Prólogo

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Mais uma nave chegou. Os soldados a observavam ao longe em cima de algumas montanhas encobertas por gelo e neve.

Mesmo trajando grossas capas antitérmicas, eles sentiram um calafrio percorrendo suas espinhas quando a grande máquina pousou na pista, e alguns até seguraram suas armas mais firmemente com suas mãos enluvadas. Eles sabiam que o movimento era inútil, já que os robôs nunca os veriam daquela distância, e que, mesmo que os vissem, eles não teriam chance alguma contra àquela frota metálica. Mas eles não podiam evitar. Pelo menos assim suas mãos paravam de tremer um pouco.

Enquanto os robôs realizavam a tarefa de tirar os caixotes prateados de dentro da nave, os empilhando ao redor da mesma, os cidadãos observavam calados atrás das montanhas onde os soldados se encontravam e até mesmo dentro de alguns arranha-céus completamente abandonados e congelados. A maior parte deles sequer ousava respirar, como se as espessas nuvens de vapor que se formavam com o ato pudessem de alguma forma denunciar a localização deles mesmo com toda aquela distância os separando dos robôs.

Eles estavam tão concentrados em não fazer barulho que sequer notaram a criança de sete anos que se soltara dos braços da mãe em algum momento e que agora corria na direção da nave, segurando apenas um arco mongol na mão esquerda e uma aljava cheia de flechas nas costas.

- Aonde você pensa que vai, Hunter? – um braço forte segurou a criança pela gola da capa, puxando-a para perto do dono da voz. – Sua mãe não lhe ensinou que não se deve chegar perto dos exterminadores?

O pequeno garoto olhou para cima antes de responder, os olhinhos azuis amendoados um tanto quanto desproporcionais ao rosto piscando várias vezes na direção do homem que ele reconhecia como Heylan, seu tutor. Assim que seus olhos focaram melhor na face angulosa do homem ainda com a barba por fazer, eles ficaram marejados.

- Mas Heylan, eu-

- Shhh. – o mais velho ordenou, cortando o garotinho ainda em seus braços. – Fale mais baixo. Eles podem ouvir.

- Eu preciso, Heylan! – o garoto voltou a dizer, dessa vez baixo, como seu tutor pedira. – Eu preciso encontrar o meu pai. Ele está lá em algum lugar. Eu sei disso!

Heylan suspirou pesadamente, fazendo uma cortina grossa de vapor se erguer, saindo de seus lábios.

- Não, Hunter. Ele não está lá. – ele olhou fundo nos olhos azuis do garoto, como se esse ato pudesse de alguma forma convencer a criança de que suas palavras eram verdade. – E mesmo se estivesse, o que uma criança de sete anos faria contra um exército de robôs, hein?

- Eu posso atirar em todos eles. Você sabe que eu posso. – seus olhinhos brilharam ao dizer isso. Se tinha algo em que Will Hunter podia dizer que era realmente bom, essa coisa era o arco e flecha. Desde o dia em que Haylan o presenteara com seu primeiro arco, há três anos atrás, o garoto não largava dele, e passava todo o seu tempo livre atirando em qualquer coisa que encontrasse pelo caminho. Ele quase nunca errava.

- Você pode atirar em vinte e quatro deles. – corrigiu. – Vinte e quatro de milhares. Só naquela nave devem ter no mínimo uns setenta. Você atiraria apenas em um terço deles para depois ficar sem flechas e escapatória. Hunter, isso é suicídio. Pense na sua mãe.

- Mas isso não está certo! Meu pai e sabe-se lá quantos outros podem estar sofrendo lá dentro! A gente só vai ficar observando sem fazer nada? É assim? Isso não é justo, Heylan!

- O mundo não é justo. – foi tudo o que o homem disse antes da criança largar seu arco no chão e se jogar no colo dele, chorando o mais baixo que conseguia para não atrair a atenção dos robôs.

Heylan passou seus braços fortes em torno da criança, o apertando contra o peito. Ele sabia e entendia perfeitamente o lado do garoto.

E concordava com ele também.

Mas os anos de experiência já lhe diziam que nada havia para ser feito para mudar aquela injusta realidade. Se tentassem, o resultado sempre seria o mesmo: extermínio.

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