Este vil motel...

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Saber que a qualquer momento um homem, com características e caráter que desconheço, vai entrar por aquela porta, e eu serei obrigada a me entregar a ele, me deixa com repúdio da pessoa que me tornei. Por que eu tive que escolher um sonho tão inalcançável? Por que eu escolhi o pior caminho para seguir com ele?
Se minha mãe estivesse viva, teria vergonha da própria filha.
"Você tem apenas dezenove anos, terá outras chances. Um dia você passa", quem diz isso nunca prestou um vestibular de medicina para uma faculdade federal, não sabe como dói ver a chamada e não encontrar seu nome lá, almejar uma vaga que sabe que nunca terá...
Olho para o espelho no teto, típico em quartos de motéis, me vejo, em um traje que nunca imaginei usar, que, se visto em outro alguém, diria que não é algo apropriado para nenhum tipo de ocasião ou corpo, algo que traria o peso de um olhar com desprezo. De que outra maneira eu conseguiria oito mil reais por mês?
Eu não tenho coragem, sinto uma avassaladora vontade de fugir correndo, porém, não movo um músculo, lágrimas de medo e desgosto começam a escorrer em meu rosto, coloco as mãos em minha cabeça, como se aquilo fosse me ajudar a encontrar uma solução.
Ouço o barulho da porta, em seguida passos, graças à toda aquela confusão de sentimentos, eu acabei por continuar ali chorando, eu não podia conter aquilo. O som dos passos foi tornando-se mais alto, meu coração acelerava cada vez mais, os segundos pareciam horas, até que, percebo a figura de um homem, a se agachar em minha frente, por mais abaixado meu rosto estivesse, eu ainda podia analisar suas características; ele vestia uma jaqueta de couro preta sobre uma camisa listrada, e um jeans escuro, tinha cabelos muito bem penteados, a barba por fazer, e usava um óculos modelo aviador, seu rosto tinha traços jovens, sua pele era impecavelmente lisa, sua aparência poderia facilmente me lembrar um anjo.

–Ei, o que foi? –ele segurou meu queixo, levantando assim meu rosto, e limpou uma lágrima.

–Isso, eu não posso... —a tentativa de conter o choro foi falha.

– O que você não pode, minha querida? —ele deslizou seus dedos novamente até meu queixo.

–Transar, com você, eu não te conheço, eu não quero! —afastei-o bruscamente.

– Nós não precisamos transar — Ele se sentou ao meu lado na cama.

Eu já não sabia se devia sair dali ou continuar chorando, as duas coisas teriam o mesmo fim, eu chorando com nojo de quem, ou melhor, o que sou.

– Como você se chama? — Ele indagou e eu permaneci em silêncio — Valeria, Viviane, Vivian...?

Limpei algumas lágrimas de meu rosto e segurei o pingente de meu colar, que era nada mais que um "V", uma das poucas recordações de minha infância, que certamente foi a parte mais feliz de minha vida, talvez até a única.

– Valen... Tina —eu não devo explicações para um estranho, não tenho noção do porquê respondi.

– Mas que belo nome, eu sou Daniel, prazer — Ele estendeu a mão, mas foi a abaixando aos poucos, envergonhado por eu não ter correspondido — O que lhe traz aqui menina? —ele colocou ambas as mãos em seus joelhos.

– O que... Lhe traz aqui? — Levantei meu rosto e passei a fitar uma luminária distante.

– Bom, o que me traz aqui você sabe, agora, o que você está fazendo aqui não sei, claramente não procura o mesmo que eu —ele, como eu, visava algo distante também.

– Eu não queria ter escolhido isso... Eu não tenho outra opção...

– Você é uma moça nova, bonita, e pelo jeito inteligente também, realmente não precisa disto, outro "emprego" não seria a solução?

Quarto 42 Onde histórias criam vida. Descubra agora