Lucy

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O Sol forte clareava o cômodo bagunçado, paredes brancas cheias de rabiscos de ódio, roupas limpas e sujas espalhadas pelo chão, uma guitarra em um canto algumas garrafas de whisky e vodka ao lado da cama e uma grande dor de cabeça. Esse era o ambiente em que ela acordara nessa manhã.

Lucy era o nome da garota que acordava naquele estado lamentável, um nome tão doce para uma garota que se tornou tão amarga depois de tudo que passou. O sonho de se tornar médica ficou apenas no sonho e na ingestão de medicamentos tarja preta, que misturava com bebida. Não demoraria até que seu corpo não aguentasse mais tudo aquilo, já que sua mente tinha desistido de continuar há muito tempo. A única coisa que ela não havia feito ainda era vender seu corpo, porque o resto já havia sido consumido há muito tempo.

Suas antigas fotos haviam sido rasgadas, por ela mesma, na última briga que teve dentro de casa, o que constantemente vinha acontecendo. Ela até teve um namorado, mas no final das contas ele só serviu para terminar de arrancar os últimos pedaços que restavam de seu coração. Ele tinha sido um bom namorado antes de acabar com o resto de sentimentos que Lucy tinha, ele era o único a arrancar um sorriso seu, o único que a fazia sentir bem e foi exatamente isso que mais a machucou ele ser tão perfeito e mesmo assim não poupou esforços para humilhá-la perante todos.

O cheiro do café que entrava por debaixo da porta trancada só ajudou a terminar de fazer o esperado, ela correu direto para o banheiro onde vomitou até a alma, vomitar todas as manhãs já havia virado rotina, ela estava atrasada para escola, mas isso não a motivou em nada, apenas tomou seu banho quente e vestiu uma calça jeans qualquer com uma camiseta e um casaco escuro, calçou um tênis, escureceu seus olhos com uma maquiagem borrada para tampar as olheiras fundas e após pegar a bolsa com os mesmos cadernos de sempre, uma garrafa de vinho e um frasco de calmantes, saiu de casa sem mesmo avisar que ainda estava viva.

Ao contrário do que achavam ela não foi para a escola, ultimamente era o que menos fazia, às vezes caminhava pelo parque, outras ia ao cemitério conversar com o túmulo do melhor amigo que havia morrido há dois anos de câncer. Hoje era um dos dias que ela não sabia o que fazer e por isso resolveu ir até seu amigo, não que ele fosse aparecer para ela, por mais que ela desejasse.

Rapidamente ela chegou até seu destino, um campo vasto que só demonstrava ser um cemitério pelas pequenas lápides de mármore cravejadas por nomes e datas. O caminho até o nome de seu amigo era um pouco longe da entrada, mais precisamente 5 minutos caminhando cemitério a dentro, finalmente ela avistou a lápide um pouco suja e com algumas ervas daninhas ao lado, provavelmente pelas poucas visitas que recebia, na verdade ela era a única que ainda se lembrava do garoto.

Indignada com o estado da lápide, ela jogou sua bolsa no chão próxima ao local e começou a arrancar as ervas que ali cresciam, substituindo-as por flores que tirou de um canteiro bem cuidado à alguns metros. Com seu próprio casaco ela limpou o mármore empoeirado que brilhou mais que os outros, satisfeita com o trabalho Lucy sentou ao lado da pedra e recostou sua cabeça na mesma pensando no que faria agora, se levaria adiante o que planejara há dias.

Com seu caderno em mãos ela escreveu, enquanto lia em voz alta, uma carta onde de forma resumida contava tudo que havia lhe ocorrido nos últimos três anos, desde a doença de seu melhor amigo e seu arrependimento por não estar ao seu lado quando ele deu seu último suspiro e confessou que a amava para a enfermeira, que mais tarde lhe contou. Ela contava como sua vida nunca mais havia sido a mesma desde a morte da única pessoa que havia segurado sua mão durante seus desabafos sobre as brigas dentro de casa entre seus pais que ora estavam alcoolizados ora apenas buscavam um motivo qualquer para iniciar uma discussão não apenas entre eles, mas com ela também. Na carta extensa ela contou tudo que aconteceu de ruim em todos os seus 17 anos de vida, e as poucas coisas boas que lhe ocorreram durante sua amizade com Daniel.

Terminado de escrever as três folhas um pouco manchadas com lágrimas que escaparam, ela pegou os 24 calmantes, engolindo-os com o vinho que havia carregado. Entretanto para ter certeza de que não haveria como alguém a impedir de fazer o que queria, Lucy tirou do fundo de sua bolsa um pequeno canivete e cortou fundo seus pulsos, por onde escorreu bastante sangue, chagando a perder o movimento de uma de suas mãos, provavelmente ela atingira o nervo.

Enquanto esperava o remédio ou o corte fazer efeito ela pegou sua carteira com a mão que ainda funcionava e tirou a foto amassada, dela e seu melhor amigo, seu melhor companheiro, o amor de sua vida.

A morena, que estava um pouco tonta pela quantidade de sangue já perdido, pegou a caneta caída ao seu lado e anotou atrás da foto as seguintes palavras: "Como vocês esperam que eu continue vivendo se parte de mim já está morta?". Assim que terminou de escrever Lucy deixou a caneta de lado e caiu com os olhos entreabertos fixos na foto do companheiro.

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