderia evoluir para algo mais sólido, sincero, e, por que não, duradouro.
Certamente, haveríamos de ter algo em comum.
Perguntei a ela se já havia lido Melville, Milton ou Dante. Sua resposta, para minha absoluta decepção, foi uma negativa e um atestado de sua completa alienação cultural.
"Não", ela disse, "Em que canal passam?"
"Canal?" Precisei de um momento para processar o termo, desabituado como estava a ligar a televisão ou o rádio. Expliquei direito, esclarecendo que queria saber se ela "lia" alguma coisa, e não se assistia. Aquela beleza de olhos azuis me disse que sim. Ela lia bastante, e seu campo de interesse era surpreendentemente amplo.
Gostava de ler sobre as celebridades da televisão, fofocas sobre o que iria acontecer nos próximos capítulos das três ou quatro novelas que acompanhava; também lia astrologia, moda e beleza. Também se interessava por arte. Frequentava regularmente os cabeleireiros mais chiques da cidade e conhecia as melhores manicures e pedicures que uma mulher inteligente poderia querer.
Decepcionado com tal resposta, eu me perguntei que tipo de vida esta garota levava. Mas, então, me dei conta de que era assim que vivia a maior parte das pessoas no mundo, especialmente os jovens. O mundo para elas era pequeno, muito pequeno, limitado às distrações do dia-a-dia e aos prazeres do momento. Era uma vida vazia e sem sentido, e eu não via propósito algum numa existência como aquela.
Meu mundo, comparado ao dela e ao da maioria das pessoas vazias da Terra, era incomparavelmente maior e mais rico. Eu não era nenhum cientista genial, nem um ricaço que podia fazer tudo o que quisesse, ir aonde bem entendesse ou mudar o que me apetecesse no mundo. Não, mas eu "lia", e lia muito. E isso, para mim, fazia toda a diferença no tipo de pessoa que eu era.
Mas aquela garota não estava interessada nessas questões existenciais. Não. Ela queria apenas curtir a vida, se divertir sem pensar em nada. Os problemas, para ela, provavelmente resolviam-se sozinhos. Não havia porque se preocupar. Não havia porque ler. Não havia porque pensar. O que ela queria era ir logo pra cama.
Vendo que o único evento importante da noite se daria mesmo na cama e, não como eu gostaria, em nossas mentes e nossos corações, decidi desistir de qualquer pretensão mais ambiciosa que tivesse para aquele encontro. Se era apenas aquilo, pois que assim fosse, oras. O que mais um rapaz jovem e saudável como eu era poderia querer?
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A GAROTA VAZIA
Short StoryEra para ser uma noite de amor e descobertas na pequena suíte daquele motel de luxo. Seria minha primeira vez, e a garota era simplesmente linda. Mas, depois de tirar a roupa e as peças íntimas, ela tirou também o cabelo, os olhos, a pele... e não p...