Sobre quedas, confiança e ordens médicas.

258 33 10
                                    

— A gente se vê por aí, Percy. — disse Nico. — Annabeth.

Ela levantou a mão para um high-five.

Nico bateu. Depois voltou pelo gramado até onde Will Solace o esperava.

Will sorria para ele com as mãos no bolso da calça. O sol fazia seus cabelos parecerem mais loiros que o normal, e provavelmente era o sol que fazia os olhos de Will mais azuis, e sua pele mais bronzeada... Nico se repreendeu por olhar com tanta intensidade para o amigo. A-mi-go. Era uma palavra estranha, o garoto queria testá-la em sua boca. Ele tinha tantos amigos agora, bons amigos, e parecia caminhar na obtenção de muitos mais.

— Resolvendo assuntos inacabados? — perguntou Will, quando ele se aproximou. De longe ele podia observar Percy e Annie abraçados indo em direção ao lago, próximos a Piper e Reyna. Jason parecia ir pra lá também. Tantos tipos de amores e amizades improváveis convivendo em harmonia.

— Algumas pontas têm que ser atadas. — respondeu o Di Ângelo, também com as mãos no bolso.

— Eu tive uma queda por ele, sabia? — começou Will, indo para a enfermaria.

— Ele? — perguntou Nico sem jeito, se perguntando de onde Will tinha tirado o assunto.

— Percy, é claro. — respondeu o menino normalmente. — Eu era bem menor, e ele não era tão... heroico? Foi justificável. Sempre tive um fraco por desajustados.

Nico estacou no lugar, surpreso e um tanto encabulado com o comentário final.

— Você vai ficar ai? — quis saber Will, olhando para trás, franzindo a expressão por causa do sol.

— Você teve uma queda pelo Percy?!

— Assim como metade do acampamento. — Will revirou os olhos, os dois haviam continuado a caminhada. — Eu já tinha superado, então, na guerra contra Cronos, Percy me levou para ajudar Annabeth, ela estava quase morrendo, sabe? Durante todo o tempo, ele ficou ao lado dela, segurando sua mão. Quase pedi pra que trouxessem alguma coisa para ele também, o cara parecia que ia ter um treco. Quando eu estava saindo de lá, por um momento tudo que eu podia pensar era: Por Apolo, Solace, que bom que você não levou essa paixonite adiante. Eles foram feitos um para o outro.

— É. Eles foram. — Nico se viu sorrindo com a história e sentiu-se compelido a partilhar alguma coisa também. Will era sempre tão aberto sobre o que sentia, ele merecia alguma reciprocidade. — Eu tive uma queda por ele também, mas não fui tão esperto.

— Com você é meio diferente. — comentou Will por cima do ombro, enquanto entravam na enfermaria.

— Como assim diferente? — quis saber Nico um tanto corado. Estava cansado de salientarem o quão diferente ele era, o quão anormal.

— Eu lembro de você quando chegou, Nico. — respondeu Will com simplicidade, aproximando-se de uma bancada de suprimentos. — Senta ai. — mandou ele.

Poderia responder que preferia ficar em pé, mas o começo da conversa o desarmou.

— Você parecia tão fragilizado. Você e sua irmã. — continuou Will, agora remexendo em um punhado de ervas. — A maioria que chega parece, vocês dois aparentavam estar bem, mas com uma áurea problemática além do normal. Bom, Percy ajudou a salvar vocês. Por isso eu digo que é diferente.

— Sim... Talvez seja. — refletiu um pouco, além de tudo que já tinha refletido sobre como chegara naquela situação. — Ele era um misto de herói. E depois do que aconteceu com Bianca, eu sentia uma imensa raiva. Mas não conseguia odiá-lo. Tinha todo esse rancor, e admiração, respeito, e raiva... Vergonha também, eu fiz muitas coisas ruins...

— Você é um herói, Nico Di Ângelo, ninguém te culpa por nada. — disse Will com simplicidade, ainda concentrado em suas ervas. — Não seja o idiota que vai se culpar.

— Sobre Octavian, Solace... — Nico mal sabia como continuar. Até agora, Will não julgara Nico pelo que fizera, mas as coisas podiam mudar de repente, portas podiam se fechar rapidamente.

— Fizemos o que tínhamos que fazer, Nico. — Will o olhou bem nos olhos enquanto continuava. — Você é uma boa pessoa, e eu confiei em você porque sei que não faria nada de mal.

— Meu pai me disse...

— Há coisas que você entende melhor que eu. — cortou Will, sem deixar que Nico começasse suas explicações. Nico nem sabia porque se sentia compelido a dá-las. — Morte é uma delas. E sobre destinos e punições.

— Por que você confiaria em mim, Solace? — perguntou Nico desarmado, sentado sobre a cama da enfermaria, com os ombros caídos.

— E por que eu não confiaria? — devolveu a pergunta irritado, o filho de Apolo. — Eu te disse, Nico, você tem amigos. Você lutou na guerra de Cronos, esteve preso naquele jarro infernal, ajudou a chegar nas portas da morte, e ainda carregou aquela estatua estupidamente grande, até quase a morte. Então, por que? Por que você seria menos digno da minha confiança que qualquer um?

Porque eu menti, quis dizer Nico, várias vezes. Tropeço atrás de tropeço. E eu sou um filho de Hades, seria natural desconfiar de mim.

Mas como Will parecia achar a ideia um absurdo, Nico percebeu que não iria discutir. Seu coração pareceu inchar e dobrar de tamanho, se aquilo fosse possível. Era perto do sentimento que tivera com Reyna e Jason. De ser aceito, ter alguém em sua defesa, mesmo que fosse defender de si mesmo.

— Beba. — ordenou Will, lhe empurrando um cálice com uma mistura de ervas. — Vai restaurar suas forças mais rápido.

— Eu estou bem. — tentou argumentar o garoto, se esquivando do conteúdo esverdeado.

— Aham, assim como todo mundo aqui. — murmurou Will. — Beba. — repetiu, olhando no fundo dos olhos de Nico, com os lábios repuxados em uma careta. Nico perdeu o foco das coisas num momento, e no outro Will já empurrava o cálice em seus lábios.

Não tinha um gosto ruim, um pouco verde e amargo demais pra ser coca-cola do néctar, entretanto. Nico viu suas bochechas atingirem um profundo tom de vermelho ao ser alimentado por Will com uma mão em seu rosto. Mas não afastou o cálice com um tapa, como se sentiu tentado a fazer.

— Isso, muito bem. — Will sorria largamente, divertido com a situação. O lugar onde a mão de Will estivera ainda formigava, a sensação que perpassou seu corpo fez o vermelho em suas bochechas aumentarem. — Eu vou te dizer, Di Ângelo, você fica uma graça com alguma cor. — dizendo isso deu um tapinha divertido na bochecha escarlate de Nico, e saiu, gritando por cima do ombro. — Descanse agora. Ordens médicas.

Love is EasyOnde histórias criam vida. Descubra agora