A Máquina de Café

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Bom, não vamos começar com um 1° dia de aula super bagunçado e corrido, como geralmente acontece, vamos começar acordando tranquilamente e fazendo o que tem de ser feito antes de ir para a aula. Eu me chamo Ed, tenho 17 anos, estou no último ano do ensino médio e moro sozinho. Não moro sozinho por opção, na verdade meus pais me abandonaram quando eu tinha apenas 10 anos de idade, desapareceram sem dar explicação alguma, aí tive de morar com minha avó. Há 6 meses atrás nós morávamos juntos, até que ela começou a desenvolver alzheimer e teve de ir para uma clínica psiquiátrica. Eu não queria deixá-la naquele lugar, mas os médicos disseram que era a única forma dela continuar vivendo, pois ela sempre foi muito aventureira e com certeza sairia quando estivesse sozinha e morreria atropelada ou pulando de paraquedas, sem paraquedas.

Estou pronto para ir para a aula. Look arrasador; confere. Barriga cheia; confere. Material escolar; confere. Horário e turma; confere. Eu sou muito ligado nessas coisas de moda, pretendo com certeza trabalhar com algo relacionado a isso. Felizmente minha avó recebe um bom dinheiro de aposentadoria e eu trabalho numa loja de roupas toda terça e quinta, na parte da noite, assim sempre temos dinheiro pra gastar com coisas "bobas". Claro que não sou daqueles que compra roupa toda semana. Sei gastar conscientemente.

    Como não moro longe da escola, vou andando mesmo. Sem falar que tem muitas casas e prédios comerciais lindos no caminho que faço. E também preciso passar no Hospital Psiquiátrico de Santo André para ver minha vó. Chegando lá pego um crachá de visitante na portaria, escrevo meu nome usando uma caneta que tem um cheiro de álcool extremamente forte e sigo até o quarto de minha avó. 

    Sempre antes de entrar em seu quarto respiro fundo e fico tenso. Tenho medo dela não lembrar quem sou ou porque está ali. Isso ocorreu uma vez durante esses 6 meses que ela esteve neste lugar. Afasto esse pensamento da cabeça pois preciso parecer feliz e animado, mesmo que o relógio ainda marque sete horas da manhã. É difícil estar bem humorado logo quando o dia começa.

    Ela ainda está dormindo. Parece dormir bem pois está sorrindo. Fico feliz, principalmente depois da enfermeira dizer que ela estava tendo dificuldades para dormir semana passada. Teve até de tomar uns calmantes. Dou-lhe um beijo e saio de seu quarto, preciso ir para a escola. Antes de retirar o crachá e sair do prédio, faço uma parada na máquina de bebidas. Não compro chá ou café em bares pois sou muito fresco em relação a higiene de lugares que não tenho costume de frequentar. Tem um garoto parado em frente a máquina, aparentemente escolhendo o que comprar. Não estou com pressa, então espero. Tiro o fone do bolso da mochila e já posiciono eles sobre a camisa, e os ajusto em meus ouvidos, não suporto ir para a escola sem ouvir música. O garoto está demorando um pouco para escolher algo, e isso está me deixando impaciente, mas não posso apressá-lo. Finjo verificar algumas mensagens no celular pra ver se o tempo passa mais rápido, mas isso é algo que só funciona na minha mente. O garoto parece mais confuso a cada minuto, então, agora já impaciente mesmo, ofereço ajuda a ele.

   - Hey, você quer ajuda com a máquina? - Digo da forma mais educada possível enquanto toco em seu ombro.  

Ele se vira, com uma expressão confusa no rosto. Está usando uniforme de paciente e parece ter minha idade. Eu travei, simplesmente travei quando ele se virou completamente para mim, olhou no fundo dos meus olhos e abriu um pouco a boca.

   - A máquina parece não estar operando direito hoje. Parece ter dado pau de novo. Desculpa se você teve de esperar a toa. - Ele tinha olhos lindos, daqueles que quando você olha logo se perde. É como se ele olhasse na sua alma, bem lá dentro. 

     - Nossa, desculpa, eu não tinha ideia. - Voltei do transe, completamente sem graça. - Até sábado ela estava funcionando normal, achei que você estivesse indeciso no que escolher, talvez.   

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