"Vamos ignorar o Spencer"

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Spencer

KAT AINDA ESTÁ BRABA COMIGO. Já estamos perto do final de semana e ela ainda nem sequer me cumprimentou. Ela passa por mim no corredor e finge me ignorar. Sinto-me tão culpado que decido que devo compensa-la de alguma forma.

—Kat—apelo, esperando que ela pelo menos fale comigo. Esse jogo do silêncio apenas faz com que eu me sinta pior do que já estou. Ela para e me olha, franzindo os lábios, séria. —Sinto muito pelo cinema, Kat. Espero que você possa me perdoar um dia. E se eu puder irei recompensar você, eu prometo.

Ela não falou nada, apenas me encarou e saiu. Sinto muito, maninha. Espero poder te recompensar algum dia. Respirei fundo e soltei o ar dos pulmões, como se isso ajudasse a diminuir a dor.

Já estava atrasado para ir trabalhar e, ainda teria que buscar as garotas na escola na hora do almoço. Mamãe as largava na escola, antes de ir para o trabalho. Meu chefe me dá uma hora de intervalo e, na maioria das vezes, venho para casa almoçar com as minhas irmãs, já que minha mãe trabalha o dia inteiro na lanchonete do Krust.

Quando desço, para comer alguma coisa rapidamente, encontro Jen sentada à mesa servindo-se de cereal. Ando até o armário perto da pia e pego uma tigela pequena para me servir um pouco do cereal também.

—Bom dia Jen—cumprimento minha irmã, que está com os seus cabelos pretos presos em um rabo de cavalo. Kat, eu e Jen temos cabelos escuros como a noite que nem o meu pai, e Mya tem mais a ver com a minha mãe. Jen não me cumprimenta. Ela continua comendo seu cereal e coloca os fones de ouvido. —Pelo visto hoje estão jogando o jogo "vamos ignorar o Spencer".

Mamãe entra na cozinha.

—O que foi querido?—ela pergunta com uma ruguinha se formando quando ela franze a testa. —Deu para falar sozinho agora?

Sorrio, enquanto sento-me a mesa, me servindo cereal e colocando leite na tigela. Mamãe estava sorrindo e tirando sarro de mim. Desde a morte do meu pai—quando as coisas realmente apertaram para nós e mamãe sozinha não conseguia pagar mais as contas—, eu não a via sorrir como ela está sorrindo agora.

—Só estava pensando alto, mãe. —respondo. —É melhor eu ir agora. Vou me atrasar se demorar mais um pouco.

—Mas você mal tocou no seu cereal querido.

Eu me aproximo dela e beijo sua bochecha. Jen começa a se balançar na cadeira cantando alguma música que eu não conheço; ela nem está prestando atenção em nós.

—Não estou com muita fome. —rebato, tentando soar o mais agradecido possível. Já era a terceira semana que comíamos cereal e leite no café da manhã. —Até mais mãe. Eu amo você.


Ela sorri docemente para mim e me dá sua bênção.

A Port Falls fica perto da rua da minha casa, por isso vou a pé buscar as garotas. Estou tentando juntar dinheiro e comprar um carro, mas tem muitos motivos—sustentar minha família, por exemplo—que me impede de guardar dinheiro para um carro.

Ando até os grandes portões de entrada, passando pelo gramado verde e me dirijo até a sala da Kat. O dia estava ameno e isso era agradável para mim. Demoro cinco minutos para chegar à porta da sala da Kat. A porta está entre aberta e consigo vê-la, sentada bem ao fundo olhando pela janela, pensativa. No que ela está pensando? O sinal toca, fazendo-me esquecer de qualquer raciocínio que eu tivesse formado há segundos atrás.

—Oi Kat—digo com um sorriso. Ela não me responde. Você me lembra do papai, penso. —Ah qual é Kat! Até quando vai ficar assim comigo?

Ela começa a andar, me deixando, novamente, falando sozinho.

