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Eu podia sentir um ar poeirento e pesado adentrando minhas narinas, deixando-me completamente desnorteada

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Eu podia sentir um ar poeirento e pesado adentrando minhas narinas, deixando-me completamente desnorteada. Meu corpo se chocava contra paredes de metal que me conduziam de um lado para o outro.

Não importava se meus olhos estavam abertos ou fechados; tudo que eu via era a escuridão, e raramente algumas frestas de luz.

Meu coração palpitava freneticamente, como se fosse saltar para fora em qualquer instante, me sentia assustada. Apavorada. 

Enquanto tentava me manter em pé no compartimento que se movimentava para cima, decidi me concentrar no sons que conseguia ouvir. Eram sons de correntes e polias, muito semelhantes aos de usinas. Céus. Onde eu estava? O que estava acontecendo ali?

Por mais que eu forçasse minha cabeça para lembrar-me de algo, nada vinha. Era como se eu estivesse vazia e apenas meu corpo estivesse presente ali. Por que eu me sentia tão desconfigurada?

O compartimento deu um solavanco inesperado e meu corpo fora jogado novamente ao que deveria ser o chão. No entanto, dessa vez, acertei alguma coisa. Suponho que sejam caixas de madeira. 

Encolhi minhas pernas de encontro ao meu corpo enquanto sentia as caixas baterem contra meus braços. Por um segundo, pensei ter ouvido algo respirar dentro da caixa, mas a ideia se desvencilhou de acordo com as possibilidades. Que ser vivo poderia caber em uma caixa? 

"Talvez um gato", pensei, gostando da ideia de ter alguma companhia.

O compartimento continuava subindo, porém agora mais rápido.

Eu não tinha ideia do que estava acontecendo e me sentia frustrada por isso. Não senti vontade de chorar ou de gritar, apenas senti-me frustrada ao ponto de ficar ali, parada, esperando pelo pior.

Esforcei minha cabeça para esquecer esses sentimentos e uma voz remota chamou por mim em meus pensamentos.

— Hope — sussurrei para mim mesma no mesmo momento que tal nome surgiu em minha mente — Meu nome é Hope.

A única coisa que eu conseguia me lembrar de toda a minha vida era o meu nome. Ao menos lembro-me de alguma coisa. Seria pior se nem mesmo meu nome eu soubesse. Mas para quê adiantava? Pelo jeito que as coisas estavam fluindo, eu iria morrer em alguns minutos. Essa caixa provavelmente irá chegar a lua ou em algum planeta distante. 

Ah, mais que droga! Por que ela nunca para de subir?

Fechei os olhos desejando que tudo aquilo não passasse de um pesadelo; era como uma tortura ficar presa naquele lugar escuro, sem saber de nada e sequer poder respirar um ar puro e contagiante. 

Ao notar que a velocidade da caixa fora diminuída, resolvi me sentar e cogitar diversas teorias sobre o que aconteceria agora, afinal, a caixa parecia estar parando. Talvez eu tenha chegado a lua, ironizei mentalmente, torcendo para que não fosse realmente isso.

Não era tempo para pensamentos irônicos, portanto, os expulsei imediatamente. Estava começando a ficar nervosa à medida que a velocidade da caixa diminuía, estava parando aos poucos.

Foi quando os ruídos de correntes cessaram que soube que havia finalmente parado de subir, porém, não sabia se isso era algo bom.

Senti uma corrente de energia percorrer minha espinha, dando-me forças para me afastar para o canto mais longínquo da caixa.  

Novos ruídos alcançaram meus ouvidos, esses totalmente diferentes dos antigos. Eram risadas, conversas, muitas vozes — todas de garotos.

Eu não fazia ideia do que esperar, então apenas fechei meus olhos, torcendo para que não fosse algo tão trágico.

— Isso não é mais tão divertido quanto antes — uma voz adentrou a caixa de maneira leve e quase inaudível. O que não era tão divertido?

— Sempre é divertido — contestou outra voz.

Me encolhi o máximo possível. 

Um rangido estridente se formou acima da minha cabeça e uma linha reta de luz surgiu entre dois partimentos. As olhei encantada; aquela escuridão estava me fazendo sentir sensações estranhas.

Os dois partimentos começaram a se expandir, trazendo mais luz para dentro da caixa. Meus olhos começaram a sentir o forte impacto da luz e lacrimejaram. Os fechei e tampei o rosto, esperando estar em algum lugar com pessoas civilizadas que pudessem me ajudar.

Por fim, os partimentos se alargaram o máximo possível, estavam totalmente abertos. E, de forma rápida, várias vozes começaram a falar ao mesmo tempo. Tentei vê-los, mas meus olhos ainda ardiam.

— Seja bem-vindo, Fedelho.

— Não há passagem de volta, apenas ida.

— Espero que não seja tão mertilento como Gally.

— Cala a boca, seu plong.

— Precisa de algum convite para entrar nessa mértila, Newt?

— Estou indo.

Tentei me afastar para mais longe, mas minhas costas já estavam coladas na parede. Não tinha como fugir dali.

Senti a caixa balançar, como se alguém tivesse pulado dentro dela. Mesmo com meus olhos ardendo por conta da luz, os direcionei a pessoa que estava ali dentro. Não demorou muito para que visse com clareza. Era um... garoto. Loiro, magro e de rosto amigável. 

Ele tinha uma cara de espanto, parecia estar completamente assustado e surpreso. Será que tem algo de errado comigo?, perguntei a mim mesma. As vozes voltaram a falar:

— Por que está demorando tanto? 

— Talvez tenha achado um cadáver.

— Traga nosso novo camarada, Newt.

O garoto permaneceu em silêncio, perplexo. Eu o olhei de maneira estranha, querendo muito perguntar o que tinha de errado com ele, ou comigo. No entanto, minha voz não saiu.

Surgiram dezenas de cabeças na abertura da caixa, todos garotos, me encarando como se eu fosse um ser diferente e anormal. E tudo que eu conseguia pensar era o motivo para essa caixa ter me levado a um bando de moleques cheios de gírias esquisitas.

Pela última vez o garoto me olhou e logo em seguida pronunciou lentamente cada uma de suas palavras, evidenciando não apenas o seu espanto, mas também o dos outros garotos:

— É uma garota. 

ravens // tmrWhere stories live. Discover now