Talvez eu seja o pior jardim da história dos jardins. Isso explicaria o fato de que todas as borboletas se vão.
✽
Luz vermelha, paro.
Fecho os olhos e respiro profundamente. Sinto o suor da palma das mãos, um barulho latejante nos ouvidos e um coração que simplesmente não consegue ficar quieto em seu canto. Sem fazer esforço algum, consigo sentir em meus lábios a temperatura que os seus emanavam, como se o tivesse beijado há pouco. Mas faz apenas um dia.
Quero vê-lo de novo. Mas ao mesmo tempo não quero. Como devo reagir? Devo mencionar algo ou simplesmente agir casualmente? O que Rosalya faria? Talvez, provavelmente algo do que me arrependeria mais tarde. Mas ei, ela te empurrou até aqui, e houveram avanços. Bolas! Estou perdendo a cabeça.
Abro os olhos e a luz do sol está forte demais. Preciso esfregá-los para enxergar com clareza e mesmo assim ainda vejo pontos luminosos. O sinal fica verde, o que indica que devo prosseguir. Além deste cruzamento encontram-se os portões de Sweet Amoris e com eles um novo desenrolar da história.
Ouço um som estridente e então pneus raspam o chão na tentativa de parar. Está ao meu lado. Está bem do meu lado. Fico sem reação quando vejo o carro parar repentinamente à minha direita. O motorista abre a janela.
— Não olha para onde anda não, ô maluca!!
Olho para o sinal. Verde. O maluco é ele. O encaro decidida a berrar de volta o quão culpado ele é, quando noto a figura encolhida no banco detrás. A menina não tem mais que quatro anos de idade, grandes e curiosos olhos azuis e agarra a mochila em seu colo como se sua vida dependesse disso. Toda a revolta se esvai de mim e decido apenas acabar de atravessar a faixa. Com um pai imprudente desses, não é à toa que esteja, no mínimo, preocupada.
Quase esqueci meu pequeno dilema interno. Quase.
Assim que adentro os portões da escola as mãos soantes, o barulho insistente nos ouvidos e o coração pulante retornam com força total como se o bartender acabasse de anunciar o início da happy hour. E claro, o "quero vê-lo, mas não quero", está presente também. Apesar de tudo, inicio minha rotina habitual, afinal, a fama de exploradora dos corredores não é feita do dia para noite.
Exceto que...
Não há ninguém à vista.
Por exemplo: Nathaniel não está no grêmio. Não vejo Lysandre nos corredores. Armin não está enfornado em uma sala acabando com uma invasão alienígena. Alexy não está tagarelando em canto nenhum. Também não sei o paradeiro de nenhuma das meninas. Ambre não veio encher o saco, o que, eu agradeço aos céus embora também me preocupe. Não é normal. Até mesmo a Rosa, que a essa hora devia estar dando pulinhos de alegria ao meu redor pelo acontecimento de ontem, está escondida em algum canto. E principalmente, não faço ideia de onde Castiel esteja.
Checo a hora no celular só para ter certeza de que não estou atrasada ou algo do tipo (o que, frequentemente acontece) e depois de rondar a escola pela segunda vez, finalmente ouço vozes vindas do porão. Sem pensar duas vezes, começo a me aproximar.
— Oh, vamos, não tente esconder! — A voz 1 disse com convicção. — A foto diz por si só, admita!
Foto? Opa, isso é novo!
— Por que você não vai se lascar, hein? — A voz 2 retruca transbordando de raiva. Essa voz eu reconheço instantaneamente como sendo a que eu mais queria ouvir. Castiel.
— Mas está evidente, Castiel. — Uma terceira voz, calma e paciente, fala. Lysandre. — É mais fácil você declarar que gosta mesmo dela e deixar as coisas se acalmarem por enquanto.
— Eu não acredito que até você está me enchendo com isso!
— Ora, depois de todo o trabalho que Candy teve para te fazer abrir os olhos, vocês deveriam engatar num relacionamento. — Rosalya diz.
