Alma Vingada - O retorno

Um

   

      É engraçado como observar as pessoas se torna algo... Substancial. Existem muitos tipos, cada qual à sua maneira e integridade. Mas existe o meu tipo: o que observa.
         Talvez devamos nos rotular de loucos ou talvez não. Seja como for, tenho noventa por cento de certeza de que não sou de toda louca.
        Ainda.
— Vai fazer algo especial essa noite, Lisa?
       Jeremy estava ao meu lado, o sorriso bobo no rosto e seu jeito meigo de ser espelhando a natureza que eu adoraria para mim.
— Vou jantar com minha tia, porque?
— Ah, nada. Apenas curiosidade.
       Eu sabia muito bem que não era mera curiosidade. Meus sentidos vampíricos não se enganriam nunca, mesmo o sangue vermelho e quente disfarçando em minhas veias a verdadeira natureza desse rostinho lindo.
         Paul havia me liberado mais cedo hoje. Hayna e eu pretendiamos ver alguma coisa no cinema, e depois comer em um restaurante qualquer, só para passar a madrugada.
        Minha vida realmente mudou muito, em um espaço de tempo considerável.
        Antes eu era uma mercenária, assassina de aluguel, cadela pistoleira ou quaisquer nomes do tipo. Descobri então que eu herdaria o trono de uma legião bruxa muito poderosa, no entanto, minha paixão por um vampiro impedia que eu pudesse ter o amor e o reino ao mesmo tempo.
         Então, no dia da minha coroação, meu avião sofreu um acidente. Fiquei à deriva até minha tia me encontrar com seus poderes mágicos. Passei a seguir seus passos sombrios, exercitando alguns atos malévolos contra certas pessoas.
         Depois, decidi optar por ignorar a existência dos seres sobrenaturais. Qualquer coisa que viesse deles devia ser ignorada. Ate minha parte vampira.
         Dessa forma, cá estava eu, morando em Moscou. Trabalhando como garçonete em um café da cidade e morando num apartamento mais ou menos sociável. A questão sempre andou às voltas entre eu e minha tia esquecermos nossos passados.
         Mas ultimamente estávamos nos dando bem com nossas novas vidas.
         As ruas de Moscou costumavam ser meu local preferido. Ajeitei meu cachecol em volta do pescoço, caminhando na calçada com passos lentamente deliberados.
         Não notei a aglomeração até estar suficientemente próxima para notar o sangue.
        Era uma garota, cabelos escuros e sobrancelhas feitas. Vestia uma leggie e camiseta de uma banda de rock, manchada com o sangue vermelho. No peito uma marca de unhas enormes e uma mordida no ombro incomum.
— O que aconteceu?
       Toquei o ombro de alguém para perguntar, a curiosidade levando a melhor sobre a razão.
— Ninguém saberia dizer. Ela simplesmente apareceu assim aqui.
       O rapaz que disse isso não me olhou ao dizer tais palavras , tão intrigado estava. Empurrei a massa, procurando me aproximar.
— Temos que ir.
         Um rapaz pegou meu cotovelo, me tirando do aglomerado.
— Ei! Me solte!
         Me livrei dele assim que chegamos a um beco vazio. Eu estava preparada para ser caçada desde que cheguei em Moscou. Mas não imaginava que depois de três anos eles ainda procurariam por nós.
— Quem é você?
— Adrian Sanchez. E você?
— Porque quer saber?
— Não quero. Só te tirei de lá por questões humanitárias.
       Olhei Adrian. Ele era da minha altura, cabelos escuros e olhos chocolate, porte de bad boy. Reparei na adaga de prata enfiada em seu cinto, preparada.
— Vampiro?
— Como sabe?
     Ele levou a mão na adaga, prendendo meu pescoço entre seu antebraco e a parede.
— Sou... Sou metade vampira também — tossi.
— Híbrida? Nunca conheci pessoalmente, mas já ouvi falar — ele se afastou. — Deve ser por isso que eu pude te sentir tão claramente.
— O que aconteceu com a garota lá na rua?
— Lobisomens. O mundo está uma loucura, desde que as Darks retiraram-se, tem aparecido muitos candidatos ao trono.
          Olhei para ele.
— E as Fusion?
— Acorda, garotinha. Todos só querem pensar nos seus próprios umbigos. Agora se quer seguir meu conselho, se esconda. Tempos difíceis estão vindo, a guerra está apenas começando.
        E então, ele sumiu beco afora, sem mais nem menos.