"Não me lembro de ninguém ficar triste comendo bolo" -, disse
um amigo numa conversa, num dia de fim de tarde ensolarado.
Acho que ninguém fica triste tomando uma xícara de café
acompanhada de bolo. O bolo feito na panela de pedra na brasa e no
fogão de lenha num dia qualquer de setembro, pode ser qualquer dia,
qualquer dia mesmo, de setembro.
Faz muito tempo que as tardes de setembro eram diferentes; era
chuvosa, minha vó quem me disse que os tempos mudaram. Que as
pessoas são outras e que ninguém mais sabe fazer bolo. Bolo de
panela na brasa. Bolo com aquela casquinha queimada... Ah o sabor,
é indescritível!
A gente perdeu a vontade de sentar na varanda, de ficar com as
pernas cabeludas penduradas no ar deitado na rede vendo a vida
passar, vento a tarde cair e o cachorro deitado cochilando. A gente
ficou 'chato'. O mundo mudou. Trocadilho acidental; a velha vó tinha
razão em dizer.
Quando era moleque e ainda tinha a vida toda pela frente, podia
correr e brincar e no meio do dia iria ter bolo. Você já viu alguém
comer bolo e ficar triste? Depois que a gente envelhece ninguém mais
senta pra comer bolo. Bolo tem sabor de amor, tem cheiro de alegria.
Eu nunca vi, de verdade, alguém comer bolo e ficar triste.
É uma tarde de setembro. Setembro é o mês mais bonito do ano.
A gente envelheceu, os nossos sonhos mudaram um pouco. A
vida nos calejou nos amores não correspondidos.
Setembro seria perfeito se tivesse trinta e um dias. Trinta e uma
primaveras, trinta e uma batidas do teu coração.
Doce setembro;
Fica, vai ter bolo!
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LUGAR COMUM
Short StoryLugar Comum são crônicas que escrevi ao longo de muitos anos. Uma copilação de lembranças, coisas que a maioria dos jovens dos anos 80 e 90 viveram, sem nenhuma sombra de dúvidas você se verá em algum momento em muitas das linhas que postarei e cas...