Eu não gosto do rumo que a conversa está tomando. Castiel não gosta de ser pressionado, todo mundo que tem um pingo de juízo na cabeça e respeito pela própria vida sabe disso. Começo a caminhar em direção à porta para intervir.
— Este assunto é de interesse do Castiel e da Candy. Nenhum de nós deveria estar envolvido ou sequer discutindo a respeito. — Desta vez é a Priya que argumenta. Apesar da primeira impressão perturbada e de minha errônea desconfiança a seu respeito, agradeço baixinho pelo que ela disse. Aparentemente, ao menos alguém quer evitar o grande desastre que isso está prestes a resultar.
— Eu concordo, Candy não gostaria do que está acontecendo aqui. — Alexy emenda logo em seguida.
— Do que vocês estão falando? A guria vive metendo o nariz nos assuntos alheios, que mal faz a gente retribuir o favor de vez em quando? — Kim diz com aquele tom de deboche, e percebo que recebe pequenos murmúrios de Melody e Bia em seu apoio.
— Exato! — A voz 1 exclama em êxtase. Somente agora consigo reconhece-la como sendo da Peggy.
Bolas!
Ela continua.
— E sem contar que tudo isso me rendeu uma bela reportagem, chegando a ultrapassar a vez em que se perderam na corrida de orientação. Não tinha ninguém que não estivesse com o jornal em mãos. O lado ruim é que vocês provavelmente receberão uma bronca ou castigo da diretora por se pegarem nos perímetros na escola, mas provavelmente não será nada muito grave.
Droga.
Bolas!Bolas!Bolas!Bolas!Bolas!Bolas!Bolas!Bolas!Bolas!Bolas!
Ela fotografou o beijo. Eles sabem. A escola toda sabe, a diretoria e o corpo docente sabem e meus pais logo saberão.
Preciso entrar. Preciso tentar consertar isso, seja lá como eu posso sequer consertar isso. E principalmente, preciso fazer Peggy engolir esse maldito jornal de um jeito nada agradável.
Alcanço a maçaneta e a giro. Abro a porta bem a tempo de...
— SERÁ QUE DÁ PARA VOCÊS TODOS PARAREM?! COMO SE EU FOSSE PERDER O MEU TEMPO COM ESSA TÁBUA!
Castiel grita para todos.
Eu paro. A alma evaporando e saindo por todos os meus poros. MAYDAY, MAYDAY. Há uma emergência ocorrendo dentro desta garota envolvendo risco de vida e necessita imediatamente de socorro. Algo como uma fuga para o buraco mais profundo da Terra, sem expectativa de retorno.
Agora vejo todos eles.
Lysandre, Rosalya, Alexy, Prya, Kim, Violette, Armin, Kentin, Melody, Iris, Bia, Li, Charlotte, Nathaniel. Peggy com o olhar triunfante, pronta para ir redigir tudo o que está acontecendo. Edição 2.0 do pior momento da minha vida. Todos os olhares que fitavam a explosão do Castiel agora me encaram. Minha mão ainda está na maçaneta e minha respiração entrecortada. Preciso sair daqui. Agora. Não antes de ver o par de olhos turquesa que sorriem com deleite. Se a notícia do beijo a havia afetado, esse é o momento em que Ambre pensa que saiu por cima. "Nem a mim e nem a você", é o que o sorriso diz.
Estou recuando quando ele finalmente percebe quem todos encaram e se vira.
Não existe mais o "quero vê-lo, mas não quero", as mãos soantes encontram-se mais frias do que gelo, a sirene de um caminhão de bombeiros ecoa em meus ouvidos, e o coração pulante murchou e sente-se como se nunca mais fosse capaz de florescer novamente.
Só consigo ver o deslumbre do cinza tempestuoso de seus olhos antes de virar e correr.
Correr.
Correr.
Correr.
Para o mais longe possível e deixando para trás os resquícios da bomba que acabou de explodir.
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chaotic ✽ amor doce
FanfictionÉ uma das leis mais importantes do Universo, presente na essência de quase tudo o que nos cerca. A ideia central da teoria do caos é que uma pequenina mudança no início de um evento qualquer pode trazer consequências enormes e absolutamente desconhe...