O meu maior medo era encarar a morte, e era exatamente o que estava acontecendo, eu acho. Minha força vital já havia sumido há muito tempo, um silêncio pairava sob o ar, mas estava totalmente perdido, não sabia o que fazer. Aos poucos minha visão estava voltando, ainda só enxergo borrões, mas não consigo movimentar nenhum dos meus músculos. Meu corpo tremulava, sentia minha pele queimar e meus ossos enrijecerem aos poucos, vozes e vultos passavam por mim há todo momento, mas mesmo forçando a visão não conseguia distinguir as silhuetas.
"- Isso pode ajudar!" – Disse uma voz suave e animada.
Um líquido adocicado escorreu sob meus lábios, engoli com força e logo meu corpo todo começou a formigar e junto meus sentidos começaram se reabilitar. Minha visão voltou, seguindo os outros sentidos, meu peito inflou de forma que parecia que iria explodir. Eu estava deitado em uma cama macia, toda feita de grama, um forte ardume percorria meu braço direito, um desenho verde ia se ajustando do modo em que eu olhava, um triângulo de ponta cabeça com um risco na parte superior, fiquei sem entender. Comecei olhar ao meu redor, ao meu lado um criado mudo repleto de frascos e potes, e mais ao lado uma garota morena com flores trançadas no cabelo, vestido cor creme até os joelhos e várias pulseiras e colares feitos de folhas.
" - Olá?" – Tentei dizer algo mais, mas foi só o que saiu.
" - Olá!" – Disse ela e um tom doce e amigável. - "Como está se sentindo?"
Pisquei algumas vezes e percebi que ela não era morena, e sim parecia ser formada de terra, poeira.
" - Estou meio zonzo, fora isso tudo bem!"
" - É normal os escolhidos se sentirem assim, faz parte da transformação."
" - Ahm, que transformação? Escolhido? Quem é você?"
Tentei me levantar mas senti uma tontura novamente, a angústia começava a percorrer meu corpo e eu não tinha ideia de onde estava, nem como faria para sair dali.
" - Sou uma Epigéia, uma ninfa da terra, me chamo Halo, mas calma, você está muito confuso. Você está no Vale da Terra, hmmm... local patrono dos elementais da terra, os mesmos que o escolheram como representante Elemental e que lhe deram este lindo colar." – Disse a mulher-terra com um sorriso arqueado.
Olhei para meu peito, um cristal translúcido como o da caverna estava envolvido em uma tira de couro. Eu nem senti que estava ali, chequei a pedra, ela possuía vários sulcos e declinações.
" - Você foi escolhido para representar o elemento terra. Estamos em uma dimensão modificada, depois da grande batalha os elementais da natureza a criaram em forma de estabelecer maior paz e segurança á todos. Você sofreu algumas alterações durante sua viajem para cá, é normal, acontece com todos os outros escolhidos, pois a forma de tempo aqui não é igual a de onde você morava." – Disse ela com entusiasmo.
Fiquei em silêncio e tentei conciliar os pontos, mas cada vez que eu pensava, mais confuso ficava. Apesar de tudo ser complicado de mais, não me era estranho, parecia que eu já estive ali, não naquele aposento, mas no mesmo ambiente.
" - Mas eu não quero. Para. Isso aí nem existe! " – Exclamei com certa ignorância.
" - Tente dormir um pouco, você ainda não está bem para tomar decisões!" – Disse a mulher-terra já se sentando.
" - Eu nunca estou bem para tomar decisões, nunca estarei!" – Cochichei para mim mesmo.
A cama era superconfortável, era fácil cair no sono. Toquei no pingente que carregava no pescoço, ele era lindo. Dormi segurando o cristal, flashes de luz e insights atacavam minha mente, um sonho mais que estranho, a retrospectiva do meu dia se passava pelos meus olhos. Eu estava torcendo para que tudo aquilo fosse mentira, que tudo não se passasse de um mero pesadelo. Acordei ofegante, desta vez não tão espantado com tudo em minha volta. A mulher-terra estava lá sentada ainda, ela olhava com um leve sorriso no rosto, parecia uma estátua, nem sequer piscava.
" - Aí, até que enfim! Não aguentava mais ficar aqui parada te olhando" – Falou com aspereza. - Olhei com indiferença, mas ela sequer ligou.
" - Agora que acordou pode tentar se alimentar, e trate de se recuperar logo, existe muito trabalho a fazer!" – Virou as costas e saiu do quarto.
