As senhoras estalavam seus saltos finos pra lá e pra cá, enquanto corriam entre a cozinha e a sala de estar gritando para as empregadas trazerem mais lanches ou encherem os copos de refrigerante. Os senhores estavam escondidos na garagem enquanto ouviam o jogo: 2 a 0 para o time adversário. Mesmo com a derrota, estavam aliviados por não terem de aturar a bagunça das crianças no jardim.
Chuck pensou que talvez fosse uma boa ideia sentar e chorar junto com os pequenos. Muitas vezes as crianças interagem melhor quando você age como uma delas, e não que ele admitisse, mas realmente sentia vontade de chorar. Ao invés disso, sorriu e cumpriu seu papel: animar a festa.
Ele sabia que a equação era sempre a mesma: mães super ocupadas mais pais super ausentes é igual a crianças solitárias batendo umas nas outras com um martelo de plástico. A única variável era a arma do crime.
Quando se ofereceu para trabalhar como animador de festas, ele não imaginava que seria tão difícil. O dinheiro nunca dava para as contas da casa, o cansaço não compensava e os gritos das crianças ficavam grudados na cabeça o dia inteiro, além das manchas de chocolate, que pareciam nunca sair da fantasia. Mesmo com uma roupa extremamente colorida, sapatos enormes e maquiagem excessiva, uma manchinha em qualquer ponto da fantasia era altamente perceptível aos olhos dos patrões, que não contratariam um cara sujo e desarrumado.
Os clientes do dia eram um casal rico tradicional: a Senhora Judith Montgomery era terapeuta ocupacional; já havia aparecido em diversas revistas e programas de televisão. O Senhor Alan Montgomery era advogado criminal, daqueles odiados tanto pelos colegas como clientes. A soma desses dois empregos em bens era uma mansão em um bairro de celebridades, um barco de pesca (sendo que eles mal sabiam pescar), uma pousada no litoral (o clássico refúgio da vida difícil de gente rica para as férias de verão) e três carros.
"Você não me deve nada", dizia a voz. "Você não tem que fazer isso". Tentou apagar seus pensamentos com as canções animadas da "hora do palhaço", mas nem ele, nem as crianças, estavam convencidos de que aquilo estava sendo divertido.
Chuck trabalhou várias vezes para os Montgomery. Além de uma conta gorda, eles tinham três filhos aos quais não dedicavam o mínimo de tempo. Ele detestava ser pago para contribuir com a infelicidade das crianças que no mínimo em cinco anos se perguntariam porquê os pais as odiavam tanto a ponto de entregá-las na mão de estranhos enquanto viviam suas vidinhas fabulosas. Mais um efeito colateral comum na equação da família turbulenta. Mas tinha que sobreviver, e mesmo sem orgulho do que fazia, continuava a trabalhar para a família.
Era a festa de quatro aninhos do pequeno Johnson. Seu irmão Jordan, de dez anos, brincava na piscina com as outras crianças, enquanto Kobe, de quinze, conversava com os amigos. Além de jogadores de basquete, os pais dos irmãos Montgomery não sabiam muito sobre esportes, por isso indicaram como atividade da festa uma aula prática de tiro ao alvo.
Várias crianças de quinze anos organizadas em fila indiana, armadas com arcos e flechas para acertar um alvo brilhante ao lado do palhaço, que teve de substituir o animador vestido de Homem de Ferro indicado inicialmente para entreter as crianças mais velhas.
"Chuck, você não tem que fazer isso. Quantas vezes já falei pra admitir que você precisa de ajuda?"
Uma a uma, as crianças jogaram flechas em vários outros lugares além do alvo pretendido. Os poucos que miraram na direção certa e aplicaram a força necessária para a atividade erraram suas flechas nos joelhos e ombros de Chuck. Estava tudo protegido, pois já era de se esperar que eles fossem errar bastante, mas ninguém poderia ter previsto o garoto tão esperto que resolveu fincar sua flecha nas costas do palhaço, só para tirar uma onda com o palhaço.
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Quatro Invernos
RomanceUm trágico acidente muda a vida de uma família durante o frio inverno de Foxtown. Distantes por muito tempo, quatro irmãos resolvem se reencontrar em um lugar que todos conheciam em comum. Entre inúmeros segredos e realidades distintas, um único...