1. Ethan

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OLHO para o sangue em minhas mãos trêmulas. Não consigo me mexer. Ouço minha pulsação com clareza. Os sentidos entorpecidos pela vívida cor vermelha que envolve minhas mãos e a pele dos meus braços.

Grande parte da sala ampla está envolta na penumbra, há apenas uma luz fraca vinda de uma luminária fixada em uma parede próxima e a luz fria do luar que entra pela janela localizada por trás da mesa de mogno a alguns metros de mim.

— Não, isso não está acontecendo. — diz Sutter com uma risada que denota seu desespero.

— Eles chegarão logo. — fala Roman, os olhos biônicos cintilam em uma fração de segundos direcionados a mim que me encontro de joelhos junto ao tapete.

— Exatamente. — interfere Sutter enxugando o suor nervoso do seu rosto com a manga comprida de sua camisa. — É por isso que temos que sair daqui. Fingir que nada disso aconteceu. Que não sabemos de nada.

— Por quanto tempo suportaria conviver com essa mentira sem quebrar, Sutter? — questiona Roman, segurando Sutter pelos ombros.

— Nós estamos vivendo uma mentira há meses, Roman! — vocifera Sutter.

— É, e olhe onde estamos agora. A verdade sempre encontra uma maneira de se revelar, de uma forma ou de outra. — rebate Roman.

— Eu tenho uma vida. — alega Sutter caminhando para alguns metros mais longe de nós. — Estou alcançando meus objetivos, tenho o Jason. E agora tudo está prestes a ser tirado de mim de forma abrupta.

— Nós também tiramos tudo de alguém, Sutter. O que está havendo agora pode ser chamado de qualquer outra coisa, menos de injustiça. — afirma Roman com a voz ligeiramente rouca. — Além do mais, já fomos vistos, e ainda que não fôssemos, acha que não seríamos os primeiros a serem acusados? Hospitalidade e acolhimento são conceitos ambíguos, Sutter. Podem ser algo bom, mas também podem facilmente vir de alguém querendo te manter perto para ter controle sobre a ameaça que enxerga em você.

— Sei disso. Estavam apenas esperando uma maneira de nos subjugar novamente e agora ela está aqui. Três criminosos. Ethan será condenado por assassinato e nós por cumplicidade. — fala Sutter com as mãos pressionando a própria cabeça.

— Não. — digo. Minha voz soa fria e os olhares de Sutter e Roman se voltam para mim. — Ninguém aqui vai ser condenado.

— O que quer dizer? — pergunta Roman enquanto me levanto do chão.

— Muitas pessoas depositaram a confiança em nós. Não podemos nos dar ao luxo de frustrar as esperanças delas. — reitero.

— Você está percebendo o que está falando? — indaga Roman. — Olhe para o que está diante de você. Está realmente acreditando que temos outra escolha? Não dá para ignorar isso.

— Tem razão. — admito. — Não dá para ignorar...

Roman dá um suspiro de alívio.

— ...mas dá para acobertar. — concluo e o olhar de Roman se volta para mim, ele cintila de forma rápida outra vez. — Não se pode acusar ou condenar alguém por algo que não se tem certeza que aconteceu.

— Está sugerindo que... — começa Sutter.

— Vamos nos livrar do corpo e consequentemente de qualquer acusação posterior. — falo. — Não temos nada a perder, ganhamos muito e ainda temos muito mais a ganhar e isso não pode nos atrapalhar agora.

Sinto o calculismo e a frieza em mim de uma maneira que nunca senti antes. Isso deveria me incomodar, mas eu apenas enxergo ambos como necessários na atual circunstância.

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