Quando o sol se põe

141 5 1
                                    

Ela precisava ir no banheiro. Sua bexiga parecia explodir, porém o medo de sair da cama àquela hora de noite a mantinha imóvel sob as cobertas, suando apesar do frio do inverno. Ousou abrir os olhos e observou ao redor. Não havia nada a não ser suas colegas de quarto, que dormiam profundamente após outro dia cansativo no internato. "Para de ser cagona, não tem nada, não tem nada, vai no banheiro de uma vez!" foi o que pensou para si mesma, então lentamente começou a sair da cama, colocou o pequeno sapato de pano e caminhou silenciosamente até a porta. Não ousou abri-la toda, sabia que passado um momento, a porta rangeria alto e acordaria as garotas.

Caminhou pelo corredor sombrio até chegar à porta do banheiro, e forçou a fechadura, mas a porta não se moveu nem um centímetro. Como poderia a porta do banheiro dos quartos estar trancada? E se alguém precisasse ir ao banheiro? "Como eu..." pensou. Sua próxima opção seria o banheiro do andar de baixo, mas as escadas estavam terrivelmente escuras e geladas para que ela se aventurasse. "Vou voltar para a cama" pensou, e seu coração se acelerou ao dar as costas e voltar por onde tinha passado. Aquela sensação de "não olhe para trás" percorria seu corpo o tempo todo, e acelerou o passo até chegar ao quarto. Quando passou pela porta, sentiu sua bexiga apertar novamente, e teve de pressionar as pernas com força para não se aliviar ali mesmo. Teria de ir ao banheiro, não aguentaria até o amanhecer. Mas sair do quarto novamente? "Coragem, vai."

Passou novamente pela porta, e o corredor parecia ainda mais sombrio que segundos antes. Caminhou até as escadas e parou no cantinho, olhando encarando a total escuridão. O corredor do primeiro andar estava tão escuro que ela teria de caminhar às cegas por cerca de cinquenta metros, até chegar à porta do banheiro, abri-la e acender por fim a luz. "Quanto mais rápido você for, mais rápido estará de volta à cama." pensou tentando se convencer a ir. 

Começou a descer, e a escuridão pouco a pouco subiu pelo seu corpo, até o ponto em que a linha que dividia a luz da escuridão passava por baixo de seus olhos. Então aquela sensação a atingiu novamente, "não olhe, não olhe para trás" pensou, mas e se... Não, não olhe. E deu mais um passo, sumindo na escuridão.

Seguiu pelo corredor agarrada à parede, até sentir a porta do banheiro. O silêncio só era quebrado pelo retumbar de seu coração, mantendo a alerta, e pelo vento gélido e entrecortante. Não fechou a porta ao entrar, e começou a tatear a parede por dentro. A porta fechou-se atrás de si subitamente, e ela parou de se mover no mesmo momento. O banheiro era tão mais silencioso que o corredor, que qualquer movimento dela denunciaria sua posição, então ficou ali, no escuro, estática pelo tempo que precisou até lembrar-se que a porta fechava-se automaticamente, e a onda de alívio fora tanta que ela quase sorriu, então voltou a deslizar a mão pelos azulejos gelados até encontrar o interruptor.

Não havia nada, o banheiro estava totalmente vazio, e ela correu para uma das cabines mais distantes. Quando terminou, lavou as mãos e ficou mais um bom tempo ali parada, apenas olhando para sua própria figura no espelho. Será que haveria alguma coisa lá fora agora, quando saísse? Seria seguro sair do banheiro? Estaria completamente escuro novamente, e se ela não conseguisse chegar até o quarto? Aquela sensação poderia voltar...

"Não há nada, não há nada." pensou tentando encontrar coragem. Ela apagou a luz primeiro, então abriu a porta devagar, colocou a cabeça para fora e escutou. Algumas folhas balançavam, dançando ao uivo do vento da madrugada, parecia seguro. Saiu do banheiro e começou a voltar. Então, quando estava quase chegando às escadas, ouviu um barulho. 

Vinha de outro corredor pouco iluminado que cortava o corredor onde estava. Ela estagnou no mesmo local, com o coração acelerado, até identificar os barulhos como vozes de garotos. Só podiam ser eles, a ala masculina não ficava longe, eles deviam estar aprontando algo. A curiosidade a envolveu, e ela chegou mais perto para ver o que faziam.

Quando o sol se põeOnde histórias criam vida. Descubra agora