"Eu sei que o amor é doloroso... mas... não podemos simplesmente tirá-lo de nós"
O acampamento estava eufórico. Pela manhã tivemos a notícia de que teríamos um novo comandante, e essas notícias causavam certo terror em todos os indivíduos que ali habitavam. As mães que ainda tem seus filhos ou maridos ou pais, ou qualquer ser do sexo masculino, ficam histéricas. Ali já não existiam muitos homens e o terror de perdermos ainda mais pessoas que amamos, torna tudo complicado. Às vezes, quando Cam estava dormindo ou distraído, eu me pegava pensado como ainda não tinham tirado ele de mim. E não apenas eu me perguntava isso e sim todo o acampamento. Cam era jovem, corajoso, disposto a dar sua vida em nome da liberdade que tanto sonhávamos. Quando tivemos que abandonar Alepo, dois dias depois do início da Primavera Árabe na Síria, quando foi instaurado oficialmente uma guerra civil no país, pensei que logo o levariam para a guerra. Mas, não. Ele continuou, aqui, comigo. E já faz cinco anos que estamos no acampamento da Turquia, já faz cinco anos que estamos aguardando à tão sonhada liberdade.
Quando sai da tenda para buscar nosso pão que soube da notícia. Ann, uma idosa que chegou conosco há muito tempo, parou-me para informar a novidade.
"Mudaram, Sofie." Ela disse. "Mudaram o demônio novamente. Dessa vez é o nosso fim. Se Kat já era terrível, esse então..." choramingou um pouco e, depois de alguns segundos de silencio retornou: "Vai nos matar de fome, vai matar nossas crianças, nossos homens." Ann era conhecida por ser muito emotiva, negativa e bipolar. Ela nunca falou sobre seu passado, mas todos desconfiamos que seja, no mínimo, triste, pois ela não faz questão de lembrar.
"Oh, Ann, não seja pessimista." disse tentando acalmá-la. "Nada vai nos acontecer. Tudo vai ficar bem..."
"Me dê um pouco de sua fé, criança." ela cortou-me. "Não percebes? Eles estão procurando novos soldados, Sofie. Isso significa que Cameron também está na reta, Cameron pode te abandonar a qualquer minuto." meu semblante mudou instantaneamente, e Ann percebeu, mas não fez nada para ameniza-lo, não disse nada.
"Isso não vai aconteceu." comecei a me afastar, em direção a minha tenda, cada vez dando passos mais longos. Eu só queria sair de perto daquela velha invejosa, só queria sair dali. E nem a fome foi capaz de me fazer ir até o meu destino, eu só precisava voltar. Quando estava um pouco mais longe de Ann, que permanecia no mesmo lugar, ouvi ela gritar: "VOCÊ NÃO QUER VER A REALIDADE. ELES ME ROUBARAM TUDO. VÃO ROUBAR DE VOCÊ TAMBÉM." Naquele momento percebi que já estava chorando. Cam é meu tudo e perdê-lo era como perder a mim mesma. Ele é a única coisa real que ainda exite em mim. Voltei para casa as pressas e ao adentrar na nossa pobre tenda, meu coração encheu-se de felicidade. Como alguém pode te fazer tão feliz? Eu não conseguia entender.
Com a cara toda amaçada e sem camisa, ele estava sentado na lona que chamamos de cama. Ao perceber minha presença, sorriu.
"Olha só quem acordou cedo." eu disse caminhando até ele e sentando na lona ao seu lado. "O senhor sono, talvez." ele riu. Eu amo seu sorriso. Depois dos olhos, do nariz, dos dedos, da boca, dos ombros largos... é a minha coisa favorita nele.
"Senhor sono?" ele arqueou uma das sobrancelhas. "Gostaria de saber de onde você tira esses apelidos, Sofie." o sorriso contínuo em seu rosto foi sumindo a medida que reparou em meus olhos ainda vermelhos por conta das lágrimas. "Você estava chorando?" ele perguntou. Eu sabia que o motivo era ridículo e isso me fez abaixar involuntariamente a cabeça, que ele logo ergueu. "O que houve?" ele tocou minhas bochechas, alisando-as. "Alguém foi rude com você?" neguei, balançando a cabeça, enquanto recebia seus carinhos. "Alguém te machucou?" neguei novamente, enquanto seus dedos ágeis desceram até meus ombros ossudos e começaram a fazer círculos nas ponta deles. "Me diz, então." ele parou com os carinhos para olhar em meus olhos.
"Ann..." comecei. "Ann disse que você vai me deixar, que vai me abandonar." Cam olhou-me como se eu fosse retardada em me importar com as coisas que Ann falava.
"Ah, Sofie. Por favor. Não acredito que você ainda acredita nas coisas que Annie diz" suas mãos voltaram ao meu corpo, ao meu ombro. Porém, agora elas estavam acompanhadas por seus beijos, que começaram no pescoço e foram descendo. "Você..." beijo. "...não..." beijo "...devia..." beijo. "... se importa com isso." E ele estava certo, mas naquele momento eu não estava consciente, não com tantos beijos e carinhos. Observei seus longos dedos irem ao encontro da alça da minha blusa, abaixando-as devagar. Ele sorria como se o céu fosse aqui dentro. "Eu nunca vou me cansar de você. Nunca." Eu estava inebriada, estava derretendo a sua frente. Quando me dei conta, meus seios já estavam descobertos e tanto a blusa quanto o sutiã velho estavam de lado. Ele beijava o colo do meu peito esquerdo quando me dei conta que tínhamos que parar.
"Cam..." Tudo que tive em resposta foram múrmuros. "Cam... temos que parar." Empurrei seu rosto delicadamente, tirando seus lábios carnudos do meu seio. "Está de manhã. Ficou louco?" Ele olhou para mim e sorriu.
"Vou providenciar uma porta para a gente." ele riu e eu também.
"De que adianta uma porta se não temos paredes?" perguntei.
"Você é muito esperta." ele disse. "Não é atoa que é minha mulher." sorri ao ouvir aquilo, nunca me cansaria de ouvir que eu pertencia a alguém e alguém me pertencia. Quando terminei de me vestir, ele já estava de pé. Antes de sair deu-me um beijo demorado e disse ao meu ouvido: "Somos eu e você... o Universo e o viver, presenciando a dádiva." E saiu, deixando uma garota tonta na cabana.
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O amor que não deixamos para trás
RomanceO Universo que nos unio, estaria disposto, enfim, a nos separar? O quão dura seria a vida para acabar com algo tão puro e verdadeiro como o amor? As coisas aconteceram de modo que quase ninguém, ou ninguém, conseguia acompanhar. E, em pouco tempo...