A sala da Mya fica no final do corredor à esquerda. Eu e Kat dobramos em silêncio o corredor e paramos na metade do caminho, pois Mya já está vindo em nossa direção.

—Me deixa adivinhar, ela não quer falar com você?—pergunta Mya, indiferente.

Concordo. Kat não quer falar comigo, mas me entrega suas coisas para que eu as carregue. Meus ombros pesam, não por estar carregando a mochila da minha irmã e sim porque estou cansado do meu trabalho.

—Vamos esperar a Jen lá fora. —pede Mya. —Podemos Spen?

Concordo novamente e nos direcionamos para o pátio extenso da Port Falls.

Jen sai e atrás dela tem uma garota, que, aparentemente tem a mesma idade que ela e um rapaz da minha idade, que andam lado a lado. Jen está séria, como na maioria das vezes. Ela dá passos largos e rápidos, como se quisesse sair logo dali.

—Olha lá o entregador de água mineral. —diz o garoto com o cabelo cheio de gel, apontando para mim. A garota segue o olhar para onde ele aponta (que no caso sou eu) e o dá um soco no ombro. —Veio buscar as irmãzinhas.

—PARE com isso Tedd!—ela diz, dando ênfase no inicio. Seu cabelo estava preso em um coque desarrumado e seus olhos cor de mel demonstravam uma fúria assustadora. —Você é tão imaturo às vezes.

Jen vira para trás, parando.

—O que foi que você disse seu idiota?

Droga, não faça isso Jen.

Eu corro até lá, sem nem prestar atenção em Kat e Mya. Jen tenta avançar para arranhar o rosto do garoto, mas eu a seguro a tempo.

—ME SOLTA SPENCER!—ela grita tão exaltada que fico um pouco aflito, mas não a solto. Ela esperneia e tenta se desvencilhar, mas eu uso toda a minha força para não solta-la. Pelo visto Jen e Kat puxaram o lado brigão do meu pai. —ME SOLTA QUE EU QUERO QUEBRAR ESSE IDIOTA AO MEIO!

—"Me solta que eu quero quebrar esse idiota ao meio"—imita o garoto, provocando a minha irmã ainda mais. —Você é fraca, garanto que nem doeria se você me batesse.

Todo mundo está olhando para a nossa direção.

—Pare com isso Tedd!—repreende a garota, posicionando-se em frente do encrenqueiro. —Pare de arrumar encrenca! Deixe a garota em paz, senão eu mesma a ajudarei a bater em você!

Percebi que Jen se espantou com a atitude da garota com olhos cor de mel. Ela era bonita, mas não fazia muito o tipo de garota que eu normalmente me interessava.

—Vamos embora—sussurrei para Jen. —Vamos antes que você arrume problemas.

O garoto sai.

—Spencer—chama Mya atrás da garota loira. Ela estava de mãos dadas com Kat, que olhava com certa timidez. —Por que você saiu correndo?

A garota loira se aproxima de Jen e de mim.

—Me desculpem pelo meu amigo Tedd—ela sorri, de forma angelical e gentil. —Eu prometo que ele não vai fazer isso de novo.

Jen apenas concorda com ela, meio confusa. Eu sorrio gentilmente e ela vai embora.

—Ela é a sua namorada Spen?—pergunta Mya, com malicia. —Quero ser tão bonita quanto ela.

Jen dá um sorriso cético e irônico.

—Você já é bonita Mya. —digo apertando levemente uma de suas bochechas. Mya sorri, acariciando sua bochecha. —E também muito talentosa e durona.

Mya fica deslumbrada com minhas palavras.

—E eu?—pergunta Kat. —E eu Spen?

Eu sorrio para ela.

—Você Kat—pego-a no colo. Ela está ficando mais pesada a cada dia. —Você é a mulher mais importante da minha vida e faria qualquer coisa pra deixar você feliz.

Kat beija minha bochecha e então saímos da Port Falls.

 

A Rainha dos Caídos-OriginalOnde histórias criam vida. Descubra agora