Parte I

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O natal já se fora, mas o prédio permanecia impecável. Não era nada de exagerado, como as luzes psicodélicas que enfeitavam umas fachadas caprichadas em vermelho -Por mais que gostasse do natal, às vezes sentia-se mergulhado num pote de LSD.

Surpreendentemente, não havia vestígios de vermelho qualquer por ali. Tudo pintava-se de dourado e branco. Nas árvores, nas fachadas inacabáveis. Um Éden da Classe A contemporânea, que esbanjava aquela época onde todos pareciam felizes, complacentes e, é claro, elegantes.

Mesmo que dinheiro não fosse a questão, era a primeira vez que passava o réveillon num lugar tão chique.

Contornou devagar, observando o restante do jardim iluminado por cima do vidro fosco semi-erguido do carro. Voltando do estacionamento, parou por um minuto, analisando a beleza do edifício, tentando reconhecer algumas das silhuetas na sacada; mas dali, era quase impossível distingui-las.

Perguntava-se quem teria reservado aquilo.

No fim do ano, as coisas geralmente se assentavam, até mesmo em Nova York. Ou parte dela. A parte que não se enxameava na constante multidão da Time Square, emburacando-se em lojas, disputando as melhores taças, os melhores champanhes, o melhor ano novo. A sua parte.

Aquela época não costumava dar-lhe grandes preocupações. Não fazia coisas mais extraordinárias que uma saída para um restaurante com Javis, ou uma reunião com os amigos. Casos também eram raros, uns gatos pingados, aqui ou ali. Um momento para se deitar e espreguiçar um pouco, ao menos uma vez no ano. Mesmo que não fosse um simpatizante de confraternizações, aquela reunião, empurrada às pressas para o ano novo depois de um natal passado em branco, de certa forma alegrou-lhe.

Trabalhar no FBI não era fácil, nunca foi. Machucou-se um tanto naquela escalada, e agora, aos 31 anos, que estava quase no topo ­- ou ao menos onde queria estar -, olhava para baixo e perguntava-se de tudo aquilo valeu à pena. Pensamentos passageiros, é claro. Mas recorrentes.

No final, tudo aquilo não passava de clima de final de ano. Os problemas e as alegrias, era tudo muito contraditório.

Mas não queria pensar naquilo. No momento estava apenas... Feliz.

Eram quase dez horas. Estava atrasado.

Apressou-se em entrar no elevador. Apertou o botão do topo do painel. A música baixa misturava-se às conversas dos corredores, que agitavam-se conforme a subida.

Javis não fora com ele aquela noite, dissera que tinha uma surpresa.

As portas abriram-se, dando espaço à vista do enorme salão. Aquele mundo atacou-lhe de vez, invadindo seus olhos e ouvidos. A música alta da banda, onde um rapaz robusto e vermelho gastava o fôlego num saxofone; risadas, vozes, o tilintar dos brindes incensáveis, os saltos contra o chão; as luzes fortes, as cortinas brancas, os vasos de orquídeas e todos os detalhes daquela discreta e alva El Dorado.

- Jamie!

Mas o que realmente lhe atacou foi Holly. Mal pusera o pé para fora do elevador, e já sentira o peso daquele corpinho magro sobre si, tombando sobre seus ombros, pulando para um abraço apertado, quase deixando a taça de vinho - já que não se tinha champanhe - cair sobre suas costas.

Holly era um pequeno pontinho amarelo em meio à brancura daquela multidão, naquele vestido amarelo clarinho, de uma saia pregada que ia a altura dos joelhos e alças que cruzavam-se em seu pescoço, expondo as canelas finas e a clavícula bem desenhada.

Os saltos, em protesto aos demais, eram baixos. Ela ainda não alcançava o seu nariz. O cabelo estava solto, pequeninos cachos ruivos e curtos, com um toque de rebeldia, à altura do queixo. Era impressionante como, com 29 anos, ainda aparentava 20. Tinha uma espécie de película de imortalidade.

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