Lá vai mais um :D
Eu odiava Clementine, odiava Jason, odiava a vida que levava e também odiava a mim. Quem sabe se eu fosse uma filha melhor, talvez eles não fossem tão rui... Ah, a quem eu queria enganar? Eles eram ruins por natureza e isso não era nem de longe culpa minha ou de Nick. Disso eu tinha certeza e também tinha certeza de que devia parar de tentar encontrar um motivo pra isso. Eles seriam sempre assim e ponto.
Os vizinhos não faziam a mínima ideia do que se passava nessa casa. Para a sorte de Jason e Clementine, morávamos um pouco afastados. Portanto os gritos deles dirigidos a mim e Nick e vice-versa. Ou talvez, se algum vizinho que passava por aqui já ouvira, não quis se envolver ou não se importou, isso sempre irei me questionar. E das duas vezes em que a polícia bateu e revistou aqui, por suspeita de drogas, eles nos obrigaram a ficar de fico fechado, com ameaça de espancamento. E eu não tenho a minima ideia de onde eles esconderam toda a droga e a bebida (se é que escondiam aqui) e menos ainda de como conseguiram ser tão convincentes e adoráveis na frente dos policiais. Realmente mereciam o Óscar.
Por sorte, o dia passou rápido e ocorreu tudo "bem", para mim e Nick, "ocorrer bem" significava Clementine e Jason trancados no quarto, com uma fumaça saindo debaixo da porta. Sem gritos, brigas ou agressões. Esses dias eram raros, mas eram o que sempre chamaríamos de "ocorrer bem". Nick foi jogar seu vídeo game depois ler um pouco, e eu segui nas tarefas da casa. Realmente não sabia porque fazia aquele favor pra eles, mas se teve algo que aprendi com isso é que roxos pelo corpo doem, e eu não era boa de deixa isso acontecer de novo. Sim, foi por não ter cortado a grama para Jason que ganhei o que Nick chamava de "estilo metade-panda". Nick costumava debochar de Jason e Clementine logo após as brigas (sem eles verem, é claro) na tentativa de amenizar o horror que nos consumia todas as vezes
- Nick, Nick, acorda! Vamos, Nick, acorda!
Liguei a luz de seu quarto e ele sentou na cama apertando os olhos
- Angie? O que você quer? Eles fizeram alguma coisa?
- Não Nick, e nem vão fazer. Nunca mais. Agora levanta!
- O que?
Pela expressão de Nick ao ver minha mala do lado de sua cama, pude entender que sua pergunta não significava "não entendi, pode repetir?" mas sim "você enlouqueceu?"
- É, Nick, vamos fugir, fugir pra bem longe daqui e nunca mais voltar. Vamos esquecer essa vida e tentar uma vida nova. Você tem 8 anos e eu 17, não é muito, certo? Não é tarde, podemos recomeçar. Eu vou cuidar de você pra sempre, podemos acabar com isso logo...
Eu cuspi as palavras rapidamente em um sussurro, temendo que eles acordassem e Nick me interrompeu:
- Não, Angie! Eu não posso. Não posso fugir assim, nem você. É arriscado demais e não temos dinheiro. Onde vamos parar? Pode acontecer muitas coisas ruins lá fora.
- Coisas ruins lá fora? E quanto aqui dentro, Nick? E quanto a esses doentes, drogados e agressivos bem debaixo do nosso teto? Creio que vai precisar de muito pra nos impressionar lá fora.
- Não posso, Angie, não posso mesmo. Por mais que eles sejam assim, eles têm problemas, precisam de ajuda e eu os amo. Não posso abandonar o papai e a mamãe. Tenho que ajudá-los a superar o vício.
- SUPERAR O VÍCIO? _ explodi - Eles são viciados desde que você Nasceu, Nicholas! Desde que EU nasci. Não vão superar agora nem nunca e se entraram nessa foi porque quiseram!
- "Nicholas"? então você está brava comigo? Tudo bem, também sei ficar bravo com você, ANGELINE! Está vendo? E os estudos? Faculdade? Você não vai tentar? E o que eu vou dizer pra eles amanhã? Vai ficar tudo pra mim, Angie...
Mesmo 9 anos mais novo que eu, Nick era completamente pé-no-chão, muito mais que eu (se é que eu era).
- É por isso que quero que venha comigo, você não vai aguentar eles sozinho. E os pesadelos que você tem com eles umas três vezes na semana? Quem é que vem ver você quando você acorda assustado? Estivemos sempre juntos e temos que continuar, por favor. Vamos começar uma vida completamente nova como eu disse a você...
A expressão de Nick indicava que ele já estava decidido, não importando o que eu dissesse.
- Vai mesmo ficar? Acha que consegue aguentar tudo isso diariamente? Você pode vir comigo, pode ser feliz, sabe disso.
Ao dizer essas palavras a ele, lágrimas escorreram. As limpei rapidamente antes que ele visse.
- Vou Angie, tenho que ficar, por eles. Ainda tenho esperança que eles irão me amar. Desculpe ter me zangado com você... E você, vai mesmo ir?
Sua expressão era tristeza, mas Nick não chorava, nunca chorava, deve ter aprendido isso comigo. Apesar de hoje, eu não ter conseguido segurar.
- Eu amo você, não se esqueça disso. Vou voltar pra buscar você um dia, assim que eu puder, eu prometo. E se perguntarem de mim amanhã, diga que não sabe, que não sabe de nada. E não se cale pra eles, está ouvindo? Nunca! E não deixe eles fazerem o que quiserem com você. Eu sei que você é forte, sei que é bem diferente de mim. Muita coisa aprendi com você, e você vai conseguir, está bem? Sei que vai.
E dizendo isso, abracei Nick uma última vez, por um longo tempo. Mexi no bolso do meu casaco e entreguei a ele uma correntinha de ouro com um pingente que tinha ganhado da vovó Juliet, logo antes de seu falecimento. A única pessoa da família que eu conheci, tirando as que estavam nessa casa. O pingente era um pequeno anjo brilhante que segurava uma estrela com um minúsculo diamante no meio.
- Quero que fique com isso pra lembrar de mim e pra ganhar forças toda vez que olhar pra ele. Sempre que sentir medo, segure ele firme e não desista.
Ele pegou a corrente, observou por um tempo e colocou debaixo de seu travesseiro.
- Obrigada, Angie. Vou lembrar de você e da vovó Juliet todos os dias. _ Seu sorriso era triste - Adeus.
- Adeus, Nick.
Respirei fundo, ajeitei a mochila em meus ombros e peguei minha mala. Saí de seu quarto em direção a porta da frente. Ao abri-la, observei uma noite calma e completamente escura. Não havia sinal da lua ou das estrelas, noite perfeita para uma fuga. Olhei para a janela do quarto de Nick antes de entrar de vez na escuridão que encobria a rua. A partir de agora, minha vida mudaria para sempre.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Pra Nunca Mais Voltar
RomanceAngie tinha 17 anos, morava com seus pais e seu irmão mais novo Nick. Aparentemente,uma garota normal, vivendo uma vida normal, mas ser e viver normalmente era tudo o que ela queria. Sua mãe, Clementine e seu pai Jason, faziam Angie e Nick vivere...