2: Roman

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O silêncio nas ruas é tão absoluto que conseguimos ouvir, claramente, o barulho de nossos sapatos a cada passo dado. Caminhamos em meio a uma névoa que se estende pelas ruas e dá aos arredores um tom sombrio. A sensação que se dá é que algo está à espreita esperando o momento certo para atacar.

Aqui embaixo, nas ruas cercadas por construções altas, a noite torna-se mais escura do que normalmente é para mim dentro do Lar dos Insólitos.

— Modo noturno. — sussurrei para que o dispositivo dentro da minha cabeça acione a visão noturna e eu possa enxergar melhor no escuro.

Passei a enxergar através de um sistema infra-vermelho. Vi Ethan e Sutter à minha frente como dois vultos ligeiramente amarelos devido ao meu aparelho ocular detectar o calor do corpo deles e reproduzir seus movimentos com base nisso.

Nos esgueiramos junto as sombras através das várias ruas. De início, a maioria delas é constituída por comércio. Padaria, mercearia, açougue...

Em seguida, havia casas populares, prédios residenciais onde o povo se instala. As residências e os estabelecimentos tem aparência cada vez melhor conforme nos aproximamos do Prime. Ouvi as freiras conversando certa vez. Uma delas estava se gabando que a irmã dela gastou uma fortuna em uma casa próxima ao Prime. Eu não sei o que faz menos sentido. Você se gabar pelas conquistas de outra pessoa ou achar que uma residência vale um preço exorbitante por estar localizada junto ao muro de um bairro considerado luxuoso.

Passamos em frente a uma loja com uma vitrine onde estão exibidos vários modelos de ternos e smokings. Ouvi parte dos passos cessarem e alguns centésimos de segundo depois vi Sutter parando de correr. Ele olhou fixamente para a vitrine. Ethan parou cerca de um metro depois.

— Seria muita idiotice se eu admitisse que já me imaginei usando um desses? — perguntou ele.

— Seria. — disse. O dispositivo reagiu mostrando os movimentos de Sutter voltando o olhar para mim e fazendo uma careta.

Sorri.

— Estava brincando. — afirmei. — Não, não é idiotice. Faz sentido se levar em conta que sonhar é um dos poucos direitos que não arrancaram de nós.

— Isso porque ainda não encontraram uma forma de fazê-lo. — falou Ethan. — É inevitável que uma vida em que tão pouco pareça ser algo inalcançável incite a revolta dentro dos Insólitos.

—Tem razão. — disse. — Mas precisamos ir agora. Eu não estou a fim de ser pego pelos guardas da ronda.

Dito isso, tomei a dianteira sendo seguido por Ethan e Sutter.

— Se eu conseguir descobrir alguma coisa sobre aquele desgraçado essa noite, ele estará morto antes de eu ser mandado para o front. — declarou Sutter com firmeza na voz ao falar de seu pai.

— Você e seu desejo de vingança. — falei. — Às vezes consegue soar insano, sabia?

— Não parece tão insano quando isso fornece a única motivação concreta que você tem na vida. — respondeu Sutter. — O que eu não consigo entender é como você consegue ignorar as injustiças que sofreu e aceitar de forma passiva tudo o que é imposto a você.

— Cada um reage de uma forma. — rebati enquanto continuávamos avançando pelas ruas.

— Não chame isso de reagir. O que você faz é aceitar. Somente aceitar. — alegou Ethan.

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⏰ Última atualização: May 19, 2018 ⏰

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