Uma bandeja de madeira estava delicadamente posta sob uma mesa ao lado da cama, leite, torradas e frutas diversas, estava com uma cara ótima. Apanhei uma torrada e logo comecei a comer, estava tudo muito bom e consegui devorar tudo. Sacudi os farelos que caíram sob meu colo e me sentei de frete a janela, conversas e ganidos ecoavam por ela. Eu estava muito fraco para levantar ainda, mas consegui apoiar meus pés no chão, estava úmido, era terra batida. A decoração era toda rústica e totalmente agradável, a cama realmente feita de grama, esfreguei as mãos no rosto tentando despertar. Tomei o cristal nas mãos novamente e o observei melhor, ele transparecia uma aura azulada que tomava todo meu corpo. A mulher-terra apareceu novamente na porta com seu largo sorriso no rosto, entrou juntamente com um homenzinho de pouco mais de 40 centímetros levando um chapéu pontudo sob a cabeça.
" - Olá jovem garoto!" – Disse o pequeno homem com uma voz entonada. Tentei esboçar um sorriso, mas ainda estava dolorido.
" - O que está acontecendo aqui? Eu não estou entendendo!" – Falei rapidamente
O homenzinho se aproximou e com um ar misterioso começou a falar:
" - Calma, muita calma meu jovem. É normal você se sentir perdido, mas logo tudo irá se encaixar! Você está no Vale da Terra, moradia dos elementais da Terra e agora também seus elementais regentes! Você foi selecionado por sua grande força de espírito..."
" - Selecionado para quê? " – Interrompi.
Com grande paciência o homenzinho retomou: " - Os tempos não andam nada fáceis, a cada dia os seres da sua espécie se tornam muito ambiciosos e são facilmente levados para as trevas, onde são enganados e impregnados de ódio! O poder dos elementais está se enfraquecendo por conta da onda de destruição criada pelos seus similares, somente um da sua espécie pode apaziguar novamente os nossos mundos, principalmente você!"
Suspirei, fechei os olhos e mentalizei: " - Isto não está acontecendo, isto não está acontecendo, isto não está acontecen.... AAAAU!"
O velhinho havia me beliscado e me olhava com cara de contentamento, como se estivesse feliz por me fazer sentir dor.
"- Sim, isto é real, isto está acontecendo e se você continuar com a mente fechada não vai ajudar muito!"
Logo saiu do quarto e fiquei ali em transe, a garota-terra ainda me fitava com olhar curioso, tentei não retribuir o olhar. Forcei os pés no chão, estava descalço, empurrei os braços sob a cama para tentar pegar embalo e consegui ficar em pé. Meus braços ardiam, como se brasas estivessem corroendo minha pele, olhei para o braço direito e enxerguei um triângulo verde e com um risco em sua base, toquei a pele que ainda estava avermelhada e em relevo, era uma tatuagem, e havia sido feita recentemente.
" - O que é isto? " – Perguntei para a mulher-terra.
" - O que? Ahhh! Isto?! É uma marca elemental, foi feita assim que você passou pelo portal. É linda, não é mesmo?! Igual a do Vitor!" – Disse a garota da forma mais normal do mundo. – Posso tocar?
Senti minhas orelhas esquentando, não haviam motivos, mas aquilo me deixou constrangido.
" – Ah, é...pode! " – Disse com as mãos no cabelo para disfarçar. Logo seus dedos formados por terra cerraram meu braço, Assim que ela tocou o símbolo brotos nasceram sob sua pele, ela ficou maravilhada e eu sem reação.
" - Incrível! Você é o escolhido! Sangue elemental corre em suas veias! " – O brilho dos seus olhos era tão grande que pareciam micro-holofotes. Sorri em resposta, não sabia o que significava, ainda, mas não deveria ser tão ruim!
Um silêncio ecoou pelo quarto, mas logo tornei a retirar minhas dúvidas." - Mas e aí, que é esse tal de Vitor? " Perguntei.
Ela me estrangulou com o olhar, aquilo parecia lhe incomodar, mas logo começou a falar:
" - Vitor foi um dos nossos primeiros selecionados, ele sempre foi exemplo para todos daqui, leal, responsável, destemido e exalava carisma. Mas o mimamos de mais, achamos que ele seria a nossa ponte entre os dois mundos, até que o poder lhe subiu à cabeça e ele resolveu que tudo lhe pertencia, Vitor queria ser deus. Desde então não foi mais visto por nenhum ser elemental, mas há boatos de que ele está montando um forte plano para derrubar tudo e todos." - O rosto da mulher-terra estava afundado em tristeza, como se dizer tudo aquilo lhe doesse de alguma forma.
YOU ARE READING
A CAVERNA DOS CRISTAIS | Os Elementais - Livro 1
FantasyA perda de um ente querido é muito dolorida, ainda mais quando você perde sua mãe e suas memórias parecem terem sido apagadas. Pedro vive com o pai em um hotel em Visconde de Mauá no Maringá, filho único e com amizades que duram apenas o período de...