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Paris. Restaurante Café de Flore.

"Na mesa, caderno e caneta.

Uma omelete e um champagne.

Café da manhã atípico.

Ainda são 11.

Fico ali escrevendo.

Toca meu celular, é ela me ligando do Brasil."

Senti minha mão trêmula ao pegar o aparelho e visualizar sua imagem na pequena tela brilhante. O sorriso sem jeito de Chiara em uma das fotos que eu havia tirado durante o último verão, esconde toda a mágoa que hoje possivelmente ela sente por mim. O tremor em minha mão volta e levo o dedo até o botão esverdeado, pronta para atender aquela ligação. Não tenho certeza se quero ouvir sua voz naquele momento. Chiara tem o dom de envolver-me em uma espiral de sensações simplesmente por dizer meu nome com seu sotaque diferenciado. Aquela italiana meio brasileira com costumes nova-iorquinos. Suspiro mais uma vez. Faço tanta força para puxar o máximo de ar para os meus pulmões, que acabo chamando a atenção do casal ao meu lado. Tento forçar um sorriso para dizer que tudo está bem, mas ele não vem. O aparelho em minha mão vibra mais uma vez, e talvez aquela seja minha última chance de atendê-la.

"Não falava comigo desde que terminamos."

"Eu não quero mais isso, Ana, entenda." Sua voz estava embargada pelo choro e não, eu não podia entender o porquê de ela não querer mais aquilo. Eu sabia, no fundo eu sabia do que Chiara estava falando. Nossa relação estava de cabeça para baixo. Encontrávamos-nos apenas em nossos desencontros e aquilo havia se tornado rotina. Brigávamos, transávamos, nos resolvíamos por algumas horas. A realidade batia em nossa porta, refletíamos, pensávamos, pesávamos os prós e os contras. Os contras quase sempre tinham maior influência. Mas eu não queria, eu não podia. Por que eu iria não querer aquilo? Nossa doce loucura parecia ter chegado ao fim. Mas, não! Eu não podia desistir de nós.

Chiara já não pensava da mesma forma.

Ela foi muito clara ao sair por aquela porta e pedir para que eu não a esperasse voltar. Ela foi clara. Clara, minha Chiara. Clareou seus passos para longe de mim e eu não pude fazer mais nada. Minhas ligações foram recusadas. Minhas tentativas foram em vão. Eu me perdi quando perdi Chiara. Clareou minha visão quando me deixou sozinha no escuro sem mais explicações.

Eu aceitei. Ao menos, tentei. Dois meses difíceis, sem saber por onde ela andava. Dois meses me perguntando o que havia feito de errado. Dois meses para entender que eu não havia feito nada. A vida fez. A vida me levou para onde eu deveria estar.

"Paris. Café de Flore."

Na mesa, caderno e a caneta que eu deixei de lado quando finalmente pressionei o botão que faria a conexão entre dois mundos atualmente tão distantes. Ouvi sua respiração do outro lado da linha e minha espinha se retesou. Endireitei minha postura na cadeira no exato momento em que um suspiro aparentemente aliviado soou do outro lado do telefone sem fio.

- Ana. – O sotaque. O maldito sotaque da italiana meio brasileira com costumes nova-iorquinos. Um sopro gelado direto para o meu peito, acelerando meu coração. – Podemos conversar?

- Agora? – Eu havia perdido todo o meu jeito para lidar com situações como aquela. Eu havia perdido muito da minha sensibilidade com Chiara depois de tanto tempo sem resposta. – O que você quer?

Página 76 (ChiAna)Onde histórias criam vida. Descubra agora